O partido Volt Europa: entre  transnacionalismo e pan-europeísmo

O partido Volt Europa: entre transnacionalismo e pan-europeísmo

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Não é comum discutir sobre a possibilidade de criar partidos a nível transnacional entre todos os Estados-Membros da União Europeia (UE). Principalmente em Portugal que, generalizando através dos resultados eleitorais das eleições europeias, a grande maioria da população não está interessada de todo nas políticas europeias e no funcionamento da UE no geral. O que é interessante saber, contudo, é que um partido em particular captou a atenção dos portugueses nas eleições autárquicas passadas. Provavelmente repararam nas ruas uns cartazes/posters de cor lilás com um slogan de “o primeiro partido pan-europeu” e logo de seguida (ou antes) as palavras “Volt Europa”. E pode-se confirmar, efetivamente, que o Volt Europa é o primeiro partido pan-europeu cá em Portugal e o único até agora.
O Volt é um partido político com sede em Bruxelas, criado em 2017 no dia 29 de Março, que protagoniza um papel pró-europeu, de raiz federalista e que apoia políticas e temas relacionados com a UE num todo em vez de assuntos predominantemente nacionais. Curiosamente, foi criado no mesmo dia que o Reino Unido pediu a sua saída da UE, pelo que a criação do Volt foi vista como uma reação ao Brexit e ao populismo crescente em toda a Europa. Desde a sua criação, o partido foi espalhando as suas subsidiárias por cada Estado-Membro.Assim, ao contrário dos partidos políticos “europeus” (ou Europartidos) que são constituídos de baixo para cima, ou seja, por partidos políticos nacionais de todos os Estados-Membros, o Volt é estruturado de cima para baixo: é uma organização política que cria “sub-partidos” em cada Estado-Membro, sendo uma estrutura mais centralizada a nível europeu do que um Europartido composto por vários partidos nacionais. Assim, o Volt ultrapassa a mera conceção de organização “guarda-chuva” como os Europartidos na UE.
Em Portugal, o Volt conseguiu obter assinaturas suficientes em 2019 e foi aprovado pelo Tribunal Constitucional em 2020 como um partido político legalizado no país.O que chama a atenção é mesmo a identificação do Volt Europa. É um partido categorizado como pan-europeu em termos de atividade política, como também pode ser reconhecido como um partido nacional por ter uma estrutura composta por membros nacionais e ser institucionalizado oficialmente como um partido nacional. A constituição portuguesa não expressa uma proibição de partidos a nível pan-europeu/transnacional no nosso país, contudo a existência de um partido formalizado como “pan-europeu” poderia apresentar uma ameaça ao artigo 10 sobre os partidos políticos concorrem no respeito “pelos princípios da independência nacional” e da “unidade do Estado”. De uma certa forma, acredito que a estratégia do Volt de institucionalizar-se como um partido nacional foi a mais acertada, embora a sua atividade política centra-se, principalmente, sobre tópicos europeus e o papel nacional na União Europeia (e vice-versa).
Em Portugal pelo menos, seria uma tautologia ao confirmar que o Volt seja um partido europeu a 100%, visto que é formalizado como um partido nacional agindo em nome da Europa. No entanto, para os europeístas, o Volt Europa é considerado como um passo em frente para a criação de um partido verdadeiramente transnacional e pan-europeu, que participará em futuras eleições e que pode eleger deputados caso obtenham votos suficientes para representar os interesses de uma comunidade europeia. Será a solução para o fracasso que foi os Spitzenkandidaten e da suposta utopia na criação de listas transnacionais para as eleições europeias? Consegue este partido e as suas subsidiárias ultrapassar os obstáculos que impõem aos Europartidos de serem verdadeiramente organizações transnacionais? Ainda é cedo apresentar uma resposta agora, pois iremos ver o quão eficaz será o Volt nas eleições futuras que irão decorrer no nosso país e nos restantes Estados-Membros. Mas uma coisa é certa: o Volt só conseguirá ter sucesso se os cidadãos compreenderem o que está em jogo, neste caso sobre o futuro da UE.
Ao contrário dos restantes partidos políticos nacionais, não está em questão um espectro de apoio esquerda-direita, mas sim europeísmo-euroceticismo. Visto que os cidadãos portugueses votam nas eleições (tanto legislativas, regionais e locais, como europeias) com base em valores e crenças nacionais e de esquerda-direita, será difícil prever um futuro de sucesso para o Volt em Portugal. O Volt só conseguirá captar a atenção dos portugueses se a organização política e económica que o partido apoia, a União Europeia, conseguir apresentar alternativas de reforma profundas na sua estrutura política e democrática, que, desde décadas passadas, continua a enfrentar um défice. Até esse défice ser atenuado, o Volt Europa não conseguirá gerar um impacto político e eleitoral significativo no nosso país e na Europa em geral. Devido a esta dependência, o melhor amigo e inimigo do Volt é a própria União Europeia.

* Investigador doutoral em Ciência Política pela Universidade de Aveiro

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