Crise agrava-se no sector do leite dos Açores
Diário dos Açores

Crise agrava-se no sector do leite dos Açores

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A pandemia da Covid-19 e a guerra na Ucrânia estão a gerar uma “crise” no setor do leite nos Açores, disse Carina Câmara, do Centro Açoriano do Leite e dos Laticínios.
“Todos sabemos que o setor está em crise. O preço que é pago aos produtores de leite é, efetivamente, muito baixo, acrescido do aumento dos fatores de produção, que tem vindo a deteriorar toda a componente do preço que o produtor recebe”, notou a representante da associação, durante uma audição parlamentar na Comissão de Economia da Assembleia Regional.
Para esta dirigente associativa, as perspetivas do setor do leite na Região (responsável por cerca de 30% da produção nacional), não são também muito animadoras.
“Prevê-se que esse agravamento de preços vai continuar. Os cereais que compõem as rações estão mais caros e as matérias primas que são utilizadas no fabrico de fertilizantes, estão a aumentar”, advertiu Carina Câmara, recordando que este cenário já vinha a verificar-se desde o início da pandemia da covid-19, “mas agora, com a guerra, vai piorar ainda mais”.

Mecanismo compensatório
ao POSEI

A audição da representante do Centro de Leite e Laticínios na Comissão de Economia da Assembleia Regional surge na sequência de uma proposta apresentada pelo deputado independente Carlos Furtado (ex-Chega), que pretende criar um mecanismo compensatório, através do programa POSEI, para minimizar a perda de rendimento dos agricultores açorianos.
“Quando fiz esta proposta tinha a noção mínima dos valores que estavam em causa e situam-se entre os 50 e os 65 milhões de euros”, explicou o proponente, admitindo que será “impraticável” um aumento de ajudas comunitárias nestes montantes, para os produtores das ilhas.
De acordo com os dados divulgados aos deputados pela representante do Centro Açoriano do Leite e dos Laticínios, os produtores de leite nos Açores recebem, atualmente, menos 10 cêntimos por litro de leite do que o valor médio pago aos produtores da Europa.
Os deputados à Assembleia Regional decidiram também as diligências a tomar, em relação a uma proposta conjunta, apresentada pelo PSD e pelo PPM, que pretende criar um plano de intervenção e de apoio na Cooperativa Ocidental, na ilha das Flores, que está a atravessar uma crise financeira.

Expulsão de cooperantes
na Terceira

O presidente da Associação Agrícola da Ilha Terceira (AAIT) apelou à intervenção do governo e do parlamento dos Açores junto da cooperativa da ilha para tentar evitar a expulsão de 20 cooperantes por alegada concorrência.
“Penso que o papel do Governo Regional e dos deputados da Assembleia regional tem de ser interativo e têm de ter uma posição de defesa deste grupo de produtores, defesa da economia e da produção de leite da ilha Terceira”, afirmou o presidente da AAIT, José António Azevedo, numa audição na Comissão de Economia da Assembleia Legislativa dos Açores, solicitada pelo PS e aprovada por unanimidade.
Em causa está um processo de expulsão de 20 cooperantes da cooperativa agrícola Unicol, que acusa os produtores de fazerem concorrência à entidade, um deles por comercializar produtos de higiene de equipamentos de ordenha e os restantes por fazerem parte do capital social de uma nova fábrica de laticínios, que ainda não iniciou atividade.
Segundo José António Azevedo, a cooperativa, que detém 49% da Pronicol, fábrica que transforma 99% do leite produzido na Terceira, está a agir de “má-fé” e a tentar “por em causa uma nova indústria de transformação” na ilha.

Deram o corpo às balas

“Este processo de expulsão destes produtores, que foram pioneiros e deram corpo às balas neste novo projeto, entendendo que era necessário ter mais uma alternativa na ilha Terceira, é a forma mais baixa de tentar aniquilar o projeto à nascença”, acusou.
Se forem expulsos, estes produtores podem continuar a entregar leite na Unicol, mas com preços e quantidades definidos pela cooperativa, explicou o presidente da AAIT.
“Os produtores ficam a negociar diretamente com uma única entidade, que já os expulsou de forma pouco ortodoxa e que tem claramente intenção de não ter concorrência”, apontou.
O presidente da associação agrícola alega que as acusações de concorrência “não têm fundamento”, até porque os 19 cooperantes têm, em conjunto, 10% das ações da nova fábrica e, por isso, “não têm poder de decisão, nem impacto direto nas negociações”.
“Nenhum deles teve qualquer atividade de concorrência à Unicol, nenhum deles deixou de entregar a sua produção à Unicol”, adiantou.
José António Azevedo disse mesmo há cooperantes da Unicol que entregam leite em outras queijarias e que são sócios de outra cooperativa, mas “nenhum deles recebeu qualquer ameaça de exclusão”.
O dirigente associativo criticou ainda a falta transparência do processo, alegando que a decisão será tomada apenas por 45 delegados, num universo de 700 produtores.

Decisão no dia 30
em assembleia geral

“Este processo vai ser votado na assembleia geral do dia 30 de março e essa votação é tudo menos uma votação clara e independente. Os 45 delegados da ilha Terceira vão votar em nome dos 700 produtores, sem ouvir estes mesmos produtores e estando condicionados pela posição da direção da Unicol, que já está a fazer reuniões com cada delegação individualmente”, avançou.
A nova fábrica foi considerada Projeto de Interesse Regional (PIR) pelo anterior executivo (PS) e pelo atual (PSD/CDS-PP/PPM) e a primeira pedra foi lançada em outubro de 2020, mas só deverá iniciar atividade daqui a dois anos.
José António Azevedo teme que os 19 produtores não resistam durante esse período, nas condições de produção impostas pela cooperativa, e que a fábrica não chegue a avançar.
“Quando a nova indústria tiver pronta para transformar já nem tem parte dos sócios fundadores no ativo para entregar leite”, alertou.
Segundo o dirigente sindical, a nova fábrica prevê transformar 60 mil litros de leite por dia, em queijo e manteiga, que quer exportar para fora do mercado europeu.
Por isso, defendeu que a Unicol teria a ganhar com a venda de leite a uma segunda unidade de maior dimensão.
“O conselho de administração da Unicol está a fazer a defesa não dos cooperantes, mas da transformação, em que só têm participação de 49%. A Unicol foi criada para defender os interesses dos cooperantes”, sublinhou.
O presidente da AAIT considerou que o executivo açoriano “não pode ficar indiferente” a esta situação, porque o monopólio coloca em causa a “viabilidade das explorações” agrícolas da ilha Terceira e influencia os preços do leite no resto do arquipélago.
“Os produtores de leite, se não tiverem uma nova indústria de laticínios na ilha Terceira, a breve trecho, provavelmente o que vai acontecer é o abandono do leite para a carne, que não traz o mesmo rendimento, não traz o mesmo emprego”, reforçou.
Também ouvido na comissão, o presidente da Associação de Jovens Agricultores Terceirenses (AJAT), Anselmo Pires, disse que o processo era “muito complicado” e que se fosse delegado teria de pedir “aconselhamento jurídico” para tomar uma decisão.
“Compreendo a parte dos produtores com a possível exclusão e também compreendo a parte da indústria que vê neles uma suposta ameaça”, afirmou.

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