Humanização dos cuidados de saúde
António Raposo

Humanização dos cuidados de saúde

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Conselhos de Médico

1 – Humanização dos cuidados de saúde.
2 – Depois das minhas férias da profissão (em agosto) e das férias das crónicas no Diário dos Açores (mais prolongadas) aqui estou de novo para mais um período destes Conselhos de Médico.  
3 – Vem este artigo a propósito de um caso que aconteceu com um familiar próximo.  Esta doente, de 85 anos, recorreu ao Serviço de Urgência do Hospital Divino Espírito Santo de Ponta Delgada, EPE (Empresa Pública Empresarial), vulgarmente conhecido por HDES. A filha é que acompanhou a senhora.  Com uma hipótese de infeção respiratória foi admitida para a área “Covid” onde fez o teste (PCR ?). Ficou mais de 16 horas numa cadeira de rodas, debilitada pela idade e pela doença. A filha foi sabendo da situação clínica da mãe através do contacto via telemóvel.  Perto da meia noite a filha dirigiu-se ao Serviço de Urgência para saber “alguma coisa” do estado de saúde da mãe.  A informação veio da parte de um funcionário administrativo que disse que “a Drª. manda dizer que a sua mãe tem uma infeção … e vai ficar internada”.  A filha pediu para falar com a médica mas tal foi-lhe negado…!!!
4 – A doente, repito de 85 anos, só foi transferida para o internamento pelas 5 horas da madrugada.  Até lá esteve sempre “sentadinha e caladinha” numa cadeira de rodas…
5 -No dia seguinte (sábado) a filha foi inteirar-se da situação da mãe, já no internamento, e perguntou a que horas podia fazer a visita.  Foi informada que ao fim de semana “não se fazem marcações de visitas”, pelo que tal só seria possível na segunda feira.  Contrariada a filha regressou a casa a chorar copiosamente, pois não lhe deixavam visitar a mãe…!!! A doente e a filha com as duas doses da vacina contra a Covid 19. Mas a “lei” não obriga todos os funcionários dos hospitais a ser vacinados…!!!  A vacina é um ato voluntário.
6 – Nesse mesmo dia (sexta feira15 de outubro) a Drª. Piedade Lalanda apresentou um estudo na Universidade dos Açores em que se referia a este problema da humanização dos cuidados de saúde, que passo a citar uma passagem “…um sistema que se preocupe mais em processar pacientes do que em cuidar deles, retira a humanidade da relação terapêutica e transforma médicos e pacientes em “robôs” ou num “computador”… A eficiência estatística pode por em causa a prática em saúde, ao privilegiar a perspetiva biológica da doença, esquecendo todas as outras dimensões que decorrem da experiência vivida da doença, percetíveis numa relação empática e compassiva dos profissionais de saúde. Agir com empatia e compaixão, significa ter em consideração a pessoa que acorre ao sistema de saúde, na sua idade, género, condição de vida, perceção do que é saúde e doença, recursos socioeconómicos e experiências vividas anteriormente. Uma pessoa doente não é um órgão afetado; umas análises fora dos parâmetros “esperados”, nem o número de um processo…” Fim de citação.
7 – A humanização em saúde é um bem da sociedade. Cuidar de doentes, ainda mais sendo idosos, não é igual a “tratar doenças”.  Cuidar de idosos é transmitir ao doente e à família o necessário calor humano, gerando empatia e tendo uma atitude diligente e otimista de forma a proporcionar um ambiente e uma relação agradável entre os profissionais de saúde, o doente e os seus familiares.  Os enfermeiros fazem isto muito bem há mais de um século…!!!
8 - Para a humanização dos cuidados de saúde não é só necessário ter boas instalações e boas condições técnicas para fazer os tratamentos. Cuidar de doentes é muito mais que isso.  Exige carinho, atenção, disponibilidade e amor aos doentes, que são a causa da nossa existência (profissionais de saúde), e ao mesmo tempo que se ama a profissão que escolhemos para “CUIDAR” de doentes e não para tratar o doente da cama 5…!!!
Nota 1: Uma das melhorias da humanização em medicina foi quando se criaram os serviços de Pediatria onde as crianças são tratadas de uma forma diferente dos adultos, porque na realidade não são adultos em miniatura, são crianças e adolescentes. Mais tarde até os atendimentos nos serviços de urgência passaram a ter uma secção independente para a Pediatria melhorando a humanização dos cuidados.
Nota 2: Por analogia com a Pediatria deveriam ser criados circuitos independentes para a assistência aos nossos idosos nas consultas e nas urgências, pois eles tanto contribuíram ( e como diz o nosso povo “só Deus sabe o que eles penaram e os sacrifícios que fizeram”) para que hoje os seus filhos e os seus netos tenham a qualidade de vida que têm. Mais respeito pelos nossos idosos é preciso e mais carinho.
Nota 3: Apesar da melhoria da situação da pandemia de Covid 19 nos Açores, a situação em S. Miguel não está nada boa, com mais de 200 casos ativos. Mesmo com as vacinas já efetuadas é necessário manter algum distanciamento social e usar a máscara em espaços fechados. Membros do governo em espaços fechados, sem utilização da máscara, sistematicamente a aparecer na televisão aos beijos e abraços de certeza que não são um bom exemplo. Se calhar é alguma indicação das “agendas mobilizadoras” que como foram às escondidas não tivemos acesso.  Haja saúde.

 

*Médico fisiatra
e especialista  em Medicina Desportiva

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