Diário dos Açores

Vamos enrijar a coragem de amar o proximo

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1 – ecos dispersos do sermão à coragem    
 Podemos imaginar a chiada da despedida do ano em curso?  Vejamos: a fraternidade humana, longe de ser imperativo constitucional, faz parte da etnodiceia.  Estamos prontos a conversar sobre o sombreado político do presente, porque acreditamos que a claridade é um fenómeno mais antigo do que a própria humanidade. Não somos apologistas do atrevimento de apalpar os contornos da miséria alheia, na pretensão de redescobrir novos pontos cardeais à geografia da fome. Em meados de 2008, não ficámos surpreendido pelo trambolhão do capitalismo-financeiro outrora santificado pelo reaganismo e, mais tarde, divinizado pela gatunagem neo-conservadora. De resto, quem se dedica à produção em série de discursos inflamados (para apontar o rol dos pecados políticos da actualidade) arrisca-se à função de amanuense dos efeitos, permanecendo todavia cativo da ignorância das respectivas causas...
Recordo que a nossa geração recebeu de René Descartes a herança duma pergunta magistral “... of what can I be certain?”
Ora, acontece que o meu próprio percuso de veterano imigrante sugere o dever (ou a necessidade?) de desaprender teimosias tortuosas herdados do passado, para melhor entender, por exemplo, a vivacidade intelectual de William James, que nos adverte pragmaticamente, em relação à questão acima exposta por Descartes: “... can I afford to suspend belief until I am certain?”
Ora como cultivamos o pudor de não ofender o humanismo integral e integrador do Cristianismo, não dispomos de reserva diplomática para atender aos conluios da chamada empreitada oficiosa do sucesso curricular, transitório e cosmético do turismo académico. Desde há muito ‘assentámos-praça’ na peregrinação solidária dos operários da Cultura; continuamos a aceitar a hipótese segundo a qual a natureza não precisa de nós; as montanhas não lêem os nossos poemas... e até a Lua continuaria a reflectir o lampejar cíclico da claridade em segunda-mão.                                                                                                             
Enfim, sofrer em silêncio faz parte do património musical do ilhéu “educado na escola da tortura repetida e no uso do penar tornado crente”. Há a valentia do silêncio da coragem. E há ainda o silêncio todo feito de cuidados oficiais, de ciáticas emocionais, de prudências administrativas... É o silêncio da cobardia!
2 – autonomia regional Açoriana – ‘unfinished business’...
 Atrevo-me a sugerir que a democracia deveria funcionar como vacina cívica contra a fragilidade ética dos candidatos ao baronato do mercantilismo açórico. As instituições (tal como os indivíduos) não escolhem as crises que merecem...  mas é normal que tenham de gerir as crises que semeiam. Aliás, considero como piolhice gratuita a guitarrada nostálgica interpretada pelos zelosos narradores da decorrente crise sócio-financeira regional. E já gora, seja-me permitido lembrar o pensamento do ilustre professor J.K. Galbraith: “all democracies live in fear of the influence of the ignorant.”
Uma vez terminado o compreensível alarido das felicitações alusivas à permanência democrática, os vencedores deveriam ‘açorianizar’ o perfil ideológico e aperfeiçoar a sua identidade autonomista. Lembramos que as promessas políticas não merecem ser entendidas como ‘juras-d’amor’, dado serem amiúde vistas como pseudo-verdades arrancadas ao madeiral táctico dos candidatos. Além do mais, guardamos a impressão de que a maioria dos ilhéus açorianos continua receptiva ao cínico princípio maquiavélico, que reza assim: “human beings are just finite envelop of the spiritual greatness”.  
A maioria dos votantes nas recentes eleições regionais sabe que este Governo não é uma ultreia de crentes, tal como a Assembleia Regional não é um clube de amigos. Uma das tarefas da ALRA deveria ser a de apoiar jornadas pedagógicas anti-medo da crise. Arrisco a sugestão para a Oposição regional afastar a suspeita de que, nesta fase, prefere viver repoisada no acampamento pluralista da improbabilidade de ser chamada a gerir a Autonomia Democrática.
Estar na Oposição não é um modo de vida – é um necessário compasso de espera!  Ultimamente, o PS/A parece estar para a Autonomia como o catolicismo está para o Cristianismo – ou seja, uma instituição preocupada com os seus judas (que nem sempre merecem os clássicos 30 dinheiros). Continuamos a aprender que o desbotado conselho emocional ‘amar os pobres e detestar a pobreza’  já deu provas da sua ineficácia operacional. Não nos parece possivel minimizar (eliminar) a pobreza, simplesmente através da aritmética...
.../... de resto, os seres humanos não desistem do passa-tempo favorito: odiar, cordialmente, o semelhante. Daí ser provável que a Vida mais não seja que “um breve (quiçá descuidado) interlúdio entre dois grandes mistérios irmanados na complementaridade das suas oposições”...  conforme supõe a teoria chinesa ‘Yin –Yang’.
Entretanto, a Autonomia Regional promete ser uma ponte com dois sentidos – Ida & Volta.
          
(*) O autor do texto permanaece distante do recente acordo ortografico       

João Luís de Medeiros*

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