O interior da Ásia entra em cena

O interior da Ásia entra em cena

Previous Article Previous Article TAP com promoção de 10 mil lugares a 59 euros para Açores e Madeira
Next Article A pior lei de 2021: a orgânica   dos serviços do parlamento regional A pior lei de 2021: a orgânica dos serviços do parlamento regional


Tão longe é para nós o Cazaquistão que nem nos lembramos que existe... E no entanto, nos últimos dia de lá nos chegaram notícias frescas e nem sempre as melhores.
Trata-se de um país enorme, com fronteiras com a Rússia e com a China, tornado independente na altura da derrocada da URSS, que mantinha com mão de ferro tal parcela do império asiático construído, na ponta da espada, pelas tropas dos sucessivos czares russos. Na altura, as novas autoridades cazaques transferiram para a Rússia todo o armamento atómico existente no território, aceitando-a como o Estado herdeiro da extinta URSS enquanto potência nuclear.
A fase seguinte foi de estabilização de um regime autoritário, segundo o modelo russo.
O país é rico em recursos naturais, sobretudo petróleo e gaz, de modo que foi fácil sobre a exportação de tais bens montar uma aparência de prosperidade e até de grandeza, que teve o seu momento mais emblemático na construção, no centro das estepes asiáticas, de uma cidade monumental totalmente nova, riscada pelos mais renomados arquitectos de todo o Mundo, Astana, destinada a ser a capital do novo Cazaquistão. Recentemente, o nome da cidade foi trocado por Nursultan, para homenagear o Fundador e Pai da Pátria, há mais de 30 anos ininterruptamente no poder, de forma mais ou menos disfarçada. São muitas as acusações de enriquecimento injustificado de uma pequena elite próxima do poder
Os acontecimentos da semana passada revestiram acentuada gravidade. As informações disponíveis não são completas nem totalmente fidedignas. Mas pelo que se sabe está em curso uma verdadeira insurreição popular contra o regime, desencadeada pelo aumento dos combustíveis, aliás logo revertidos e com demissão do Governo pelo Presidente da República; os protestos dirigem-se contra o assim chamado Pai da Pátria, finalmente afastado de quaisquer cargos, mas talvez não dos cordelinhos que fazem mexer as coisas no exercício do poder naquele país.
Confessando a sua incapacidade para dominar os acontecimentos, o Presidente da República, escolhido afinal por quem tudo manda, apelou para o envio de tropas de países aliados do Cazaquistão; e a Rússia não se fez rogada e logo expediu forças militares de elite para se apoderarem das infraestruturas fundamentais, a começar pelo aeroporto da capital, que chegou a ser tomado pelos revoltosos. Como já foi observado do lado americano, as tropas russas aonde chegam são depois bem difíceis de fazer sair... Veja-se o que se passa na Geórgia, em estado de semi-ocupação; e na Ucrânia, com a Crimeia anexada e a região do Donbass em pé de guerra. Entretanto a repressão intensifica-se e as ordens governamentais são para atirar a matar, e não negociar.
Ora, precisamente nestes dias, decorrem conversações de alto nível sobre as ameaças pendentes de invasão russa na Ucrânia, que Moscovo pretende transformar num braço de ferro em favor do reconhecimento pelos Estados Unidos da esfera de influência russa, abrangendo não só o país em causa mas todos os outros, incluindo os que já são membros da NATO, como os Bálticos ou a Polónia, anteriormente acorrentados aos interesses estratégicos da Rússia através da sua vinculação ao Tratado de Varsóvia.
Um dos aspectos mais pesados dessa negociações é decorrerem num plano bilateral, Rússia- Estados Unidos, com expressa exclusão da União Europeia. Os respectivos responsáveis estão por isso muito contrariados e fazem por mostrá-lo, mas até agora sem resultados, o que só acentua o seu descrédito.
Acresce que o panorama se alterou com os sinais dados pela Finlândia e pela Suécia de poderem vir a considerar uma entrada na NATO, da qual se têm mantido afastadas em nome do seu estatuto de países neutrais. Parece de propósito para baralhar as conversações em causa!
Da parte americana já foi reafirmado o princípio inquestionável segundo o qual a Aliança Atlântica é formada por países livres e iguais e devem por isso ser respeitadas as decisões de adesão que venham porventura a ser manifestadas pelas autoridades legítimas de quaisquer candidatos, cumpridas as formalidades estabelecidas. À Rússia não pode ser reconhecido uma espécie de direito de veto sobre futuras adesões. Para mais ninguém em seu juízo pretenderia alguma vez agredir militarmente a Rússia, pelo que os seus governantes escusam de fantasiar invasões que ninguém quer nem vai fazer.
Os governos autoritários tendem sempre a inventar inimigos externos para justificarem a repressão praticada sobre os seus cidadãos. É o que agora se está vendo no Cazaquistão: os revoltosos são acusados de serem “bandidos” e foi dado o sinal para a “caça às bruxas” com acusações de alta traição contra  responsáveis do regime, sendo previsível uma purga para depuração, nos moldes conhecidos anteriormente nas experiências soviéticas.
Claro que os problemas em curso na Ásia dificilmente se resolvem ou sequer se abordam numa conferência destinada a tratar de assuntos europeus. Valha-nos que não foi para a frente a inclusão do Cazaquistão no Conselho da Europa, como em tempos foi preconizado por um deputado socialista polaco, que argumentava que o território de tal país situado no Continente Europeu era superior àquele que está nas mesmas condições e nos faz parceiros da Turquia, país este que de resto se estende na sua maior parte pela Ásia Menor...

 
* Por convicção pessoal, o Autor não respeita o assim chamado
Acordo Ortográfico)  

Share

Print

Theme picker