Diário dos Açores

Turismo e estradas

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Ao longo de quase duas décadas sempre que tive oportunidade de servir de guia aos nossos visitantes ouvi como eles se mostravam surpresos e enalteciam encarecidamente o facto de as estradas regionais, vias rápidas e estradas secundárias (de agricultores e vaqueiros) serem um “brinquinho” com as ervas bem cortadas rente aos rails de proteção, sem crescerem avassaladoramente para o meio da via. Todos eram unâ-nimes em invejar os cantoneiros que assim permitiam termos as estradas mais belas e mais bem tratadas. Não consigo determinar se foi com a pandemia, se foi com a mudança de governo ou seria da mudança de lua, que tudo se desmoronou e hoje qualquer estrada que se preze (falo apenas de São Miguel nesta instância) está com sebes e arbustos por cima dos rails de proteção e dos muretes, as bermas nem se distinguem do mato, nem se sabe onde começam ou acabam.
Aqui na costa norte onde vivo o fenómeno é particularmente visível agora que a via Lombinha da Maia – Maia foi cortada para obras de requalificação depois das derrocadas de 2015. As pessoas são obrigadas a desviarem-se  pela Lombinha rumo aos Calços da Maia (Barreiros) e  descer pelos Calços ou pela Gorreana para a MAIA. Nos poucos quilómetros dessa via é só ervas sem que se saiba onde ficam as bermas. Nas vias circundantes, nem todas de lavoura, o fenómeno é idêntico…
Tenho prestado atenção ao ciberespaço, mas parece que sou o único que se preocupa com a perda daquela distinção de vias limpas e bem tratadas com que recebíamos os turistas.
Não sei se a responsabilidade é só das Juntas de Freguesia ou se sobra alguma para os departamentos regionais mas o que convinha era que viessem ver o estado miserável das bermas (parecem mesmo as do continente) e arranjassem umas companhias de cantoneiros para meterem mãos à obra, mensalmente, como era costume.
A partir de janeiro 2024 os passageiros dos cruzeiros vão pagar 3 euros de taxa turística (quem paga pelos cruzeiros nem dará conta dos 3 euros), mas convinha aplicar também taxas a quem polui as ribeiras e montes das ilhas com detritos de toda a espécie, que causam desmoronamentos e inundações até serem lançados no mar. O chão das cidades, vilas e freguesias nunca primou pela limpeza, apesar de nas freguesias termos recipientes do RIS a limparem o chão das vias. Dizem que está melhor do que quando aqui cheguei no início do século mas a falta de civismo é bem visível e não só por altura das festas paroquiais.
Este governo teve o mérito de introduzir a tarifa reduzida  nos voos interilhas , para residentes, limitadas a 60 euros, o que permitiu reduzir o desconhecimento que os nativos tinham das restantes ilhas, mas simultaneamente ostracizou São Miguel e Santa Maria ao cortar, há 3 anos, as ligações marítimas com que podíamos viajar entre maio e setembro. E nem vale a pena ficar à espera dos navios elétricos que vão construir ou do desvio de dois navios do Grupo Central. Obviamente que o Grupo Oriental está fora da escala de viagens interilhas. Mas também não temos avião de carga nem navios mistos daqui para a Ibéria, pelo que nos devemos dar por satisfeitos por ainda haver SATA.
Com a febre do turismo (parece a corrida ao ouro em 1880) e da construção de hotéis, AL, turismo rural e não sei que mais, nem se dão conta de que este turismo massificado não dura para sempre. E a sustentabilidade de que tanto se fala é uma palavra vã enquanto os turistas destroem a natureza e os seus encantos nas ilhas. Bem, resta a consolação de que podem converter os hotéis de luxo em asilos para idosos…

Chrys Chrystello*

*Jornalista, Membro Honorário Vitalício nº 297713

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