Diário dos Açores

Sobre o “Estudo pré-encomendado de transportes marítimos?”

Previous Article Previous Article Oposição critica “inacção” do Governo e este responde com a baixa de impostos

Na edição do Jornal do Pico do passado dia 26 de Agosto Rui Pedro Ávila (RPA) na sua coluna PONDERANDO escreve um artigo com o título “ESTUDO PRÉ-ENCOMENDADO DE TRANSPORTES MARÍTIMOS (?)” em resposta ao artigo que escrevi e que foi publicado no Diário dos Açores de 17 de Agosto, no Diário Insular de 31 de Agosto e no JP de 2 de Setembro, à cerca do seu texto de 5 de Agosto.
Em primeiro lugar, e por uma questão de princípio, quero que fique claro que no meu artigo não rotulei JPA de reaccionário. O que escrevi, e transcrevo, foi: “Pensava que uma pessoa culta e evoluída como RPA nunca cairia na tentação de escrever um texto tão alarmista e reaccionário!” Na minha opinião a ideia subjacente ao texto é que é reaccionária e não a pessoa. O que me parece perfeitamente possível - é o que eu penso. E acho que a ideia o é, porque corresponde a uma vontade cega e teimosa de não querer deixar avançar as coisas para que a nossa vida melhore, nem que seja para ficarmos todos a saber, de forma clara e indiscutível, que assim, como estão as coisas, é que está certo.
Neste seu novo artigo Rui Pedro Ávila vai buscar frases (algumas fora do contexto) que eu proferi numa audição na Comissão de Economia em Maio de 2021 sobre o Projecto de Resolução n.º 51/XII (CDS-PP) – Modelo Alternativo de Transporte Marítimo de Mercadorias nos Açores, e partes (fora do contexto) de um comunicado, já de Agosto deste ano, da Comissão de Transportes e Logística da Câmara do Comércio de Angra do Heroísmo, da qual faço parte e presido, sobre o Estudo em causa e sobre problemas que ocorrem no Porto da Praia da Vitória.
No primeiro caso tratam-se de opiniões pessoais que entendi transmitir à Comissão em meu nome pessoal, e quero deixar claro que resultam de uma reflexão que venho fazendo há muitos anos e que fui tornando pública a partir de 2012. Note-se que me aposentei em Setembro de 2009 e que entendi dever fazer um período de nojo de 3 anos, por dever de lealdade. 
Assim, em Novembro de 2012, publiquei no Diário Insular 10 artigos nos quais expunha a minha visão do que poderia ser o Sistema de Transporte de Mercadorias de e para os Açores e nos Açores. Logo de seguida entreguei a Roberto Monteiro do PS, Presidente da Câmara Municipal da Praia da Vitória, a seu pedido, um texto com essa minha visão. Mais tarde fiz o mesmo ao Presidente do PSD da altura – Duarte Freitas, também a seu pedido; fiz várias palestras sobre o mesmo tema, nomeadamente a pedido do Deputado do PS Berto Messias, do Presidente da Comissão de Ilha do PSD Costa Neves, e ainda num colóquio organizado pelo jornalista Aranda e Silva e tive uma reunião com o Secretário Regional com a tutela dos transportes Victor Fraga, igualmente a seu pedido. Tudo isto para além de vários textos e artigos que fui publicando ao longo destes 10 anos. Tudo isto para dizer que a minha posição pessoal, não ligada a partidos, empresas ou instituições, é pública e sobejamente conhecida. RPA não devia pensar que descobriu a pólvora e está a denunciá-la publicamente para que estejam a pau com as minhas más intenções.
Defendo que deve haver navios grandes e sem meios próprios de descarga (portanto mais baratos) que só vêm do Continente aos portos de P. Delgada e P. Vitória deixando e carregando no primeiro as cargas para e de S. Miguel e Santa Maria e no segundo as cargas para e das restantes ilhas, voltando directamente para o Continente. Complementarmente devemos criar um sistema de transporte inter-ilhas com navios mais pequenos e com meios próprios de descarga (uma vez que os outros portos não têm gruas para descarregá-los), que fazem a distribuição das cargas a partir de P. Delgada para Santa Maria e a partir da Praia da Vitória para as ilhas dos grupos Central e Ocidental. O Continente-Açores deverá ser tão mais barato que paga o sobrecusto do Inter-ilhas e ainda deverá resultar numa redução final do frete, que deve ser o mesmo para todas as ilhas, como é actualmente – para tal teria de ser criada uma taxa sobre as cargas do Continente-Açores que reverteria a favor do inter-ilhas - e com a enorme vantagem acrescida de criar condições reais para o desenvolvimento de mercado interno. Dispenso-me de apresentar novamente as minhas razões uma vez que já o fiz inúmeras vezes. É claro que esta é a minha convicção pessoal e que até poderá estar incorrecta. Mas o Estudo deve também servir para esclarecer isso.
Contrariamente ao que RPA dá a entender, eu nunca disse que a Transinsular e a Mutualista não deviam fazer parte do modelo. Sempre disse e escrevi: “Naturalmente, esta importantíssima medida devia ser previamente “preparada” com os armadores actualmente instalados de forma a não os prejudicar. Aliás, o Governo Regional deveria envolver, não só todos os armadores, incluindo os do tráfego local, como também a Autoridade Portuária (Portos dos Açores, SA), Empresas de Estiva, Câmaras do Comércio e Sindicatos.
O que eu disse na Comissão foi que a empresa que fizer o estudo deve ser isenta e imparcial e não deve estar ligada à Transinsular ou à Mutualista/Bensaúde, ou a qualquer outro interesse instalado! Parece-me mais que lógico e desejável.
