Diário dos Açores

A forte dependência açoriana

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Há poucos dias publicamos neste jornal um trabalho de investigação liderado pelos professores João Duarte e Pedro Brinca, da Universidade Nova SBE, que avalia o impacto dos Fundos Europeus Estruturais e de Investimento (FEEI) nas diferentes regiões em Portugal e conclui, relativamente aos Açores, que somos a região onde os FEEI tiveram maior influência, foi com um impacto de 2% de crescimento do PIB anual entre 2014 e 2020.
A conclusão dá nota de uma dependência muito grande dos Açores dos fundos comunitários, o que não é bom sinal.
Isto quer dizer que, sem fundos comunitários, não nos aguentamos face às restantes regiões e face à Europa, implicando uma economia pouco dependente de si mesma. Mesmo com os apoios, não convergimos.
O Prof. João Duarte, em entrevista ao nosso jornal, vai mesmo mais longe, explicando que sem o apoio dos FEEI, o crescimento do PIB dos Açores teria crescido metade do que o que cresceu, uma diferença de 4% ao ano para 2% ao ano em termos de PIB nominal.
Além de que, sem os FEEI os Açores teriam ficado mais longe das regiões mais desenvolvidas economicamente de Portugal e da UE.
Esta forte dependência devia trazer à agenda política regional uma reflexão sobre o modo como estamos a viver, uma vez que os fundos estruturais não vão existir eternamente.
Com uma dívida bruta regional acima dos 2 mil milhões de euros (ou 3 mil milhões se contarmos com as responsabilidades futuras), um crescimento anémico, todos os anos, da nossa riqueza, uma cada vez maior dependência do exterior para sobrevivermos em géneros alimentícios e uma população a envelhecer, tudo aliado às transferências da comunidade e do Orçamento de Estado, então temos uma tempestade perfeita.
E se a tendência dos próximos anos for para empobrecer, com a ameaça da inflação galopante e a subida das taxas de juro, mais agravado ficará o nosso nível de vida e maior ficará, ainda, a nossa dependência social e económica.      
Os nossos políticos parecem pouco preocupados com isto, atarefados que andam nas suas tricas internas pelo assalto ao poder e aos lugares das sinecuras, não falando da habitual clientela que ronda o orçamento público à espera da melhor oportunidade para abocanhar as “bazucas” e os incentivos comunitários.
Uma das medidas que se devia começar a pensar era descentralizar mais o orçamento e os fundos, conforme alerta dos autores do referido estudo.
O Prof. João Duarte diz mesmo que o que mais o impressionou nos Açores foi o volume dos fundos transferidos face ao nível de valor acrescentado bruto de alguns municípios dos Açores.
E dá o exemplo da Graciosa, que foi o município que mais recebeu fundos face ao seu valor acrescentado bruto em Portugal.
 O impacto dos FEEI foi enorme, contribuindo para um crescimento anualizado do valor adicionado bruto acima dos 20%.  
O que quer dize que os fundos estruturais, em alguns municípios dos Açores, proporcionaram taxas de crescimento ao nível das taxas de crescimento na China nos tempos áureos, como sublinha o entrevistado.
É a confirmação da velha teoria de que um euro gasto numa autarquia, gera muito mais impacto do que um euro gasto pelo governo.
Agora que se volta a falar tanto de regionalização, os políticos deviam preocupar-se, antes, coma descentralização, a começar pelas Regiões Autónomas, onde há muito para descentralizar.
Podíamos começar por dar o exemplo, cá dentro, em vez de continuarmos neste modelo errado de apostar apenas nas capitais dos ex-distritos.
Esta fórmula distorcida do “desenvolvimento harmónico” também explica muito sobre a nossa forte dependência.
E o nosso atraso.

Osvaldo Cabral
osvaldo.cabral@diariodosacores.pt

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