Diário dos Açores

Alergia a festas

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Os politicamente corretos vão mesmo crucificar-me hoje. Tenho uma enorme alergia a festas dapadroeira da freguesia, a meu favor os cães da vizinha, os de casa e dezenas de outros nas vizinhanças, e os pássaros que nessa semana debandam  atordoados pelas incessantes roqueiras e foguetes tonitruantes que a desoras  entre as 07 e as 03 da madrugada soam nos ares.
Tal como a música encanada ou não que surge na maioria das ruas, como os bares e tascas improvisadas que nascem como cogumelos, e leva as pessoas a encostarem-se aos berros, gritos e  em alegadas conversas (bêbadas, muitas vezes) até altas horas, sob a sacada das minhas janelas ou sentadas nos degraus do patamar de casa.
Como a ecologia ainda não medra por estas bandas na manhã seguinte o chão fica atulhado de copos de plástico, beatas de cigarro e outros detritos que, eventualmente, o pessoal da junta  irá limpar, quando acabarem de limpar as ruas dos detritos de folhas e flores que sobraram da procissão.
Este ano a comissão organizadora ressabiada pelos dois anos de pandemia resolveu alargar de 6 para 10 dias as libações celebratórias, convidado grupos musicais para dois dias antes  do habitual, mas a população que ainda trabalha durante a semana não parece ter aderido. Outra novidade foi a trasladação da imagem da Senhora do Rosário para a Capela e desta para a Igreja ter sido feita numa carrinha de vaqueiro e não aos ombros dos acólitos, um progresso tecnológico que demorou a chegar, e do qual ignoro ter sido um sucesso ou não.
Desde há séculos que a tradição de pintar as casas se mantém. Este ano os pintores não tinham mãos a medir e eu que até pinto a casa quando precisa e não quando é festa, vi-me e desejei-me para arranjar “mestres” disponíveis dois meses antes do evento.
Houve menos barulho duma forma geral, sem a discoteca improvisada na Rua do Rosário a debitar tecno bass até às três da manhã, o que os meus ouvidos agradecem e mais ainda o coração que palpita acelerado com esses ritmos.
O bar tasquinha em frente a casa não causou grande transtorno mas os seus frequentadores de ambos os sexos devem ter problemas auditivos pois ao virem cá para fora fumar e falar, faziam-no aos berros noite adentro adiando, injustamente, o meu sono de justo. Mas vá lá, foi um sacrifício por uma causa justa que esta gente nem é muito de futebóis, não vai a Fátima que  é caro, as procissões de romeiros foram suspensas e só lhes resta a festa anual para se libertarem das grilhetas do quotidiano.
Para isso se aperaltam novas e velhas em seus vestidos, saias curtas e decotes generosos, maquilhadas como se na ida às missas fossem a um concurso de misses. A grande diferença doutras eras é que não se apalavram namoros ou casamentos como dantes, e a estatística diz que em cada dez casamentos sete dão lugar a divórcio e em curto prazo.
Mudam-se os tempos mas os emigrantes continuam a voltar para reviver eras passadas que já não reconhecem nestes dias que correm. Um casal deles, emigrado nas Américas há 60 anos até me pediu para lhes tirar uma foto quando eu gravava os tapetes de flores da procissão e foram contando a sua vida e o orgulho de serem nativos daqui.
Ninguém se deu conta da crise que aí está para durar e encarecer  mais a vida exceto o dono das vacas que pediu (como só ele sabe) preço mais alto para o leite. Concordo plenamente, desde que todos sejam compensados pela carestia desta inflação que nos vai fazer emagrecer as poupanças que não temos, os aumentos que não tivemos e a subida especulativa de todos os bens. Mas quando a crise apertar pode ser que as coisas mudem já que as mentalidades essas parecem imutáveis .


* Jornalista, Membro Honorário Vitalício nº 297713
[Australian Journalists' Association - MEEA]

Chrys Chrystello*

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