A excelência do Turismo Rural
Diário dos Açores

A excelência do Turismo Rural

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O Turismo Rural emergiu no mundo a partir do momento em que as famílias começaram a procurar alternativas de natureza, com destaque para as históricas tradições aristocráticas das residências de veraneio no campo.
Nos dias de hoje, em vários países, a modalidade está muito ligada à nova moda do “turismo sustentável” e se houvesse estrelas para classificar este tipo de turismo, à semelhança dos hotéis tradicionais, haveria uma imensidão de exemplos com o máximo de estrelas.
Nos Açores fomos ao encontro de um destes exemplos, um fenómeno de conservação rural, à mistura com a inovação quanto baste, sem ferir a tal sustentabilidade natural que rodeia esta espécie de aldeia de Noé.
É tal o seu pioneirismo no sector, que acaba de receber o 16º galardão “Green Key” consecutivo - coisa rara no sector -, tantos quantos os da existência deste prémio em Portugal.
O empreendimento é o único totalista na conquista deste troféu nos Açores e um de apenas três em todo o território nacional (dois no continente).
Chama-se Quinta do Martelo, um nome que advém de uma aldraba do século XVIII que ainda ornamenta o portão principal da quinta.
Quem sai de Angra, a mui leal cidade classificada como Património Mundial pela Unesco, na ilha Terceira, encontra facilmente esta enorme quinta, apenas a cinco quilómetros do centro.
Logo á entrada do empreendimento começamos a desvendar o bom gosto de quem a desenhou, com o empedrado bem tratado, as flores em cada canto bem vincadas e o verde sempre saliente a rondar o frontispício de cada uma das casinhas, pintadas com o colorido de outros tempos dos solares da aristocracia terceirense.
Somos recebidos com um largo sorriso e de braços abertos por um homem esguio, manifestamente simpático e a deixar resvalar, de quando em vez, o sotaque terceirense.
Vimos a saber que é o obreiro daquele monumento à natureza, de seu nome Gilberto Vieira, “um criado ao seu dispor, onde pode pedir tudo, menos dinheiro que não tenho....”.
Um homem super-divertido, sempre com provérbios ou histórias de sorrir na ponta da língua, e de uma atenção para toda a família, incluindo as crianças.

A Venda do Ti Manel da Quinta

Faz questão de nos mostrar todo o complexo, a horta bem cuidada, os animais que rondam os hóspedes que circulam com as crianças nórdica citadinas espantadas com a doçura das galinhas e do burro, e a disponibilidade para se apanhar fruta directamente das árvores.
A Quinta do Martelo conheceu o seu auge durante o ciclo da laranja, um dos ciclos económicos importantes na economia dos Açores, depois do pastel, dos cereais, até ao hoje denominado ciclo da vaca, que também está representado aqui e acolá, entre o chilrear constante da passarada da quinta, que também se dedicou à produção de vinho e aguardente de nêspera, fruto que ainda pode ser encontrado ali mesmo, a par de muitas laranjeiras e outras árvores de fruto, em simultâneo com culturas hortícolas que são usadas, igualmente, no dia a dia, no famoso e surpreendente restaurante tradicional «A Venda do Ti Manel da Quinta».
Gilberto Vieira explica-nos que, através de um extenso trabalho de investigação, “fomos capazes de reconstruir e manter certos aspectos regionais, como as antigas oficinas, os tradicionais trabalhos de tingimento e as casas que datam do início da colonização dos Açores. Também conseguimos recuperar e adaptar certas áreas agrícolas à agricultura biológica e preservar espécies autóctones de animais domésticos. Aqui, recriamos um ambiente rural genuíno da Terceira, começando pelos edifícios e ornamentos, até à gastronomia e terminando com as roupas, tradição e festividades. Oferecemos aos nossos visitantes a verdadeira sensação de como era a vida há cinco séculos em uma fazenda rural tradicional”.
E que regresso ao passado!
Um autêntico Museu da ruralidade açoriana.
Agora percebe-se porque é premiado todos os anos.

A história dos Açores na Quinta

A história dos Açores, ligada à gastronomia, está fielmente representada no restaurante da Quinta do Martelo.
Desde logo, no enquadramento fiel das instalações e na sua evolução progressiva, a partir da mercearia com petiscos até ao espaço reservado para refeições completas.
A base de alimentação tradicional do povo rural passava pelo pão e pela agricultura de subsistência.
No entanto, em dias de festa, em que havia um esforço para apresentar pratos melhorados a familiares e convidados, eram usados produtos próprios para essas ocasiões, com base na criação do porco, da vaca ou da galinha, como pitéus absolutamente sazonais para agradar às visitas.
E não falta, em ocasiões especiais, a animação de um grupo folclórico ou de algum repentista terceirense, que nos leva todos ao delírio.
Este regresso ao sossego de outros séculos só é quebrado com um bom mergulho na bonita piscina enquadrada no meio do verde, ao lado do nosso quarto com um ferrolho de outro século e decorado com rendas tipicamente rurais que nos levam noutra viagem histórica.
A Quinta do Martelo não perde a sua noção do tempo e tem feito um esforço contínuo de melhorias, nomeadamente no que respeita às energias renováveis e à conservação das características de autenticidade e qualidade, havendo sempre mais a fazer, mas são investimentos consideráveis que requerem apoios para a sua concretização plena.

Pioneira nos Açores

É pioneira, nos Açores, num percurso de defesa e valorização do turismo em espaço rural e de natureza, tendo, ao longo de três décadas, sido reconhecida, por várias instâncias nacionais e internacionais, como um caso de êxito na articulação entre a exploração comercial turística e a preservação rigorosa da tradição, do ambiente e da verdade cultural e etnográfica do meio em que nasceu e desenvolve a sua atividade.
O espaço tem apostado também na produção de bens alimentares próprios, por meios de cultura biológica, utilizados na confecção dos pratos que são servidos no restaurante da quinta, naquilo que hoje se denomina no conceito internacional como “farm-to-table”.
Isso inclui culturas desde pomares, leguminosas, tubérculos, plantas aromáticas e medicinais e variadas espécies de hortícolas.
Foi esse trabalho, meticuloso e sem cedências, que valeu à Quinta do Martelo a conquista do primeiro prémio nacional “Horta do Chef”, na única edição deste troféu realizada em Portugal.
Não surpreende esta atenção nacional e internacional.
Qualquer júri não resiste ao deslumbramento de todos os pormenores.
Não deixem que esta Quinta se perca.
Esperamos que as entidades açorianas olhem para ela como um expoente máximo do turismo rural.
Um grande exemplo do que são os Açores genuínos.    

Exclusivo para Diário dos Açores

por: José Vieira, em Angra do Heroísmo*

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