Diário dos Açores

Região Autónoma: Procura-se

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O projeto de revisão da Constituição, proposto pela Assembleia dos Açores – é todo ele uma enorme ingratidão ao povo açoriano: os insulares legitimaram os governos para produção de bem-estar e garantia de direitos fundamentais e eis que estes se dedicam a brincar aos parlamentares constituintes. Este projeto, que tem uma origem de cerca de vinte anos de trabalho parlamentar em várias legislaturas, é infeliz: tem 5 questões positivas, 14 negativas e 3 que são positivas, mas desenquadradas. É contrário ao interesse político direto dos cidadãos autonómicos e não contém questão que interesse objetivamente à autonomia. Dois exemplos:
A Região (novamente) quer proibir a Assembleia da República de propor e alterar norma que não tenha sido suscitada no processo de audição desencadeado pela Região quanto à alteração do seu Estatuto. A Região não percebe que a Constituição não pode conter normas que impeçam o parlamento de alterar tudo quanto seja necessário e legítimo. A Região não percebe – e isso é muito grave porque já temos uma história política própria de meio século – que o que deve constar neste ponto é a possibilidade de renovar a audição porque a Assembleia da República tenha inserido nova norma desconhecida da Região. Ou seja, em vez de a Região aproveitar a revisão para acrescentar mais valias políticas para a autonomia política – provoca o Estado e a inteligência humana. Esta questão é extraordinariamente desnecessária porque não é possível proibir o parlamento nacional que representa diretamente toda a nacionalidade portuguesa. E é inteiramente inútil à autonomia: das duas uma, ou a Região propõe novas normas que não violam a Constituição e assim sendo a Assembleia da República atenderá às necessidades de norma útil para as necessidades dos insulares – e não apenas para os caprichos e devaneios dos governos regionais, não é para isso que serve a República e a Região; ou sendo a proibição uma inocuidade, logo, torna-se desnecessária, o que contraria a função da autonomia que visa governar os insulares com projetos válidos (e não alavancarem o espírito ilhéu independentista). Se os governos regionais quase todos os dias verbalizam que o Estado é centralista, em contrarresposta o Estado deveria verbalizar que os governos regionais são crianças fingidoras de mimadas, mas querendo apenas verbalizar para entreter os incultos e incautos. Não é sintomático?: cá dentro das ilhas o Estado é centralista; no Conselho de Estado sentam-se junto do Primeiro-Ministro e riem à gargalhada. Ou seja, para entreter o mal é do Estado, o que é no mínimo ridículo; mas depois sentam-se ao colo quando estão com ele o que prova onde se situa a centralidade. De que serviu à Região no tempo de Alberto João Jardim e Mota Amaral de combinarem que um atacava o Estado num ponto e o outro noutro? Nada. De que serviu a Madeira durante anos propor ideias independentistas? Nada. E por que motivo a Madeira deixou de o fazer e fá-lo agora os Açores? Porque certa elite está a impor o seu modelo ilhéu e independentista ao modelo regional e universalista. Isso traduz mais-valias para as populações? Não. E para a qualidade da autonomia? Não. E isso pode levar à destruição da autonomia? Claramente.Este tipo de assunto provocatório é relevantíssimo pelos problemas que pode suscitar: a distorção de regras básicas da democracia portuguesa não poderão inquinar a tipologia da autonomia política?, ou mesmo a sua extinção?
O ponto final deste signo é a “Irreversibilidade e irrenunciabilidade da autonomia” e sobre a fachada de uma nova norma com um novo título, “princípios autonómicos fundamentais”, dos quais aqueles dois segmentos. Esta disposição é a mais independentista: «A autonomia constitucional é um direito irrenunciável dos Povos Açoriano e Madeirense». Norma quase equivalente, e respeitadora, já existe na Constituição (nos limites materiais da Constituição para as autonomias regionais). Espanha, que tem nacionalidades, a Constituição diz que as respeita; nos Açores, onde a nacionalidade é unitária, os governos querem garantias que ninguém pode garantir pela natureza das coisas.
Pergunta-se: as elites políticas açorianas querem dominar a liberdade dos açorianos? Eu respondo: sim querem, pela ignorância de uns e pelo domínio de outros. Para isso escudam-se em tretas pseudoautonómicas e ligeirezas constitucionais. E se o parlamento açoriano olhasse para o seu umbigo e visse muitas das suas leis injustíssimas? e outras inconstitucionais? e muitas contrárias à própria autonomia?

Arnaldo Ourique *

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