Irregularidades na Acção Social, relatórios que omitem informação  e Secretaria da Solidariedade não auditava as contas
Diário dos Açores

Irregularidades na Acção Social, relatórios que omitem informação e Secretaria da Solidariedade não auditava as contas

Previous Article Previous Article Edição de 11 de Janeiro de 2022
Next Article Centros de vacinação em Ponta Delgada  e Ribeira Grande em regime de casa aberta Centros de vacinação em Ponta Delgada e Ribeira Grande em regime de casa aberta

Auditoria do Tribunal de Contas à ARRISCA

O Tribunal de Contas acaba de divulgar o relatório final da auditoria que promoveu à associação ARRISCA, no período 2013/2017, a pedido do parlamento regional. As conclusões referem várias irregularidades, omissão de informação importante e uma enorme dependência dos subsídios do governo, que não auditava as contas da associação. Publicamos a seguir alguns extractos da auditoria.

 

A pedido da Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores, o Tribunal de Contas examinou os apoios financeiros atribuídos pelo Governo Regional à ARRISCA – Associação de Reabilitação e Integração Sociocultural dos Açores, no período 2013/2017, com especial destaque para os mecanismos de controlo das verbas transferidas, procedendo ainda à avaliação do impacto daqueles instrumentos na estrutura de rendimentos da Associação.
Entre 2013 e 2017, os departamentos e serviços dependentes do Governo Regional dos Açores atribuíram apoios financeiros à ARRISCA no montante global de aproximadamente 6,3 milhões de euros, distribuídos pelas áreas da ação social (59,8%), saúde (39,4%) e emprego (0,8%), tendo sido transferidos cerca de 6,2 milhões de euros.
As transferências operadas tiveram um peso muito significativo na estrutura de rendimentos da ARRISCA, representando 87,5% do total de rendimentos em 2013, 93,5% em 2015 e, aproximadamente, 95% em 2014, 2016 e 2017.

Irregularidades na Acção Social

Na área da ação social, o Tribunal concluiu que o modelo de financiamento subjacente à celebração dos contratos de cooperação no domínio do funcionamento e da prestação de serviços aos beneficiários não respeita o disposto no Código da Ação Social dos Açores, por se basear nos acordos de cooperação para funcionamento anteriormente celebrados, em vez de ter como critério os serviços efetivamente prestados, a frequência média, bem como as necessidades públicas da resposta social em causa, conforme legalmente exigido.
Por seu turno, os contratos de cooperação para necessidades de caráter excecional, imprevisível e urgente acabaram por abranger despesas que estariam a cargo da ARRISCA, na qualidade de entidade promotora, decorrentes de projetos apresentados no âmbito do Programa de Ocupação Social de Adultos e do Programa de Colocação Temporária de Trabalhadores Subsidiados, para além de não corresponderem a necessidades de caráter excecional, imprevisível e urgente, contrariando o regime legal aplicável.
Em 2016 e 2017, foram celebrados protocolos de colaboração tendo por objeto apoios económicos aos utentes da Rede de Suporte Sócio-Cultural à Mobilidade Humana, sem que tivessem sido previamente fixados critérios objetivos para a sua atribuição.

Relatórios omitem informação
importante

Na área da saúde, o Tribunal não encontrou evidências de que as decisões de atribuição dos apoios, destinados, maioritariamente, à realização de consultas/substituição opiácea com metadona, tivessem sido sustentadas em critérios de eficiência, sendo esta uma exigência legal.
A partir de 2013, o modelo de financiamento adotado passou a assentar no produto entre o número de utentes e o valor acordado por atividade/valência, contrariando o disposto no Decreto Legislativo Regional n.º 9/2011/A, de 23 de março.
De um modo geral, a ARRISCA cumpriu atempadamente a obrigação de envio mensal, à Direção Regional da Saúde, da prova documental relativa à execução dos acordos firmados.
 No entanto, a tarefa de controlo da aplicação dos apoios, baseada em informação não sistematizada nem automatizada, sobre as assinaturas dos utentes nas folhas de presença das atividades desenvolvidas, é ineficiente, envolvendo a utilização excessiva de recursos.
Os relatórios de atividades periodicamente elaborados pela ARRISCA no âmbito dos deveres especiais de informação estabelecidos nos acordos de cooperação não contemplam toda a informação exigida, omitindo informação relevante sobre a respetiva execução financeira.

