Diário dos Açores

Inteligência do Espírito e Coragem de Ser: Educação do Caráter

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VIKTOR FRANKL E KARL JASPERS foram grandes Médicos Psiquiatras e Eminentes Filósofos, muito referenciados e citados. Há que os trabalhar na Sociedade de Hoje, que precisa da solidez dos Princípios e dos Valores, no Sentido e Horizonte da Vida. As pessoas precisam aprender a fortalecer o seu interior. Fala-se muito em Educação mas de uma Educação já sem seiva, sem Princípios nem Valores, e, portanto, de uma Educação que é uma perigosa formatação alienante. Nós vivemos numa Sociedade em que as pessoas têm desertos interiores e têm falta de “armas de luz” para aguentar, suportar e superar as inevitáveis adversidades da vida. Também nessas dimensões fortes a educação tem falhado porque não há a coragem de transmitir o melhor e os melhores vão saindo da Educação e, pior do que isso, é que os políticos não se dão conta disso na sua real profundidade. Não estou preocupado com a falta de Professores, estou preocupado com a falta de bons professores e formadores. Precisamos de pessoas com maturidade para Educar e há muito tempo que defendo o reforço da autoridade democrática dos professores. Precisamos de Professores Cultos e Verdadeiramente humanistas, que descubram as qualidades dos educandos. Precisamos de uma Sociedade que saiba dialogar. É preciso ciência e arte para fazer com que cada pessoa descubra em si as potências e possibilidades de ser que tem.
Recentemente propus no FB o livro “A Saga de um Pensador”, de Augusto Cury, que nos mostra as armas escondidas que todos temos e, por vezes, - ou muitas vezes - desconhecemos. Cada Pessoa É Valor e Poder e tem uma Dignidade Intrínseca, no seu Sacrário Interior, que nem o Inimigo arromba. Está testado pela Ciência e Santidade mais altas e profundas. No nosso íntimo ninguém toca, só Deus.
É de Augusto Cury a seguinte afirmação: “Uma Pessoa que fere é uma Pessoa Ferida”. Mas o Perdão e a Compaixão de Cristo vão vai alto. Mas é preciso ler livros que nos tornem mais fortes, na própria vulnerabilidade que é da essência humana de Ser.
Aqui, e em sintonia diferente, mas em registos diferentes, - ou talvez não - proponho o livro “O Homem em Busca e um Sentido”, de Viktor E. Frankl, (2012, editora lua de papel), que mostra como a Força das Ideias, os ideais e o Sentido encarnam a finalidade de uma possibilidade. Trata-se, portanto, de aprofundar o Ser das Possibilidades. E como acontece com todos os grandes, que são humildes, bebem o conhecimento e inspiram-se em várias referências, têm várias fontes. No livro o “Homem em Busca de um Sentido”, que vivamente recomendo, encontramos, pela mão de uma Homem Formado em Neurologia e Médico Psiquiatra, referências a vários escritores e filósofos. Isso é Cultura ao Serviço do Ser Humano. Mas tudo ancorado na sua experiência, dolorosa, dramática, no campo de concentração de Auschwitz, na II Guerra Mundial. É uma lição de humanidade e de resistência a toda a prova, que nos serve para a vida, até porque resultou da provação da vida, da capacidade de aguentar, de resistir, na esperança que jorra da alma e do corpo, da carne que sangra. O “vácuo existencial” é muito perigoso na pessoa. Viktor Frankl não tem uma perspetiva psicanalítica, pelo contrário, a cura faz-se pela razão, pela “logoterapia. Pelo Logos. Mas a Razão está diretamente ligada ao Coração. Ao contrário do que alguma dulcificação poderia fazer crer, a Razão tem Sentimentos, até no próprio Descartes, se bem lido, se bem estudado, e bem referenciado. Frankl cita autores como Lessing, Schopenhauer, Nietzsche, Rilke, etc. Viktor Frankl cita Dostoiévski ”, que afirma “Há só uma coisa que eu temo: não ser digno dos meus sofrimentos”(cf. p76). É preciso Coragem e que Coragem! Quanta vivência, profundidade e superação está nesta afirmação de Dostoiévski, dureza e pureza, como a vida, sem dulcificações, mas sem a apologia, nunca, do sofrimento voluntário. O sofrimento involuntário gera e é potência de sentido. Há que saber acautelar a saúde física, mental, moral e espiritual. Só o Perdão e a Compaixão são o ápice da Saúde da Alma, da Saúde do Espírito, à qual as outras estão subordinadas. Na “transitoriedade da vida”há que superar os vácuos existenciais, desertos interiores, ganhar um Sentido da Vida, buscar a “essência da vida”, “o significado do amor” e o “significado do sofrimento”. No fundo materialista e da maldade há muita ambição que esconde – até um dia – que teve o preço da corrupção, que aliena e autodestrói quem se arma em artificial estrela de falsa passarela vermelha escorregadia na direção do precipício interior e exterior.
