Alguns traços do Pensamento e Obra de José Ribeiro Dias (II)

Alguns traços do Pensamento e Obra de José Ribeiro Dias (II)

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Filosofia da Educação e Educação de Adultos

“Onde aprendemos a Cuidar senão com quem, em verdade e amor, cuidou de nós, que se nos deu e, depois, damos e continuamos a receber, em Amor e Dor, em luz crescimento, que nos faz sentir e pensar, a fundo, na vida, na morte e na eternidade. Em cada dia vivemos e morremos, em cada dia nascemos”.

 

No contexto deste texto – no qual apenas são esboçados alguns traços – quero retomar o que já foi dito sobre educar e filosofar, relacionar e aprofundar, dentro do possível, com a Educação de Adultos. Sem uma Filosofia da Educação – também uma Teoria da Educação – não podemos compreender o é – ou quando há – Educação, e o que é e como formar educadores e professores, do mesmo modo como não podemos compreender o que é e como realizar a Educação de Adultos e os métodos de formação mais adequados para essa finalidade. A bibliografia é vasta. Já lecionei a disciplina (unidade curricular) de Educação de Adultos no Mestrado em Educação e Formação, na Universidade dos Açores. Aqui, não poderei ocupar-me da vastidão do tema mas pretendo enunciar aspetos e dimensões importantes que se deve ter, necessariamente, de modo flexível, na Educação de Adultos, tendo em conta as conceções do Professor José Ribeiro Dias, um dos pioneiros da Educação de Adultos. Mas hoje acho que devemos ir mais além: a Educação de Adultos, a Saúde e a Doença da Pessoa Idosa. Onde aprendemos a Cuidar senão com quem, em verdade e amor, cuidou de nós, que se nos deu e, depois, damos e continuamos a receber, em Amor e Dor, em luz crescimento, que nos faz sentir e pensar, a fundo, na vida, na morte e na eternidade. Em cada dia vivemos e morremos, em cada dia nascemos. Como afirma a minha Mãe Leontina: “um dia não é igual ao outro” e é nesta surpresa e neste inesperado e de aceitação que encontramos o inédito da vida, num caminhar de Sabedoria. Mas é preciso ver, sentir e pensar com os cinco sentidos. A toda a Filosofia e toda a Educação são insuficientes para falar da vida que há para viver. Num mundo de tanta suposta comunicação, de tanto enredo e ruído nas redes sociais – e nas falsas relações humanas - ganha ainda mais força a potência da Linguagem que vem da nascente, que se cruza com as linguagens das experiências, e que fica à beira do mistério insondável. E na senda das palavras, procuramos que os étimos nos possam abrir o inacessível. A fala que está no mistério do espírito, da alma, que tende a dizer-se a fazer-se entender. A fala, as palavras, esses mistérios sagrados que profanamos na vida. Há que restituir às palavras a sacralidade que as habita. A Educação de Adultos deve ser um forte abalo e choque, também, com essa consciência de estarmos despertos para a fala dos nossos cinco sentidos, em que uns podem vir em socorro dos outros, Em que no olhar pode estar a luz mais expressiva da nossa fala, porque pode acontecer a dor de ver “o sentido de “fechar-se, fechar (especialmente os olhos e a boca”. E há uma luz que irradia na Dignidade de sentirmos pessoas na relação que nos dá essa dignidade.
Muitas vezes é urgente “fazer silêncio”, que é mais do que o silêncio, como me ensinou a Minha Mãe. Numa aprendemos a tempo do que vamos precisar, na educação ao longo da vida, até morrer, que é a ultima palavra, ou talvez não, porque somos sempre a Presença das nossas palavras, das nossas ideias, dos nossos gostos, das nossas vontades, que se enraízam como memórias vivas que dão continuidade ao que fomos, ao que os outros foram e são, e continuam a ser em nós. Ao longo da vida temos tantos ganhos e perdas, e há que fazer lutos, ter paciência e continuar a caminhar. Se a Filosofia da Educação e a Educação de Adultos não entender isso, de pouco serve, como serviço de ser. É a pessoa na sua fisionomia física, psíquica, mental, espiritual que se reconfigura sempre em nós. Só assim há proximidade natural e diálogo que nos fazer crescer. O diálogo dá-se sempre com algum dos nossos sentidos. Na vida os cinco sentidos estão em plenitude. E quem é míope sabe isto desde cedo. Mas é assim. Há que superar.
Há uma vontade natural, um impulso para falar. E pode haver a consciência disso, ao longo do processo da doença ou do declinar, que se integra, de modo interpessoal, na Educação ao Longo da Vida. Não basta falar de uma velhice ativa, com ativismo, isto é uma falácia. Há múltiplas formas de envelhecer e todas têm a sua beleza se nos colocamos no Horizonte da Transcendência, no Sentido de Deus, da Alteridade plena, que é insondável para nós, apesar da nossa fala ou da nossa mudez.

