Cidadãos ligados à Cultura escrevem “Carta aberta contra a indiferença
Diário dos Açores

Cidadãos ligados à Cultura escrevem “Carta aberta contra a indiferença

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Um grupo de cidadãos ligados à Cultura escreveu uma carta aberta contra a indiferença, enviada ao nosso jornal.
É do seguinte teor a referida carta:

“A indiferença é perigosa, seja esta inocente ou não.”         
            Papa Francisco

“Não se pode escrever nada com indiferença”
                Simone de Beauvoir

“A indiferença face ao outro e/ou face ao destino comum da nossa sociedade é uma preocupante manifestação de apatia. O silêncio perante a iniquidade, a discriminação e a manipulação dos factospode esconder uma cumplicidade (ainda que inconsciente)potencialmente perigosa como, por diversas ocasiões, a História tristemente já demonstrou.  
É, pois, no contexto de um mundo em profunda transformação, em que as democracias ocidentais estão confrontadas com novos e velhos perigos, que os signatários acompanham, com profunda preocupação, os recentes acontecimentos políticos na Região Autónoma dos Açores.
A democracia representativa, núcleo central onde assenta a arquitetura do nosso sistema político, atribui ao Parlamento, em nome do Povo Açoriano, o papel fundamental na construçãodas soluções que devem ser postas em prática pelos órgãos de Governo próprio da nossa Região.
A Autonomia, conquista de múltiplas gerações de Açorianos, não é um dado adquirido.
Deve, por isso, ser protegida, salvaguardada, nutrida e reforçada pelos valores democráticos, pela firme consciência de uma identidade comum, pela inexorável convicção de que, nestas nove ilhas feitas de lava e de mar, é muito mais o que nos une do que aquilo que nos separa.  
Não podemos, por isso, calar a preocupação quando verificamos que os Açores – e a nossa Autonomia – têm vindo a ser alvo de perniciosas tentativas de aproveitamento político, um mero joguete nas mãos de alguns dirigentes políticos nacionais que, fruto do atual quadro parlamentar saído das eleições regionais de 2020, tentam instrumentalizar ou subjugar os órgãos de governo próprio Açorianos às suas estratégias políticas partidárias.
Não podemos calar a nossa profunda indignação ao vermos o Governo dos Açoreschantageado e humilhado, com a imposição de condições como, por exemplo, um subsídio de natalidade que ostraciza alguns segmentos da população, ou a extinção da companhia aérea SATA Internacional, e, até mesmo, a remodelação do Executivo Regional.  
Não podemos ficar indiferentes, perante o silêncio do Governo dos Açores, ao ver o anúncio público, em televisões nacionais,de que o Governo dos Açores cedeu a todas as exigências efetuadas e que, apenas por isso, o Orçamento e o Plano para 2022 foram aprovados.
O Povo Açoriano é humilde, mas orgulhoso da sua História e da sua Cultura. É um Povo trabalhador e honrado.
Não podemos, pois, aceitar como normal esta permanente chantagem, este clima de vil achincalhamento das nossas instituições democráticas, nem tampouco que se instale, por um minuto, a dúvida de que o Governo dos Açores cedeu e cede a chantagens e se sujeita, em silêncio, a humilhações.
Entendemos não poder, como cidadãos de pleno direito, ficar em silêncio perante estes atropelos e chantagens nascidas de um ideário xenófobo, racista e perigoso para a nossa democracia. Não podemos – nem queremos – que o nosso silêncio possa serou seja interpretado como uma indiferença aprovadora desta situação aviltante.
Entendemos, igualmente, que o Governo dos Açores – e o seu Presidente – não se podem permitir navegar nestas águas turvas que atentam contra a dignidade e o bom nome do Povo Açoriano.
Neste sentido, apelamos ao esclarecimento e publicitação, de forma absolutamente transparente, sobre o teor desse novo acordo. Não é possível, numa democracia madura, transparente e exigente, manter os seus cidadãos à margem dos acordos negociados, supostamente, em nome destes.
A Autonomia é uma conquista do Povo dos Açores, não é uma bandeira nem um património exclusivo de qualquer força política. Não podemos, por isso, assistir impávida e serenamente aos últimos acontecimentos, aceitar de modo cúmplice e em silêncio a chantagem e a falta de informação sobre um acordo que a todos diz respeito, nem, muito menos, considerar natural e normal todas as circunstâncias aqui descritas, e, por essa via, contribuir para a sua “normalização”.
A nossa História secular, a nossa Autonomia, e, sobretudo, o nosso futuro exigem mais de todos nós. Devemos, por isso, honrar a máxima inscrita no nosso brasão: “Antes Morrer Livres que em Paz Sujeitos”.

Assinam os seguintes cidadãos:
Álvaro Borralho, professor universitário; Ana Maria de Sousa Melo, atriz e professora; Ana Brum, designer e encenadora ; Aníbal Pires, professor; Aníbal Raposo, cantautor; Antero Ávila, compositor; Artur Reis, músico; Aurora Ribeiro, agente cultural; Avelina Ferreira, artista de Técnica Mista; Bruno Correia, arquitecto; Carla Ferreira, historiadora de Arte e actriz; Duarte Melo, padre; Emanuel Jorge Botelho, poeta; Fernando Braga, empresário ; Filipe Mota, arquitecto; Graça Machado, enfermeira aposentada ; Hélder Machado, professor; Hélder Cardoso Amaral, professor; Henrique Levy, poeta; Hugo Tiago, gestor bancário; Isabel Silva Melo, professora e artista plástica; Joel Neto, escritor ; José Carlos Frias, livreiro; José Sousa, músico e professor do Conservatório de Angra do Heroísmo; Leonardo Sousa, poeta; Luís Alberto Bettencourt, cantautor; Luísa Ribeiro, poeta; Manuel Meneses Martins, pintor e desenhador; Manuel Tomás, escritor; Maria das Mercês Pacheco, empresária de Comunicação e Turismo; Maria Helena Frias, editora; Marília Vargas, médica especialista em Cirurgia Geral; Mário Roberto, artista; Milagres Paz, professora e coreógrafa; Pedro Machado, músico; Renata Correia Botelho, psicóloga e poeta; Ricardo Jorge Ferreira de Bessa Ribeiro, professor; Rui Coutinho, professor universitário; Rui Melo, artista plástico; Rute Machado, advogada; Sara Leal, realizadora; Sónia Pereira, cantora; Susan CooperBurkat, artista de Têxteis ; Tiago Prenda Rodrigues, escritor; Timothy Lima, fotógrafo e músico; Urbano Bettencourt, professor e escritor; Vamberto Freitas, professor universitário e escritor; Vítor Marques da Cunha, designer e produtor cultural; Vítor Rui Dores, professor e escritor; José (Zeca) Medeiros – realizador e músico.

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