Diário dos Açores

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Parecia que a guerra na Ucrânia se aproximava do fim, com as tropas russas em fuga de regiões antes ocupadas, deixando atrás de si grandes quantidades de material em perfeitas condições de ser utilizado pelo exército vitorioso... Eis senão quando, o ditador russo ordena a mobilização de reservistas numa quantidade que pode alcançar um milhão de soldados, promove a realização de referendos de anexação fantoches em zonas disputadas e das quais antecipadamente fez sair parte da população não russófila, e ameaça com o uso de armas nucleares contra quem quer que seja que conteste a invasão e os ganhos territoriais em virtude da mesma alcançados. Vamos ter conflito armado dentro da Europa por muito mais tempo do que todos desejaríamos no Ocidente!
Porque as veleidades do regime ditatorial russo não podem ser aceites, de modo nenhum! A invasão da Ucrânia, invocando pretensões injustas e negando ao país e ao povo o seu direito de existirem como membros independentes da Comunidade Internacional, e ainda por cima violando tratados internacionais de garantia de fronteiras dos quais a Rússia é parte, põe em causa todos os princípios em que assenta a convivência livre entre as Nações.
Entre os países mais fortes e os mais fracos interpõe-se o Direito Internacional a assegurar condições de sobrevivência de todos e de diálogo e colaboração entre todos. O que o ditador russo e os seus apaniguados pretendem, aliás sem qualquer mandato democrático do povo russo, é afinal a sua própria sobrevivência e o esmagamento de qualquer oposição. A invasão da Ucrânia funciona como elemento de distração das dificuldades internas e das carências experimentadas pela população.
Resta-nos a expectativa de um levantamento interno contra a ditadura, acelerado pela convocação dos reservistas, que estão fugindo da Rússia como podem e merecem ser acolhidos como refugiados nos países da União Europeia. Em todo o caso, não se ignora como a repressão na Rússia é intensa e eficaz, desaparecendo os contestatários da circulação para os presídios espalhados pelas grandes extensões da Sibéria, quando não para uma qualquer vala comum. Infelizmente, tais procedimentos são correntes na Rússia desde os tempos dos czares, e Lenine e Estaline não fizeram mais do que os continuarem, tal como faz o ditador de turno.
De resto a guerra conduzida pelas tropas russas caracteriza-se pela brutalidade dos métodos de combate e pela violência aterrorizadora contra as populações civis, sem excluir velhos, mulheres e crianças. Perante as imagens de destruição que todos os dias nos entram pela casa dentro, trazidas pela televisão, com casas, escolas e hospitais arrasados à bomba e escassos sobreviventes vagueando entre as ruínas, é nauseabundo encarar com os senhores do Kremlin, nédios e envergando fatos janotas, sentados à volta de mesas para ouvirem as bojardas do ditador, noutros tempos estariam certamente de joelhos...
É uma triste realidade da milenar cultura russa. Quando visitei os museus e as igrejas existentes dentro da fortaleza de Moscovo, fui surpreendido com o comentário do guia que assinalava que nas igrejas só havia lugar sentado para o Patriarca e para o Czar, todas as outras pessoas devendo permanecer de pé ou de joelhos durante as, aliás intermináveis, cerimónias religiosas ortodoxas, repletas de cantos e gestos litúrgicos, que o povo é suposto reverenciar inclinado para o chão.
E enquanto na frente de batalha as coisas estão com estão, têm vindo a cair alguns dos governantes europeus mais fortemente empenhados no apoio à Ucrânia e vão sendo eleitos governos e formando-se maiorias parlamentares mais ou menos alguma vez simpatizantes com o ditador russo e o seu regime autocrático. Além disso, as sanções decretadas na União Europeia contra a Rússia estão tendo consequências pesadas em termos de custos de energia e de acesso a matérias primas, sendo já detectáveis perigosos sinais de inflação galopante e de tendências recessionistas em vários países. Com tudo isto contam os apoiantes da ditadura russa para fazer vergar o apoio do Ocidente à Ucrânia e assim abreviar um final de guerra favorável às pretensões imperialistas da Rússia.
Ora, isto não pode acontecer! A Comissão Europeia e a sua Presidente têm sido muito visíveis na gestão da crise, mas convém muito que os Governos dos Estados Membros da UE e os próprios Parlamentos Nacionais se cheguem também à frente, sem deixar lugar a dúvidas quanto às posições que defendem.
 Tenho sempre chamado a atenção para o facto de o Parlamento Europeu não ter poderes em matéria de defesa, que pertence ao âmbito intergovernamental; e por isso seria muito conveniente incluir na estrutura orgânica da UE uma câmara representativa dos Parlamentos Nacionais, que trouxesse ao funcionamento da União a legitimidade acrescida que decorre das eleições legislativas nacionais e que é em regra muito superior à verificada nas eleições para o Parlamento Europeu, em que pouca gente vota e daí alguns resultados surpreendentes... Mas isto é tabú para os Eurodeputados e nem sequer logrou ser mencionado nas conclusões, pré-fabricadas pela Eurocracia atenta, veneradora e obrigada, da ilusória COFOE. Também é certo que os Governos Nacionais, presentes do Conselho Europeu, não se dão ao trabalho de defenderem no plano europeu os Parlamentos Nacionais, dos quais aliás dependem, nem estes de o reclamar de uma forma terminante, o que não deixa de ser muito significativo do estado actual dos nossos regimes democráticos. Depois queixem-se dos avanços eleitorais do populismo e dos partidos de extrema-direita...

Em tempo: na referência feita às páginas literárias dos jornais, no meu texto da semana passada sobre o centenário de Pedro da Silveira, não mencionei, por lapso, as “Leituras do Atlântico”, do “Atlântico Expresso”, da responsabilidade de Santos Narciso. Leio esses textos sempre com proveito e até já sugeri ao seu Autor que os reunisse em livro.

   
* (Por convicção pessoal, o Autor não respeita o assim chamado Acordo Ortográfico) 

João Bosco Mota Amaral*

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