Diário dos Açores

E tanto que é Saúde Pública

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Saúde Pública e a Saúde do público, semana a semana (26):

A Ciência da Semana: “Reduzir desigualdades durante a pandemia da COVID-19: revisão e síntese de recomendações de saúde pública”

Hoje, trago este artigo de Chloe Brown et al, para leitura. Vários especialistas têm feito recomendações sobre como as autoridades de saúde pública - e os decisores políticos - devem olhar para os determinantes da saúde, na COVID-19. Isto serve para esta Pandemia, mas também para as próximas. Neste artigo identificaram-se as áreas de maior preocupação, e sintetizaram-se recomendações para uma resposta equitativa à pandemia, com base na revisão de numerosos artigos. Recomendações que abrangem todos os níveis de prevenção. 
Ao nível da Prevenção Primordial, 37 artigos analisados pelos autores fizeram recomendações gerais, como sejam: a defesa da cooperação internacional [apoio aos países de baixo e médio rendimento (PRMB) pois esta fortalece a resposta global à COVID-19]; abordar as desigualdades de rendimento, habitação e emprego, para minimizar as disparidades sociais e proteger os mais vulneráveis; dar apoio específico a pessoas com VIH, imigrantes, populações idosas, populações sem-abrigo e pessoas com doenças mentais; incluir indivíduos de populações marginalizadas nos processos de tomada de decisão, para que as “suas necessidades e barreiras sejam compreendidas e incorporadas numa resposta abrangente”; fazer mudanças políticas específicas, como, aumentar o financiamento dos sistemas de saúde, aumentar a preparação para pandemias nas prisões e aumentar o acesso a programas de tratamento para dependentes de opiáceos. 
14 artigos sugeriram novas políticas que ajudassem directamente populações marginalizadas. 10 artigos destacaram a necessidade de estudos sobre os impactos da COVID-19 e as barreiras em populações específicas. 15 artigos apelaram aos prestadores e organizações de saúde para se envolverem na advocacia, para que os profissionais de saúde usassem as suas vozes na defesa dos grupos desfavorecidos.
Ao nível da Prevenção primária alguns artigos recomendaram que os PRMB se concentrassem em estratégias que evitem o sobrecarregar dos sistemas de saúde, com capacidade limitada. 50 artigos sugeriram o uso da telemedicina, para reduzir a exposição à COVID-19. As recomendações incluíam tornar o acesso à Internet gratuito, fornecer computadores a famílias de baixo rendimento ou prestar serviços via telefone. 17 artigos recomendaram serviços de telemedicina nos cuidados de saúde mental. A telemedicina também pode ser usada em populações que enfrentam barreiras no acesso aos cuidados de saúde, como comunidades rurais.
A melhoria da comunicação e da educação à volta da COVID-19 foi discutida em 81 artigos, destacando-se as populações com maiores necessidades de comunicação e educação na prevenção da COVID-19, como: dependentes de substâncias, populações idosas e populações deslocadas. Isto exigiria o uso de meios para atingir um público amplo, incluindo as redes sociais. Os autores frisaram a necessidade de garantir que “todas as mensagens, tecnologias e comunicações de saúde pública sejam acessíveis a todos”. 
34 artigos recomendaram melhorar as medidas de protecção de indivíduos em risco. Alguns discutiram a necessidade de mais equipamentos de proteção individual (EPI) em grupos específicos, como os trabalhadores com exposição ocupacional, nas prisões, nas escolas, os cuidadores de doentes em cuidados domiciliários ou em instalações residenciais. EPI devem ser fornecidos a indivíduos de populações de alto risco, como idosos e pessoas com deficiência.
82 artigos incluíram sugestões sobre as consequências não intencionais das estratégias de contenção, como o fecho de escolas, com recomendações que incluíam o fornecimento de refeições a famílias que dependem de refeições fornecidas pela escola, o fornecimento de tecnologia a famílias de baixa rendimento para que as crianças possam participar on-line, ou o fornecimento de recursos aos pais entregues a cuidados às crianças em tempo integral.
Ao nível da Prevenção Secundária, 34 artigos defenderam a melhoria dos testes à COVID-19 em populações marginalizadas, nomeadamente a necessidade de testes rápidos e acessíveis em ambientes com recursos limitados, a fim de controlar a propagação do vírus. 
Ao nível da Prevenção Terciária, os autores recomendaram a criação de sistemas e directrizes para melhorar o atendimento de casos de COVID-19 em populações vulneráveis. Isto inclui avaliar e priorizar doentes em ambientes com recursos limitados, a fim de remover preconceitos. 21 artigos discutiram recomendações relacionadas com o aumento do apoio aos doentes com COVID-19 em populações vulneráveis. 5 artigos recomendaram a abordagem tanto da COVID-19 como das comorbilidades existentes, incluindo doenças psiquiátricas, obesidade, dependentes do uso de opióides. Os artigos recomendaram melhorar a qualidade dos cuidados à COVID-19 em doentes idosos, através dos cuidados comunitários, e permitir visitantes a doentes próximos da morte no hospital. 
Sem alaridos, e sem existir ainda esta revisão, isto foi sendo feito, onde houve quem sempre tenha mostrado um nível de Humanidade raro, no estranho Tempo em que vivemos.

