Diário dos Açores

Mariano Raposo: Um Globetrotter do Futebol

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Desportistas do meu tempo

O Mariano Raposo nasceu numa família de 7 irmãos em Santa Clara, na  então paróquia da freguesia de S. José, actualmente freguesia do concelho de Ponta Delgada.Desde criança que as brincadeiras de rua, o mar ali ao pé da porta e o futebol eram as suas principais actividades nos tempos livres. A proximidade do campo da Mata da Doca, do ringue do Patronato de S.Miguel, da praia e do calhau da areia eram os locais predilectos para as brincadeiras da rapaziada de Santa Clara. Herdou a habilidade do Pai, excelente avançado do Santa Clara, falecido quando o Mariano tinha apenas 2 anos de idade. O seu tio Mariano de Sousa, jogador e treinador de sucesso no Santa Clara, começou a levar o Mariano, ainda criança, aos jogos do clube. O irmão Virgílio e o cunhado  Madeirinha tambémforam grandes referências para a sua  carreira desportiva.
Entretanto, aos 13 anos de idade, foi convidado para ir treinar com os jogadores mais jovens do Santa Clara. Daí em diante, sem medo de jogar com os mais velhos e mais corpulentos começa a dar nas vistas, tendo sido convocado pelo João Brito Zeferino (selecionador da AFPD) para alinhar pela seleção de juniores. A estreia não se confirmou por não ter idade para ser atleta federado.Mais tarde,já com 15 anos feitos, é inscrito com autorização especial, na equipa de juniores do Santa Clara. Nesta categoria, a sua evolução foi meteórica e diversas equipas do continente (Benfica, Belenenses e Sporting) começaram a endereçar convites ao Mariano. Embora apalavrado com o Belenenses, a opção foi pelo Benfica, atendendo a que o Santa Clara era filial dos encarnados de Lisboa.
Entretanto, no seu percurso escolar,frequentou a escola primária em Santa Clara (3 anos) e concluíu a 4ª classe na escola do campo de S.Francisco. De seguida, entrou no ensino secundário, tendo circulado pelas instalações da rua do Bêco (5º ano), Arquinha (6º ano),Roberto Ivens (7º ano)  e os últimos dois anos (8º e 9º ano) na recém inaugurada Escola Secundária Domingos Rebelo. Quando ingressou no Benfica possuía o curso de Formação Geral do Comércio e, em Lisboa, concluíu os 2 anos da Secção Preparatória aos Institutos Comerciais, habilitações necessárias para ingressar na faculdade. Naquele tempo, pretendia ser professor de Educação Física (INEF), o que não se concretizou por dificuldades financeiras. Quando chegou ao Benfica (1972), foi falar com o senhor Angelo Martins (jogador bi-campeão europeu) e treinador responsável pelas equipas de juvenis e juniores. Iniciou de imediato os treinos e,após o 2º treino, o treinador disse-lhe que não era preciso ver mais. Iria assinar contrato e que tinha grandes hipóteses de ser internacional júnior. Como a sua família já tinha o processo de  emigração para o Canadá em fase adiantada, solicitou à Mãe que o deixasse ficar em Lisboa para aproveitar a oportunidade de jogar no Benfica. Após a aprovação da Mãe, fez a sua estreia na equipa de juniores. No entanto,o treinador entendeu que no primeiro ano (de adaptação), era mais aconselhável jogar na equipa de juvenis.
 Na 2ª época, subiu à equipa de juniores continuando a mostrar as suas promissoras qualidades futebolísticas, pelo que foi  convocado para a seleção de juniores. Como também actuava  na equipa de reservas, a sobrecarga de esforço para a sua idade, fez com que contraísse uma lesão complicada. Embora queixoso, foi infiltrado por diversas vezes o que conduziu a uma rotura muscular. Os serviços médicos não souberam lidar com a situação eface à gravidade da lesão concluíram que tinha que ser operado. O Mariano não gostou do diagnóstico, sentiu-se enganado e revoltado pela forma como tinha sido tratado, pelo que decidiu regressaraos Açores.
Em S.Miguel, depois de nova observação médica foi confirmada a gravidade da lesão e a necessidade de cirurgia. No entanto, a sua opção foi a de fazer uma longa paragem  tendo em vista a desejada recuperação. A determinada altura, sentiu que os meses de inactividade,já lhe davam garantias para recomeçar a actividade física, embora com limitações e precauções. Assim,com a orientação do senhor Carlos Barbosa (reconhecido fisioterapeuta) foi recuperando das mazelas e recomeçou a actividade desportiva. Foi o início de um novo percurso desportivo na equipa do Santa Clara com a conquista o título de S.Miguel. Na época seguinte participaram no Campeonato Açoriano tendo como principal adversário a conceituada equipa do Lusitânia. Atendendo a que na formação da ilha Terceira jogavam alguns  amigos seus (Fontes e Teves) e o clube tinha manifestado interesse na sua contratação, decidiu aceitar o convite.
O Sport Club Lusitânia era um clube bem organizado, com um departamento médico competente e um treinador experiente (Elvino Bettencourt), que lhe transmitia estabilidade e lhe dava a oportunidade de evoluir como jogador. Aceitou um emprego, atendendo a que os treinos decorriam a partir das 7.00 da manhã, tomavam o pequeno almoço no balneário e seguiam para o trabalho. A época foi excelente, venceram as diversas competições em que participaram, jogou pela seleção da AFAH num torneio em S. Miguel e tudo corria bem. Com saudades, a sua querida Mãe pediu-lhe para voltarpara casa e, assim aconteceu, regressando novamente ao S.Clara.
Entretanto, após um torneio efectuado em Angra do Heroísmo com a participação da Académica de Coimbra, Nacional da Madeirae S.Clara, surgiu um convite para ingressar no futebol madeirense.No primeiro ano actuou pelo Marítimo e na época seguinte pelo Nacional (ambos na 1ª divisão nacional). Cumprida a etapa madeirense decidiu regressar à sua terra natal (S.Miguel) e ao clube de sempre, oSanta Clara.Algum tempo depois, viajou até ao Canadá tendo alinhado num clube português da cidade de Edmonton (província de Alberta), tendo sido campeão e subido à divisão principal.Apenas com 27 anos de idade, não aceitou o contrato  oferecido e resolveu regressar à “Ilha Verde”, invocando motivos familiares.
Como não queria continuar a ser jogador profissional, enveredou pelo amadorismo e avançou para uma nova experiência, em clubes tradicionais de S.Miguel (Clube União Micaelense, Águia Clube Desportivo, Benfica Águia Sport e Clube Operário Desportivo), procurando transmitir os seus conhecimentos, experiência e os aspectos positivos do futebol às novas gerações. Após ter tirado o curso de treinadores fez uma passagem por essas funções e, também desempenhou diversas cargos directivos no seu clube de sempre, o Santa Clara. Na sua excelente carreira desportiva nunca sofreu qualquer penalização, foi sempre um exemplo de “Fair Play”. Na 1ª Gala da Associação de Futebol de Ponta Delgada (1984), foram reconhecidos os seus méritos de atleta e desportista exemplar, sendo nomeado Sócio de Mérito e recebendo a distinção de Personalidade. O seu nome foi atribuído à prova de juniores D (Sub-12) da AFPD.
Um grande exemplo para as novas gerações.

Eduardo Monteiro *

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