Por outro lado, no ano passado, sobre um artigo de RPA, também escrevi e mantenho: “Então é evidente que todos devemos exigir que qualquer novo estudo de diferentes modelos de transporte marítimo de mercadorias, que contemple o transporte do Continente para os Açores e a distribuição e transporte de carga inter-ilhas deve ser economicamente viável, ou seja, não deve ter qualquer subsídio do orçamento regional e deve cumprir, no mínimo, o mesmo serviço público que o actual modelo!
É que, se assim não fosse, estaríamos a ir de cavalo para burro, como se costuma dizer.” Quanto ao comunicado da Comissão de Transportes e Logística da Câmara do Comércio de Angra do Heroísmo, RPA apenas refere a parte do comunicado sobre problemas actuais existentes no Porto da P. Vitória, esquecendo-se da parte referente ao Estudo. É claro que, independentemente do Estudo, que não sabemos quando estará concluído e implementado, as empresas que trabalham no Porto da P. Vitória têm todo o direito de reclamarem junto do Governo Regional sobre aquilo que acham que neste momento está a funcionar mal naquele porto e até a acharem que seria interessante a realização de um Plano Estratégico para o porto. Em que é que isto condiciona o Estudo? 
Infelizmente RPA não refere que, sobre o Estudo, o comunicado diz exactamente o seguinte: “Quanto ao estudo sobre o modelo de transportes marítimos, cuja realização o Governo Regional está a contratar, a Comissão considera que este deve ter como princípios base - a isenção para ser credível; o transporte marítimo como alavanca para o desenvolvimento económico de todas as ilhas; a redução da pegada ecológica; uma participação activa de todas as forças vivas e principais players da região, nomeadamente a CCAH; e deve referenciar os vários estudos realizados anteriormente na Região. A Comissão reforçou ainda a preocupação pela diminuição das ligações marítimas inter-ilhas, sobretudo entre a ilha Terceira e as restantes do grupo central, prejudicando os empresários destas ilhas que pretendem ter ligações comerciais. É imprescindível, para o sistema de distribuição de mercadorias funcionar com eficácia, que as ligações inter-ilhas funcionem de forma eficaz e programada. Reivindica, por isso, que o estudo em adjudicação deve também debruçar-se sobre o designado mercado interno e as necessidades específicas de determinadas exportações e importações.” É claríssimo e nada condicionador!
Portanto só podemos concluir que eu, como cidadão independente, interessado e participativo, e a Comissão de Transportes e Logística da Câmara do Comércio de Angra do Heroísmo, pretendemos que o estudo seja isento, livre, o mais alargado possível nas hipóteses a estudar, conte com a participação do máximo possível de entidades de todas as ilhas ligadas ao sector e que considere o transporte marítimo como alavanca para o desenvolvimento económico de todas as ilhas. Não devia ser este o desejo de todos os açorianos?
Parece que Rui Pedro Ávila tem medo que assim seja e quer, isso sim, condicionar a nossa intervenção! Lamentável!
Aliás, quando RPA escreve “É ou não é verdade que só vemos em toda a prosa acima citada falar e defender o porto da Praia da Vitória e defender cabotagem inter-ilhas para as restantes ilhas além de S. Miguel e Terceira? Isto é inclusão? Não é andar para trás o cercear-se o transporte actual nos porta-contentores dos três operadores Mutualista, Transinsular e GS-Lines?” está claramente, não só a condicionar o Estudo, como a dizer que ele não é necessário, porque como as coisas agora estão é que estão bem!
Andar para trás é, em minha opinião, os produtores de meloas da Graciosa virem dizer, há dias, que têm grande dificuldade em enviar as suas meloas para as outras ilhas ou vermos que em 2022 os micaelenses, e não só, não se podem deslocar para as restantes ilhas com as suas viaturas, como fizeram durante tantos anos e, mesmo sem as viaturas, só o podem fazer de avião! Estas e muitas outras são questões que o Estudo deve abordar. 
RPA não percebe que o que interessa e é fundamental é que devemos querer que os contentores cheguem a todas as ilhas ao mesmo preço, em perfeitas condições, rapidamente, e mais baratos!
Duas notas, ainda: 
Os números que indiquei no meu artigo foram retirados do Relatório e Contas 2021 da Portos dos Açores. Se não estão correctos será um problema grave da Portos dos Açores ao qual sou alheio.
Quanto à sua afirmação de que “Quanto a custos é tudo muito relativo: baixaram o IVA mas os produtos mantiveram quase o mesmo preço,,,”, parece-me também lamentável. Então não é muito importante tudo fazermos para que os preços baixem?

Repito: O problema de Rui Pedro Ávila e outros é que de facto não querem que se faça qualquer estudo, não querem que se faça qualquer alteração ao modelo actual! O que é grave!
Deixemo-nos, portanto, de acenar com papões e trabalhemos para o bem de todos os açorianos! Exijamos que o Estudo seja super credível, para termos uma base segura de orientação para o futuro, a bem dos Açores!

*Ex-trabalhador portuário; não respeita o chamado Acordo Ortográfico

José Ribeiro Pinto*

Share

Print

Theme picker