Diário dos Açores

Whats on in azores - agenda sem conteúdo

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No final dos anos 60, o então Rádio Cube Português apresentou o programa “Os intocáveis” da autoria dos locutores Paulo Fernando e Orlando Dias Agudo, dedicado à divulgação de discos de má qualidade. Era uma análise controversa, mas bem fundamentada e respeitada pelos ouvintes.
A frase usada para a crítica era: “este disco é intocável mas felizmente não inquebrável, por isso vamos parti-lo”. E seguia-se o som de um vinil a partir-se no chão.
Vem isto a propósito da aplicação apresentada esta semana “whats on in azores” com o  objetivo de disponibilizar aos visitantes os eventos que se realizam nas várias ilhas. Iniciativa à partida louvável, não fosse a pouco cuidada informação sobre cada uma das nove ilhas, dando a ideia de que os textos não passaram pelo crivo de quem conhece minimamente os Açores. Acresce ainda a péssima tradução Inglês-Português que nuns casos usa uma palavra e noutros outra.
Cito este exemplo:    
“A maior vila (sublinhado meu), Angra do Heroísmo , é património mundial da UNESCO - um testemunho da realeza e dos nobres que, uma vez ou outra, contribuíram para a paisagem da vila, resultando nos seus maravilhosos exemplares da arquitectura dos séculos XVII e XVIII. É um centro administrativo e cultural regional, onde a música, a literatura, o teatro e a educação influenciam o estilo e a atmosfera desta fascinante cidade (sublinhado meu).”
Desconheço por que recorreram ao tradutor Google para o texto em Português. Relegar para essa aplicação a tradução do texto de inglês, que permanentemente, nos interroga se concorda ou não com o texto, é um mau serviço prestado à nossa língua, cultura e identidade. São estas as  matrizes em que se fundamenta a nossa maneira de ser e de estar aqui ao longo de quinhentos anos.
Os textos revelam um desconhecimento geográfico, histórico, arquitetónico, cultural, económico, administrativo e até turístico das várias ilhas, áreas sobre qualquer visitante procura informar-se.
Será que exagero quando contesto esta informação parcelar e imprecisa é errónea?: “Sobre os Açores existem voos para as ilhas (operados pela companhia aérea regional TAP Air Portugal) e ferryboats entre as ilhas.”?
Isto para já não falar das incorreções administrativas, gramaticais, turísticas e até históricas, cujas descrições são de um simplismo confrangedor que não dignifica o nosso destino. Cito alguns exemplos: “Ilha de São Miguel -O maior de todos. Em Ponta Delgada, a capital”.
É confrangedora a omissão sobre a Imagem do Senhor Santo Cristo dos Milagres numa descrição patética sobre “casas de dois pisos com varandas e torres com miradouros (?)”.
“Em frente à praça [Gonçalo Velha Cabral (sic)], uma estrada continua ao longo da zona portuária até à imponente fortaleza de São Brás; atrás dela fica uma atraente praça, a Praça 5 de Outubro, cujo destaque é a fascinante Capela de Nossa Senhora da Esperança. Em contraste com o dourado ornamentado que rodeia o altar, as suas paredes são revestidas de azulejos azuis e brancos representando cenas bíblicas. A partir da praça, siga pela rua estreita paralela à estrada do porto, ladeada por casas de dois pisos com varandas e torres com miradouros.”
Com tanto simplismo não admira que sobre uma das mais visitadas belezas naturais de São Miguel se diga: “a Lagoa do Fogo é o mais remoto dos lagos”. Se assim fosse não seria tão visitada.
Voltando à Terceira, afirma-se que “As Festas do Espírito Santo levam a cerimónia da Coroação do Imperador a todas as aldeias da ilha, seguida de uma celebração unida onde a comida e o vinho produzido localmente são apreciados em abundância. Outro evento local notável é a corrida de touros, onde o touro não é ferido, mas os homens locais muitas vezes não se safam tão facilmente!”
Tão infantil e primária descrição ignora que as festas do Espírito Santo são comuns e diferentes de ilha para ilha. Também nada se diz sobre a importância das touradas à corda nas várias manifestações da cultura popular.
Sobre São Jorge, não há qualquer referência às típicas Fajãs, nem ao afamado queijo, nem ao café da Fajã de São João. Já não falo do “esquecimento” de Francisco de Lacerda, nem de uma plêiade de cientistas, escritores, músicos e políticos de renome nacional que honram todas as ilhas.
O autor do texto sobre esta ilha, caracteriza as “Velas, com o seu porto de pesca, é a principal vila.” esquecendo ou ignorando o porto comercial, na imagem anexa mas desatualizada, porque anterior à sua ampliação, e que o ferry “Express Santorini” já há muito por cá não anda.
Não sei como se permite afirmar que o Pico, é “Segunda maior ilha dos Açores e a mais obviamente vulcânica” se todas elas o são, obviamente -São Miguel, com mais propriedade.
O que se pretende afirmar que o Pico tem “uma costa cheia de carácter e um interior que parece agourento – até desolado, pelo menos na parte superior do vulcão que dá nome à ilha, e a Portugal a sua montanha mais alta (Ponta da (sublinhado meu)Pico, 2.351m) ?
Na Página sobre a restauração, que só contempla três ilhas (S. Miguel, Terceira e Pico), recorda-se “os barcos de fruta para a vila (sublinhado meu) da Horta pelos homens e mulheres que aí os vendem”. Menciona-se também a antiga vocação para a produção de frutas, nomeadamente: “ameixeiras e pessegueiros, ameixeiras e laranjeiras. Mas são os figos, de interior vermelho como rubis, uma verdadeira iguaria para os gourmets, que melhor simbolizam a deliciosa fruta do Pico.” Todavia, não há qualquer referência à produção vitivinícola, nem à paisagem da UNESCO.
Fala-se na longa (?) história da caça à baleia (que só teve cerca de um século) “evidente numa visita à antiga fábrica baleeira em São Roque e ao fascinante museu baleeiro nas Lajes, todos a 40 minutos de carro da capital (?), Madalena.”
São demasiados erros para uma iniciativa oficial que parece não ter sido supervisionada para permitir uma informação correta, embora curta, sobre cada uma das ilhas, seja em inglês, seja em português. O incompreensível recurso à tradução da Google teria sido recusado por qualquer tradutor idóneo ou até mesmo por qualquer operador turístico local, face à qualidade dos guias turísticos existentes.
Com pena o digo: Este é um mau serviço público que envergonha qualquer operador açoriano, ciente do valor histórico, paisagístico, patrimonial e cultural de cada ilha.
Por isso, o quanto antes, tem de ser ocultado/cancelado da internet e sujeito à correção e reformulação de conteúdos e respetiva tradução em Inglês e em Português.
Como está, é incontatável.

José Gabriel Ávila*

*Jornalista c.p.239 A
http://escritemdia.blogspot.com

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