Diário dos Açores

Vergonhas... sísmicas!

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1 –Bem diz o povo que “a verdade vem sempre à tona”.

Foi o que sucedeu com a crise sísmica de S. Jorge, iniciada a 19 de março de 2022. O CIVISA não a esperava, teve medos inconfessáveis e sem evidências de erupção vulcânica, etiquetou-a de crise sismovulcânica! Durante algumas semanas a equipa CIVISA andou a “patinar” em assuntos movediços; um dia era sismovulcânica e logo a seguir, por uns instantes, era sismotectónica… Pelo caminho a missão CIVISA foi medindo silenciosos gases vulcânicos… que nunca apareceram.
Para dificultar a interpretação do fenómeno, a equipa universitária conseguiu a visita de Suas Exas. o Presidente da República e o Presidente do Governo dos Açores. Estes ilustres senhores não resistiram à tentação de, também, emitirem “pareceres”, ou seja, que os cientistas da UAçores estavam muito certinhos quanto a inserirem as centenas de sismos e microssismos no nível V4 numa escala caseira de alertas vulcânicos, quase desconhecida.
Durante semanas, governantes e habitantes da ilha de S. Jorge estiveram mergulhados num pesadelo de haver ou não haver vulcãozito terrestre ou submarino. Durante semanas, levei, indiretamente, inacreditáveis e ofensivas contra-opiniões, uma vez que considerei a crise, desde o início, como sismotectónica.

2 –No passado dia 12 de junho de 2022 ocorreu um facto quase que milagroso, ou seja, o CIVISA anunciou, como lista de mercearia, que foram registados, aproximadamente, 37.810 eventos de baixa magnitude e de origem tectónica. Não sei o que significa “aproximadamente” pois os registos e as contagens não devem ser aproximados. Mas o comunicado deste dia 12 de junho tem a virtude de dar o dito por não dito, assentando que o enxame de sismos era de origem tectónica. CIVISA dixit … e assim todo o povo dormiu mais descansado.
Eu esbocei sorrisos de comiseração e – finalmente o bom senso oficial era formalmente impresso.

3 – Comecei a estudar sismologia dos Açores com nomes sonantes tais como o Eng.º Frederico Machado (amigo de família), o Tenente Coronel José Agostinho (na Terceira), o Dr. António Alcântara de Mendonça Dias (no Observatório do Relvão em Ponta Delgada), o Professor Aroun Tazieff (Paris), o Doutor Alfred Hirn (também em Paris), o US Geological Survey de São Francisco e do Hawai, etc., etc.
Uma das muitas coisas que me ensinaram foi como comunicar com colegas, com o povo… e com os jornalistas. E aprendi a fazer comunicados e a realizar sessões de esclarecimento para as TVs e rádios, naquele caso, existindo desenhos e esquemas sintéticos e elucidativos. Tais veículos são muito (muito) importantes em sociedades de elevada iliteracia científica e de fenomenologias complicadas. Esses figurinos ainda se mantêm e requerem sensibilidades que dependem do dia e da hora do evento, das horas dos comunicados e até das envolvências políticas.
Apesar dos afastamentos de que fui alvo e da fraqueza (falta de firmeza) dos responsáveis políticos por essas ilhas abaixo ainda tenho fiéis contactos. Foi o que novamente ocorreu com a passada crise sismotectónica de São Jorge, em que os cientistas oficiais inseguros e medrosos enveredaram por atabalhoadas “explicações”, como se os leitores ou ouvintes fossem totalmente analfabetos…

4 –Quanto custaram aqueles dias de confusões e de inóspitos comunicados? Apesar de algumas destas cientistas serem naturais daquela ilha. Foi uma triste ideia para lá mandarem gentes nervosas, sem experiência efetiva de situações vulcânicas. Pior ainda foram as atuações de políticos de topo da República e da Região.
Como vulcanólogo, adoro cooperar em vulcões ativos. Mas, em outras terras que não sejam a minha…

 

* Vulcanólogo/ Prof. Catedrático

Victor-Hugo Forjaz*

 

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