Diário dos Açores

O Joel, a Heidi, o Dr. Salgado e o Robespierre

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Joel Neto é um conhecido simpatizante do PSD, um escritor enfadonho e um analista político tão convincente como o antigo ministro da propaganda de Saddam Hussein. A propósito da cessação da comissão de serviço do médico António Salgado do cargo de Presidente do Conselho de Administração da Unidade de Saúde da Ilha do Corvo, o colunista Joel Neto decidiu disfarçar-se de Heidi - a doce e angelical protagonista da série infantil dos anos 70 - e contar-nos esta historieta deliciosa:
“Não existe um governo, mas sim dois governos: um governo do PSD, empenhado em trabalhar com os melhores, e que nos primeiros meses até promoveu uma série de socialistas a chefes de serviços e de secção; e um governo da microcoligação CDS-PPM, determinado a fazer terra-queimada de tudo o que ficou para trás (inclusive do que foi bem feito), a perseguir as pessoas de que não gosta e a colocar homens de confiança em todos os lugares da administração pública que puder”.
Ou seja, para Joel Neto o PSD é uma espécie de jovem e encantador príncipe nórdico e o PPM e o CDS/PP são as bruxas más e narigudas de serviço, que representam uma espécie de reincarnação do maléfico poder socialista. Trata-se de uma fábula delirante. Constato, no entanto, que ainda existe uma ténue esperança de redenção para o escritor que, até este inenarrável escrito, ainda não tinha conseguido despir a antiga farda do emotivo, irrequieto e entusiasmante comentador de golfe da SportTV.
Joel Neto é um escritor atento aos pormenores. A sua desinspirada e melancólica narrativa vive da pormenorizada descrição dos passarinhos, dos gafanhotos, dos grilinhose das pedrinhas do riacho. Mas ao comentador Joel Neto, que se auto identifica, de forma absolutamente presunçosa, como “o restinho de massa crítica” do povo dos Açores, não lhe interessa qualquer tipo de esclarecimentos no âmbito deste assunto. Já decidiu com base nas coincidências e nas suposições insultantes.
Para Joel Neto, o Dr. Salgado, reiterado e empedernido organizador de manifestações e petições para defesa do seu salário de 12 mil euros (já lá vão duas, a primeira ainda no tempo do Governo Regional socialista) está a ser, coitadinho, alvo de uma maléfica perseguição por parte desse anjo das trevas chamado, passe a publicidade, Paulo Estêvão. E é aqui que Joel Neto volta a vestir-se de Heidi e escreve que toda a novela Salgado “fica muito mal ao Governo (que não tem culpa nenhuma)”. A culpa é, na desinteressada e credível narrativa de Joel Neto, minha. É a isto que Joel Neto chama uma prova de vida da tal massa crítica de que ele é o lídimo e narcisista representante.
Sempre achei fascinantes os policiais que escondem, até à última página, omóbil do crime e a identidade do assassino. Mas o cronista Joel Neto, ao contrário do escritor com a mesma designação, não é homem para grandes delongas. Desde a primeira linha que, desconfiando da real capacidade de compreensão dos99,9% de açorianos que não integram a tal massa crítica, quer deixar claro que ele está contra a coligação governamental, que o PSD se deve livrar rapidamente dos parceiros da “microcoligação” e que o nobre propósito do seu artigo é conter os danos políticos que este assunto do médico possa, porventura, provocar ao PSD.
Uma coisa tão tosca e rebuscada precisa de um grande final. É nessa zona do artigo que Joel Netos e transforma no glorioso Robespierre. Escreve, com inegável fervor republicano, uma frase que, pela sua eloquência e oportunidade, se arrisca a perdurar na memória da atual geração: “Portugal é uma república e os Açores são parte de uma República”.É preciso recuar a Américo Tomás para encontrar uma frase tão heroica: “é a primeira vez que cá estou depois da última vez que cá estive”.
Ainda bem que o Joel Neto fez este aviso à navegação. Sei que existe gente que ainda não se tinha apercebido desta evidência cósmica e que confundia tudo devido à bandeira azul e branca que ondula nos nossos edifícios autonómicos. Uma bandeira que o PS/Açores se recusou a votar pelo facto de a ter considerado monárquica. Não é, felizmente, o meu caso. Sei que vivo numa República e que Joel Neto (Robespierre) lidera a sua massa crítica e é o seu último profeta.
A verdade é que, depois de tudo isto, não sei como ainda conservo a cabeça no pescoço. O meu desafio é evitar os erros e o triste destino de Luís XVI.A primeira coisa que fiz foi resistir aos encantos de uma qualquer jovem Maria Antonieta. A segunda é o que acabo de fazer: enviar, antes que a guilhotina comece a funcionar, este Robespierre para “os quintos do inferno”.

Paulo Estêvão *

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