Diário dos Açores

Autonomia, Valores e Currículo

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Figuras, Currículo e História
As Grandes Figuras permanecem pelo Espírito, pela sua Obra e pelo seu Exemplo. De nada serve promover livros de Homenagem, em Vida, ou depois, se não for para seguir o Exemplo e a Obra. É uma afirmação simples mas que diz muito. É assim em todas as instituições, no caso nas instituições educativas, em especial as Universidades. Seja em que instituição for, nós só seguimos como Valor quem serve, e não se serve de…, quem serviu e não quem se serviu de… E todos nós temos cada vez mais o faro apurado e sabemos muito bem discernir e decifrar. Estes dois verbos são dois valores que levam uma vida para serem apurados numa sociedade onde a maldade tem de ser denunciada sem desfalecer porque tende a instalar-se como erva daninha. Já é pouco, muito pouco, falar em Sociedade do Conhecimento e Sociedade Educativa, porque nelas se enrola muita manha que é preciso esmagar para dar vida à vida que se afirma como vida. A Vida afirma-se sempre como vida. Não é uma tautologia, é uma constatação. Precisamos de respirar vida, respirar verdade, respirar valores e só respiramos ar puro. Há quem inale e expire ar impuro, pelo contrário há quem inale e expire ar puro, através das suas palavras, dos seus comportamentos, das suas obras, da sua coerência de ser, da decência e sentido de Dever. Neste alinhamento, como republicano, de valores cristãos, presto a minha Homenagem à Rainha Isabel II. Tem um nome pessoal, próprio, muito bonito. Nela, o elemento singular ligava-se ao elemento universal. Como ser humano tinha defeitos e qualidades mas era das pessoas que me fazia sentir que tudo fazia para apurar em si as virtudes mais altas a que um ser humano deve chegar, independente da condição de Monarca. Mas via-se que nela tudo se edificava para ser irrepreensível como Rainha. Ora, na sua Figura foi traçando um percurso, um trajeto, um curriculum vitae que a torna digna de reverência humana. Não há, pois, currículo sem Figuras. E essas Figuras tornam-se dignas de serem estudadas na História local, Nacional, Europeia e Mundial. E são múltiplas as Figuras em tantas áreas e domínios.
Escola e Currículo
No caso português, nesta nossa III República, (que deve recolher o melhor das anteriores) ciclicamente há revisões de currículos e programas. Mas no Currículo e nos Estudos sobre o Currículo raras vezes se cola a questão: de tanto que há a aprender o que merece, o que tem a dignidade, de ser ensinado? Há uma finura do currículo que se impõe colocar. Essa finura não é nada de ornamento, pode ser trabalhos manuais, essa finura tem a ver com aquilo que, em si, tem a dignidade de fazer com o aluno, sendo melhor aluno, seja, ao melhor tempo melhor pessoa. Onde está o bom trato nas nossas escolas, a educação dos modos, do comportamento, o respeito por todos e por cada um? Quero aqui enfatizar as atitudes e os valores. Só com valores e atitudes educativas e educadoras teremos uma escola mais eficiente, mais eficaz e mais produtiva. Mas o melhor das atitudes e dos valores não passam apenas pelo ensino, passam antes pelo exemplo, vendo alunos e demais agentes educativos educados. Mas gostaria de corrigir qualquer transposição. Não estou a defender seguirmos o exemplo britânico, por mais meritório que seja. Quero uma Escola de um País democrático a funcionar democraticamente, como os valores da cidadania laica, que respeita todos os valores, incluindo os valores religiosos. Aliás, aquando da Reforma Educativa e Curricular de 19989/90 em substituição de Educação Moral e Religiosa Católica (EMRC), os alunos podiam frequentar, se houvesse para oferecer, a Disciplinade Desenvolvimento Pessoal e Social (DPS), o que significa que o próprio Legislador considerava que a disciplina de Educação Moral e Religiosa Católica contribuía para o Desenvolvimento Pessoal e Social do aluno-educando. É algo que deve ser profundamente refletido no Desenvolvimento Educativo e Curricular do Sistema Educativo Português. No fundo, estamos a falar de valores religiosos e laicos. A Pessoa é um todo e os valores religiosos são constituintes do ser humano como muito bem defendeu o Grande Filósofo Leonardo quendo era Ministro da Instrução na I República Portuguesa, defesa que lhe veio a custar o cargo devido à oposição interna dos republicanos mais inóspitos e agressivos, o que foi um prejuízo para o Governo e para a I República como a História mostrou e muito, inexplicavelmente, está por explicar!!!
Um dos documentos a ter em conta na Organização e Desenvolvimento Curricular é o documento intitulado “Perfil dos alunos à Saída da Escolaridade Obrigatória”. (Despacho nº 6478/2017, 26 de julho). É de ter em conta, desde logo, o Prefácio. Tenhamos em conta as seguintes afirmações de Guilherme D’Oliveira Martins: “A educação para todos, consagrada como primeiro objetivo mundial da UNESCO, obriga à consideração da diversidade e da complexidade como fatores a ter em conta ao definir o que se pretende para a aprendizagem dos alunos à saída dos 12 anos de escolaridade. A referência a um perfil não visa, porém, qualquer tentativa uniformizadora, mas sim criar um quadro de referência que pressuponha a liberdade, a responsabilidade, a valorização do trabalho, a consciência de si próprio, a inserção familiar e comunitária e a participação na sociedade que nos rodeia.” Mais adiante escreve no Prefácio: “Devemos, assim, compreender os sete pilares que Edgar Morin considera numa cultura de autonomia e responsabilidade: prevenção do conhecimento contra o erro e a ilusão; ensino de métodos que permitam ver o contexto e o conjunto, em lugar do conhecimento fragmentado; o reconhecimento do elo indissolúvel entre unidade e diversidade da condição humana; aprendizagem duma identidade planetária considerando a humanidade de destino; exigência de apontar o inesperado e o incerto como marcas do nosso tempo; educação para a compreensão mútua das pessoas, de pertenças e culturas diferentes; e desenvolvimento de uma ética do género humano, de acordo com uma cidadania inclusiva”. Em Educação lê-se pouco. Falta Cultura na Educação. Mas a apologia do espírito crítico é mais uma retórica enganadora do que uma reflexão para avançar.
Trata-se de finalidades que devem estar presentes na consideração dos conhecimentos, competências, capacidades, atitudes e valores.
Este Documento tem, de modo implícito e explícito, uma Filosofia da Educação e da Formação. Assim, na Visão de conjunto são explicitadas as finalidades expectáveis pelos jovens à Saída da Escolaridade Obrigatória.