Recomendações
 do Tribunal de Contas

À Vice-Presidência do Governo Regional:
- Rever os mecanismos de acompanhamento e controlo da execução dos contratos de cooperação no domínio do funcionamento e da prestação de serviços aos beneficiários cooperação e para apoio a necessidades de caráter excecional, imprevisível e urgente.
 
À Secretaria Regional da Saúde e Desporto:
- Demonstrar que a decisão de celebração dos acordos de cooperação assenta em
critérios de eficiência, de acordo com o respetivo regime legal.
- Observar o modelo de financiamento legalmente previsto.
- Promover a publicitação atempada dos acordos de cooperação.
- Rever os mecanismos de controlo da aplicação dos apoios financeiros, no sentido de os tornar mais eficientes.

Ao Instituto de Segurança Social dos Açores, IPRA:
- Assegurar que na celebração de protocolos de cooperação são respeitados os princípios da igualdade, proporcionalidade, justiça e imparcialidade.

À ARRISCA – Associação de Reabilitação e Integração Sociocultural dos Açores:
- Apresentar tempestivamente os pedidos de apoio financeiro formulados na área da saúde.
- No âmbito da aquisição de serviços, adotar, preferencialmente, procedimentos concorrenciais.

Informação incompleta

Durante a auditoria do Tribunal de Contas os auditores constataram que “parte relevante da informação solicitada foi prestada de forma incompleta. Neste sentido, verificaram-se restrições à realização dos trabalhos de auditoria, decorrentes da impossibilidade de obtenção de evidências.
Sem embargo, é de salientar a excelente colaboração prestada por todos os dirigentes e trabalhadores que contataram com a equipa de auditoria no decurso da realização dos trabalhos da ação”.

Contraditório com documento
apócrifo

Em conformidade com o disposto nos artigos 13.º e 87.º, n.º 3, da LOPTC, o relato foi remetido às entidades auditadas para efeitos de contraditório.
A Secretaria Regional da Saúde e Desporto e a Direção Regional de Qualificação Profissional e Emprego não responderam.
O ISSA, IPRA, remeteu um documento apócrifo, cujo teor não foi considerado. No entanto, o seu conteúdo encontra-se reproduzido na resposta dada pela Vice-Presidência do Governo Regional, a qual foi tida em consideração.
As alegações apresentadas em contraditório foram tidas em conta na elaboração deste Relatório e encontram-se transcritas em anexo , nos termos do disposto no artigo 13.º, n.º 4, da LOPTC, revela ainda o Tribunal de Contas.
Entre 01-01-2013 e 31-12-2017, a ARRISCA beneficiou de apoios financeiros atribuídos por diversos departamentos e serviços dependentes do Governo Regional, titulados por um conjunto muito diversificado de instrumentos, na sua maioria de natureza contratual, enquadrados em três áreas de intervenção.
Os apoios financeiros públicos contratualizados ascenderam a 6 264,9 milhares de euros, destacando-se os atribuídos no domínio da ação social, com cerca de 60% do total.
Em execução dos instrumentos contratuais celebrados, foram realizadas transferências para a ARRISCA no montante global de 6 187 481,28 euros , correspondendo a um grau de execução de 98,76%.
Com base nos elementos documentais recolhidos, conclui-se que, no período abrangido pela auditoria, foram afetados anualmente à ARRISCA recursos públicos no montante de cerca de 1,237 milhares de euros, distribuídos essencialmente por duas áreas de intervenção: ação social e saúde.

