Diário dos Açores

“O desafio de formar e capacitar jovens para um futuro ainda desconhecido”

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O desenvolvimento pessoal e profissional foi o tema de encontro promovido na semana passada pelo Conselho Económico e Social dos Açores – CESA, que reuniu diversos representantes do governo, da academia, iniciativa privada e sociedade civil. Foram realizadas duas mesas, “Desafios da valorização do capital humano, educação, formação e ciência” e “O papel do capital humano nas iniciativas empresariais”, que contaram com intervenção dos primeiros actores no assunto. A difícil questão, sem resposta no mundo todo, exige uma reflexão conjunta sobre como encaminhar jovens em suas vidas, para o mercado de trabalho e para um amanhã em franca transformação.
Até três décadas atrás, o sucesso profissional era linear, previsível e dependia de uma equação mais simples: boas escolas mais as boas escolhas resultavam em boas carreiras e bons salários.
Atualmente, o conhecimento fragmentou-se e expandiu-se de uma tal maneira, que as instituições de ensino estão tendo dificuldade em motivar os jovens em relação à continuidade dos estudos, bem como em preparar o corpo de professores para um ambiente de aprendizagem mais dinâmico.
Ao contrário do que acontece em diversos países na Europa, em Portugal e nos Açores, as escolas de ensino qualificante sofrem do estigma de “segunda opção”, quando deveriam ser consideradas um aliado forte na complementação da jornada de formação. Por outro lado, a maioria das empresas carece de profissionais mais qualificados e, quando os encontra, não consegue reter esses talentos, por não possuir uma cultura estruturada de valorização do capital humano, como asset do próprio negócio.
Fechando o cenário, pode até haver boa vontade, mas faltam recursos e atuação mais sinérgica na criação e gestão de políticas públicas. Este não é um panorama exclusivo dos Açores, apesar dos índices alarmantes de abandono dos estudos e crescimento do grupo “NEM,NEM”, ou dos jovens que nem estudam, nem trabalham. Segundo o Presidente da Associação Nacional das Escolas Profissionais – ANESPO, José Luís Presa “o maior desafio está no diagnóstico sobre o que é a capacitação profissional junto aos jovens e famílias”.
Chama a atenção como a tecnologia ainda é tratada neste processo, mais como ferramenta e menos como inteligência e agente de mudança. A transição digital no quesito de formação e capacitação dos jovens avança somente como pano de fundo, apesar de eles estarem 24 horas ligados aos seus telemóveis bem mais interessados nos conteúdos virtuais, do que na sala de aula e no trabalho.
A experiência forçada pela pandemia trouxe aprendizados preciosos sobre como conduzir a digitalização no ensino à distância e no teletrabalho. Segundo a Secretária Regional da Educação e Assuntos da Cultura, Sofia Ribeiro, mecanismos de inteligência artificial começaram a ser usados para personalizar a recomendação de exercícios de acordo com o perfil do alunos e, para os professores, os treinamentos de forma remota continuam acontecendo online, via plataformas MOOC  (do inglês, Massive Open Online Course). É um começo.
No caso específico do arquipélago, a tecnologia é chave para uma atuação sem fronteiras junto aos continentes Europeu, Americano, Africano - a próxima porta para arrancada evolutiva do planeta e aos que estão geograficamente mais distantes, mas não menos importantes, os continentes Asiático e Oceania. A tecnologia introjetada de forma transversal na economia aponta um caminho mais rápido e pertinente no fomento e ganho de competitividade.
Em nações mais desenvolvidas, o aporte digital faz toda a diferença para uma atuação mais sustentável em todos os âmbitos, essencial para o convencimento na captação de investimentos dos mais expressivos. Segundo o assessor do Conselho de Administração da AICEP Portugal Global, Luís Rebelo de Sousa, “essas novas fornadas de talentos têm permitido trazer a Portugal projetos de valor acrescido”. A Holanda é um ótimo caso prático. Com metade da área de Portugal continental, é hoje o segundo maior exportador de alimentos agrícolas do mundo. Qual o milagre? O uso de técnicas e tecnologias digitais das mais revolucionárias a partir do aproveitamento integral das novas ideias e talentos. No chamado Food Valley ou Vale do Alimento, uma analogia ao Vale do Silício, a Universidade de Wagningen é o coração do progresso tech como diferencial competitivo e ganho de produtividade, como resposta à demandadas empresas e instituições governamentais.
A Índia é outro celeiro de genialidades, que incentiva os seus jovens na missão de ressignificar o país, a “nova Índia”. Alargar os limites tecnológicos seria de grande valia para os segmentos de destaque nos Açores como o turismo, agricultura, energias limpas, economia azul e porto espacial. Não faltam exemplos a seguir e todos eles estão sendo implantados por jovens profissionais, que são como “anzóis” fisgando as mentes açorianas mais brilhantes para fora do arquipélago. A formação, capacitação e retenção dos que serão os protagonistas por aqui poderia passar pela escuta atenta a estes desbravadores do desconhecido: os jovens devem fazer parte deste tipo de discussão.
No fim do dia, a pauta é a definição de futuro dessa juventude. Como disse o Presidente da Comissão Nacional do Plano de Recuperação e Resiliência - PRR, Pedro Dominguinhos, “um indivíduo conta”. É certo que a disrupção nos modelos de trabalho e, consequentemente, das próprias profissões, dificulta uma visão mais clara sobre o rumo a ser tomado. É tudo muito novo para todos. No entanto, um direcionamento comum ecoa desde os anos 80, antes mesmo da bolha da internet surgir e aponta que as nações mais ricas não serão mais aquelas com abundância de recursos naturais como o petróleo, ou de grande extensão territorial nem superioridade financeira, mas sim as que forem mais tolerantes e abertas à diversidade de conhecimento. Simplificando, no século XXI, o capital humano passa a ser a maior riqueza das nações e, por ser móvel, pode pertencer a qualquer país, ou grupo de países. Partilhou deste conceito, a afirmação da Secretária Regional Maria João Carreiro, de que o “desenvolvimento do capital humano nos Açores é a base da criação de valor económico, social e cultural”. A convergência tecnológica já é realidade. Agora só falta o entendimento entre lideranças sobre o melhor uso desta avenida de oportunidades na mentoria dos jovens pelo ecossistema digital. Este pode ser um triunfo açoriano.
O evento “Desenvolvimento Pessoal e Profissional: processos e contextos numa visão Penta Hélix” teve seu encerramento realizado pelo Secretário Regional da Agricultura e do Desenvolvimento Rural – António Ventura, em representação do Sr. Presidente, José Manuel Bolieiro.
Aconteceu na semana passada no NONAGON -Parque da Ciência e Tecnologia de São Miguel, na Lagoa, espaço dedicado à inovação, com iniciativa e trabalhos conduzidos pelo CESA, na figura de seu presidente, Dr. Gualter Furtado e da Presidente da Comissão Especializada de Educação e Formação–Teresa Borges Tiago.


(*) Correspondente especial para o Diário dos Açores, sediada no Brasil.

Marisa Furtado (*)

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