No documento podemos ler:
“A Visão de aluno integra desígnios que se complementam, se interpenetram e se reforçam num modelo de escolaridade que visa a qualificação individual e a cidadania democrática.
Pretende-se que o jovem, à saída da escolaridade obrigatória, seja um cidadão:
• munido de múltiplas literacias que lhe permitam analisar e questionar criticamente a realidade, avaliar e selecionar a informação, formular hipóteses e tomar decisões fundamentadas no seu dia a dia;
 • livre, autónomo, responsável e consciente de si próprio e do mundo que o rodeia;
• capaz de lidar com a mudança e com a incerteza num mundo em rápida transformação;
• que reconheça a importância e o desafio oferecidos conjuntamente pelas Artes, pelas Humanidades e pela Ciência e a Tecnologia para a sustentabilidade social, cultural, económica e ambiental de Portugal e do mundo;
• capaz de pensar crítica e autonomamente, criativo, com competência de trabalho colaborativo e com capacidade de comunicação;
 • apto a continuar a aprendizagem ao longo da vida, como fator decisivo do seu desenvolvimento pessoal e da sua intervenção social;
• que conheça e respeite os princípios fundamentais da sociedade democrática e os direitos, garantias e liberdades em que esta assenta;
• que valorize o respeito pela dignidade humana, pelo exercício da cidadania plena, pela solidariedade para com os outros, pela diversidade cultural e pelo debate democrático;
• que rejeite todas as formas de discriminação e de exclusão social”
Tudo isso exige reflexão e ação, bem como interação entre as duas dimensões. É tempo de levar a sério as palavras escritas ou proferidas com seriedade, por Figuras de Referência. É tempo de levar a sério a Educação, que é uma tarefa e campo de exigência, em Democracia, com Cultura, contra a demagogia dos incompetentes. Em Educação, seja onde for, deviam estar os melhores, e não os mais subservientes. Não basta denunciar a mediocridade, há que a erradicar. É preciso ir às causas para termos uma Sociedade Melhor.

Ora, o Decreto-Lei nº 55/2018, de 6 de Julho tem, embora noutra formulação, todos os pressupostos do documento atrás referido, na explicitação das linhas orientadoras do currículo do ensino básico e ensino secundário. Neste Decreto pode ler-se na “conceção” e “finalidade”: “ O currículo visa garantir que todos os alunos, independentemente da oferta educativa e formativa que frequentam, alcançam as competências definidas no Perfil dos Alunos à Saída da Escolaridade Obrigatória”. Trata-se de um documento com vários conceitos e noções curriculares de valor concetual desigual. Conexões de Sentido a estudar.


 *Doutorado e Agregado em Educação e na Especialidade de Filosofia da Educação

Emanuel Oliveira Medeiros
Professor Universitário*

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