Secretaria da Solidariedade não
 auditava as contas da Arrisca

De acordo com informação prestada pela então Secretaria Regional da Solidariedade Social, os acordos de cooperação de funcionamento destinaram-se a comparticipar despesas com pessoal e funcionamento, no âmbito das ações desenvolvidas pela ARRISCA – correspondendo as despesas de pessoal a 505,4 mil euros (71% do total) e as despesas de funcionamento a 206,2 mil euros.
A partir de 2014, com a transição dos acordos de cooperação de funcionamento para os contratos de cooperação - valor cliente, deixou de ser possível fazer esta desagregação, uma vez que o financiamento passou a assentar nos serviços prestados e não nas despesas realizadas.
Em conformidade com o respetivo regime legal, os contratos de cooperação celebrados previam a realização de ações de fiscalização e de auditorias aos serviços e equipamentos de apoio social da ARRISCA, pela então Secretaria Regional da Solidariedade Social.
Solicitou-se à referida entidade a remessa dos relatórios de auditorias técnicas e financeiras ou de acompanhamento operacional, realizados no âmbito da execução dos acordos de cooperação de funcionamento/contratos de cooperação - valor cliente , tendo a mesma informado que «Não foram realizadas auditorias técnicas e financeiras à ARRISCA» e esclarecido que «O acompanhamento operacional é efetuado com base no sistema de informação e apoio à decisão social (SIADS)» .
O registo no SIADS é uma das obrigações da ARRISCA prevista nos contratos celebrados, obrigando-se esta «a proceder ao registo dos clientes efetivos no SIADS na última semana de cada mês».
Consultado o SIADS, com o propósito de aferir o número de utentes efetivos em cada valência, concluiu-se que o sistema não permite obter com precisão este dado.
Ao tentar visualizar o histórico dos utentes, e tendo em conta que o mesmo contrato teve, em alguns anos, finalidades distintas, o SIADS reporta sempre a informação do número de utentes à finalidade que o contrato visa financiar no momento da consulta.

Gastos com pessoal

Os gastos oscilaram entre os 1,5 e 1,3 milhões de euros, sendo, ao longo de todo o período analisado, superiores aos rendimentos, originando resultados operacionais negativos.
Destacam-se os gastos de pessoal, que representam, em 2013, cerca de 66% do total, e, em 2017, cerca de 77% do total.
Seguem-se os fornecimentos e serviços externos, que incluem o pagamento a trabalhadores independentes, cujo peso oscilou entre 19%, em 2016, e 22%, em 2015.
De acordo com as informações prestadas pela ARRISCA, os apoios financeiros recebidos foram maioritariamente aplicados em despesas com pessoal, atingindo 5,1 milhões de euros (82,6%).
Os gastos de funcionamento foram financiados em 267,4 mil euros (4,3%) e os de investimento em 10,2 mil euros (0,2%).

Decisões dos Juízes do Tribunal
de Contas

Aprova-se o presente Relatório, bem como as suas conclusões e recomendações, nos termos da primeira parte da alínea b) do n.º 1 do artigo 107.º da LOPTC.
Para efeitos de acompanhamento das recomendações formuladas:
a) O Vice-Presidente do Governo Regional e o Secretário Regional da Saúde e Desporto deverão informar o Tribunal de Contas, até ao dia 30-06-2022, sobre as medidas tomadas em acatamento da 1.ª e 5.ª recomendações formuladas;
b) Para efeitos de acompanhamento da 2.ª e 3.ª recomendações formuladas, o Secretário Regional da Saúde e Desporto deverá remeter ao Tribunal, até ao dia 31-12-2022, os acordos de cooperação celebrados com a ARRISCA naquele ano, acompanhados da respetiva documentação de suporte;
c) Para efeitos de acompanhamento da 6.ª recomendação formulada, a presidente do Conselho Diretivo do Instituto de Segurança Social dos Açores, IPRA, deverá, até 31-12-2022, remeter os protocolos de colaboração eventualmente celebrados com a ARRISCA naquele ano, acompanhados da respetiva documentação de suporte;
d) Para efeitos de acompanhamento da 7.ª e 8.ª recomendações formuladas, o presidente da Direção da ARRISCA deverá:
— até 31-12-2023, informar o Tribunal sobre a data da apresentação dos pedidos de apoio apresentados na área da saúde, com efeitos materiais em 2023;
— até 31-12-2022, remeter a relação dos contratos de aquisição de serviços celebrados naquele ano, de montante superior ao limiar fixado para ao ajuste direto simplificado, com menção do respetivo objeto e preço.

Share

Print
Ordem da notícia435

Theme picker