Os dados para análise: o Programa “Nascer Mais”, um passo a favor da Saúde Pública 

Esta semana o Vice-Presidente do Governo Regional dos Açores, Artur Lima, anunciou que o programa “Nascer Mais” será alargado, em 2024, a todos os com concelhos dos Açores considerando considerando as conclusões do relatório de avaliação do projeto-piloto.
Das conclusões do relatório de avaliação destaca-se: 90% dos beneficiários consideraram que o apoio de 1.500 euros “contribuiu” ou “contribuiu muito” para a redução de encargos financeiros. 53% dos beneficiários referem que tiveram uma poupança mensal entre 100€ e 200€ e 10% tiveram uma poupança de 250€. Em caso de inexistência do programa, famílias com menores rendimentos teriam dificuldade em adquirir vacinas não incluídas no Plano Nacional de Vacinação (68%).
Nenhum beneficiário considerou que esta ajuda deveria ser concedida através de um apoio monetário atribuído directamente às famílias. 96% dos adquiridos estão “satisfeitos”, “bastante” ou “muitos satisfeitos” com o programa.
Eis como se comprova facilmente como medidas sociais, por mais simples que possam parecer, têm elevado impacto na saúde pública. Bem-haja quem assim faz!

A homenagem da semana: à memória. Um pouco de História recente.

A memória de alguns é muito selectiva. Demasiadamente selectiva. Chega até a parecer que nos pretendem, com a sua falta de memória, fazer passar - a todos - por tolos. Por isso, deixo aqui, para leitura posterior (que poderá ser lida na íntegra na página https://www.facebook.com/saudepublicaparatotos) a lembrança de algumas notícias, publicadas no jornal “Açoriano Oriental”, em jeito de “Memofante”.
A de 15.04.2014 (A triste “estória” da passagem do Dr. Sampaio Duarte, médico de família, pelos Açores, Região que suplicava então - ainda mais do que hoje - por médicos de família);
A de 19.02.2017 (“Médicos voltam a ganhar salários acima do Chefe de Estado” - Médicos dos Centros de Saúde do Nordeste e da Povoação voltam a ganhar vencimentos acima do Presidente da República);
A de 26.09.2017 (“Antigo Diretor Regional da Saúde contesta suspensão” - João Soares, ex-diretor regional da Saúde, apresentou providência cautelar para contestar suspensão imposta pela Unidade de Saúde de Ilha. (…) “O médico queixa-se de estar a ser perseguido porque quando desempenhou o cargo de Diretor Regional da Saúde acabou com salários de médicos superiores ao salário do Presidente da República”).
E a de 01.10.2017 (“Ex-diretor da Saúde retira ação judicial contra USISM - Rui Luís (Secretário da Saúde) serviu de mediador no litígio entre João Soares e a Unidade de Saúde de São Miguel. Na altura ninguém foi demitido, ou pediu a demissão).
A importância da memória escrita, da História, é precisamente não permitir que alguns a reescrevam, como bem lhes pareça. Reescrevam, para ficarem na História com uma imagem angelical. Anjos que nunca foram. E a memória (de tempos em que se sanearam servidores públicos por alertarem para a Verdade) prova-o.

Mário Freitas*
*Médico  consultor (graduado) em Saúde Pública, com a competência médica de Gestão de Unidades de Saúde

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