Afirma José Ribeiro Dias:
“(…) mesmo continuando a haver muitas palavras disponíveis, não podemos verdadeiramente falar.
Talvez por isso os etimólogos, através do grego mủe do latim arcaicomu, levam-nos a remontar ainda mais longe, à raiz onomatopeica mu, caracterizada pelo fechamento dos lábios e que pode reduzir-nos simplesmente a nos mantermos mudos, ou apenas a procurarmos imitar o murmúrio de uma corrente suave, ou a mugir – um! mu! – como as vacas, ou a balir – mé! mé! como as cabras e as ovelhas.” (Dias, 2018, p.17).  

Que profundidade para sondarmos o Mistério da Vida, das nossas vidas, das vidas que cuidamos, de uma vida, também através do método autobiográfico, ou biográfico, ou histórico biográfico. Vidas que caminham para um silêncio que é a morte, essa possibilidade tão certa que tanto ocupou e preocupou Vergílio Ferreira. Não aprendemos Educação de Adultos ou Educação ao Longo da Vida apenas nos livros que têm essas sugestões nos livros. Muitos têm esses títulos mas vão ao fundo, são, geralmente, livros de Filosofia da Educação, em que se questionam sobre o que é a Vida e a Educação, sobre o que é o Curriculum Vitae, que é onde se decide o que vamos fazendo mas também as nossas impossibilidades, em existência e coexistência. Talvez fosse útil fazermos um Curriculum Vitae das coisas que queríamos e não conseguimos fazer. Seria o CV das nossas impossibilidades e do ser das possibilidades, que é um modo de manter a esperança, como nos ensina Viktor Frankl.
Afirma José Ribeiro Dias: “Existir, como ser humano, é crescer. A caminho da plena realização como pessoa. Em ligação, interação, comunhão com todos os outros seres humanos. Dentro do universo em que efetivamos o nosso curso ou percurso (curriculum) de existência.” (Dias, 2000, p.9) Eis um programa de Filosofia da Educação, na perspetiva de Educação de Adultos, no caminho d’A Realização do Ser Humano e da sua compreensão, nos contextos da vida.
O Curriculum Vitae não é tudo, nem talvez principalmente, o que lá está mas o que está pressuposto no que lá está e, até, no que lá não está nem de forma direta nem de outra forma. O que nos fez mudar de rumo após um pensamento, uma ideia um sentimento. Isso é curriculum do coração, e é no segredo de nós que mais e melhor se decide o que queremos fazer e não queremos fazer, é um diálogo entre a Razão e o Coração no Segredo da vida. As decisões maiores das nossas vidas com que são feitas? Talvez feitas de luz, de ideias claras, mas também de dúvidas, de incertezas. Quantos cursos não gostaríamos de ter tirado e seguido, não falo apenas em cursos no sentido académico mas cursos de vida, de orientação de vida, da nossa vida, na complexidade e simplicidade da nossa vida.


Referências bibliográficas (alguns referências, de uma Obra tão vasta que fica para outros estudos, investigações e escritas).  
 (a indicar no último texto).


*Professor universitário.
Doutorado e Agregado em Educação e na Especialidade de Filosofia da Educação

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