Pelo contrário, há que buscar a Verdade, o “sentido potencial “ e fazer a “autotranscendência”. A “noodinâmica” exige uma certa tensão e a sua superação, na construção do Sentido da Vida, para vidas com sentido. O sentido é interno mas projeta-se para uma realização, para um conteúdo vivido da existência. No fundo, a “vontade de sentido” que, na linguagem fenomenológica, - diria que é a consciência doadora de sentido. Construção e doação de sentido.
Tive conhecimento dos nomes de Viktor Frankal e Karl Jaspers nas aulas do Grande Professor Doutor Gustavo de Fraga, de Saudosa Memória. E é muito curioso o seguinte. Pela sua excecionalidade, como Médico e como Filósofo, Viktor Frankl foi convidado para encerrar o XIV Congresso Internacional de Filosofia, que ocorreu em Viena de Áustria em 1968. Soube ao ler a publicação “Depois do XIV Congresso Internacional de Filosofia”, uma compilação, então feita pelo Professor Gustavo de Fraga, tendo como base as suas Crónicas Radiofónicas na, então, Emissora Nacional. Viktor Frankl, já antes de ser forçado ao campo de concentração nazi, na II Guerra Mundial, já era um Médico Psiquiatra Famoso. Antes, durante e depois, teve uma ação notabilíssima e, depois de ter estado preso no campo de concentração atuou na sua área profissional mas recusou convites das mais famosas Universidades e escolheu ficar a Cuidar dos seus pais. Que Nobreza de Caráter. Sempre considerei que os familiares são os Verdadeiros Cuidadores, os “Cuidadores More”. Ora, é lindo ver um Intelectual desta envergadura escolher QUEM ESTÁ PRIMEIRO. É um assunto ao qual voltarei por tantas e profundas razões de vida.
Afirma o Professor Gustavo de Fraga: “É tempo, porém, de nos referirmos à notabilíssima conferência que, ainda em ligação com o Congresso, o Prof. Viktor Frankl proferiu no edifício da Universidade. Estava escrito que um psiquiatra eminente era a pessoas indicada para encerrar com chave de ouro o XIV Congresso Internacional de Filosofia. Frankl, de renome mundial, trabalha com frequência nos Estados Unidos e, em língua castelhana, há traduções de algumas das suas obras” (Gustavo de Fraga (1968), “Depois do XIV Congresso Internacional de Filosofia” (Coimbra, Livraria Almedina, p. 58).
Não esqueçamos que Viktor Frankl teve uma passagem de dor profunda no campo de concentração de Auchwitz mas pôs – teve a força de pôr – a sua experiência e conhecimento humano e profissional ao serviço da saúde dos prisioneiros para lhe evitar o fim no choque letal do arame farpado.
Quanta beleza encontramos nestas palavras e atitude de Viktor Frankl:
“Um dia, pouco depois da libertação, caminhei muitos quilómetros pelos campos, ao longo de prados floridos, até à cidade mais próxima do campo de concentração. Cotovias levantavam voo em direção ao céu e eu ouvia o seu cantar alegre. Não se via ninguém nos quilómetros em redor; não havia nada senão a terra imensa, o céu, o júbilo das cotovias e a liberdade daquele espaço. Parei, olhei em volta e depois olhei para o céu – e então ajoelhei-me. Naquele momento sabia muito pouco sobre mim mesmo e sobre o mundo. Tinha somente uma frase na cabeça, sempre a mesma: “Chamei o Senhor do estreito espaço da minha cela e Ele respondeu-me na imensidão livre do espaço”. Por quanto tempo estive ajoelhado a repetir esta frase já não consigo lembrar-me. Mas sei que nesse dia, naquela hora, a minha nova vida começou. Progredi passo a passo, até me tornar um ser humano de novo.” (Viktor Frankl, (2012) Um Homem em Busca de um Sentido. Alfragide: lua de papel, p.97).
Que MARAVILHA. Depois de tanto sofrimento, de si e dos outros, um maravilhamento para se tornar “um ser humano de novo”.  
Depois da Dor, vem a Alegria e a Graça, para evocar palavras de luz em Leonardo Coimbra. Depois do Sofrimento, a Luz da Dureza e da Pureza. Um Hino nos partos difíceis da vida, entre Amor e Dor, na Luz da Fé e da Esperança.
Nascemos na Dignidade que nos habita, desde o seio materno.

*Doutorado e Agregado em Educação e na Especialidade de Filosofia da Educação

Emanuel Oliveira Medeiros
Professor Universitário*

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