Diário dos Açores

Celso Ramos e o elo açoriano

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A tradição serrana do “se achegue”, era o jeito de bem receber nos Campos de Lages. O fogão de lenha no meio da casa, o aroma do café e da rosca de coalhada. Sempre imaginei que a casa do Governador Celso Ramos e dona Edith, na rua São Jorge, tivesse este cenário. Parecia que toda gente era de casa e ali se encontrava para mais uma conversa. Lembro de meu pai Joaquim, comerciante em Tubarão e “do PSD”, e meu sogro Ismael, pecuarista, prefeito e líder político de São Joaquim comentarem que “com ‘Seu Celso’, palavra dada, palavra empenhada”. Sem sombra de dúvida, um líder na retidão de caráter, na determinação, na mente aberta sempre pronto para conciliar pelo bem do Estado. Este tempo ficou para trás... Porém, a cordialidade, a generosidade de ser, a mente inovadora reconheço numa nova geração de netos e bisnetos de Celso Ramos.
No dia 18 de Dezembro, celebramos 125 anos do nascimento de Celso Ramos, o governador que foi o marco no desenvolvimento económico e social de Santa Catarinano virar a página do atraso e dar um passo gigante rumo ao futuro. Ao colocar em ação o Plano de Metas de Governo, o PLAMEG ,construía um novo tempo para Santa Catarina. Na década de 50, fundou a FIESC( Federação das Indústrias), sendo seu primeiro presidentee reeleito por três mandatos consecutivos. É dessa época a criação da Fundação Vidal Ramos, mantenedora da Faculdade de Serviço Social e a Faculdade de Educação. O seu olhar visionário não deixava escapar nada: criou, fundou, implantou, multiplicou para que Santa Catarina atingisse o pleno desenvolvimento da infraestrutura viária, do incentivo à média e pequena indústria, do apoio ao homem do campo, da fruticultura do clima temperado ao sistema financeiro com a criação do BESC e ao educacional com o nascimento da UDESC.
Todo este relato tem uma razão de ser...
No ensejo dos 275 anos da presença açoriana em Santa Catarina quero relevar o elo açoriano do DNA da família Ramos tendo por fonte as conversas com os irmãos Celso e Carlos Henrique Ramos Fonseca e o livro Coxilha Rica, Genealogia da Família Ramos (2002), de Celso Ramos Filho.  O autor realiza um exaustivo garimpo num deambular por documentos, cartas, jornais, fotos, reunindo um invejável acervo da memória familiar salvaguardada desde as raízes vincadas na Ilha Terceira, nos Açores.
O elo indelével dessa imensa corrente é um dos muitos “casais açorianos” que atravessaram o Atlântico na grande diáspora do século XVIII.O casal Matheus José Coelho e Maria Antónia de Jesus respondeu ao edital do Conselho Ultramarino de 31 de agosto de 1746, que incentivava a vinda de casais dos Açores para o Brasil, atraídos pela oferta de terras e o sonho de um futuro promissor. Desembarcaram em Santa Catarina entre 1750-1775, sendo assentados na freguesia São Miguel da Terra Firme (atual Biguaçu), onde já viviam outros colonos açorianos. Em São Miguel nasceram os filhos: Ricardo José (1776), Laureano José (1777) e Adolfo José(1779).
O tronco dos Ramos surge com o segundo filho, Laureano José, nascido num domingo de Ramos, em 18 de março de 1777. Matheus José Coelho, cristão novo, mudou o patronímico Coelho do filho para Ramos e adotou o Ramos como sobrenome para os demais filhos. Com Laureano José começa a Família Ramos, sendo ele a 2ª geração. Do terceirense Matheus Coelho até os dias atuais são 9 gerações e milhares de descendentes.
O jovem Laureano, de ofício marceneiro, partiu para São Francisco do Sul e, tempos depois, vai para Vila Santo Antônio da Lapa (Paraná), ondecasa-se com Maria Gertrudes de Moura, natural da freguesia de N.S.do Pilar (atual Antonina). Em 1807muda-se para Santo Antônio da Patrulha, freguesia fundada por açorianos no litoral norte do Rio Grande do Sul. A família, em 1812, se estabelece nos Campos de Lages na Fazenda Guarda-Mór, Coxilha Rica, ali criam um verdadeiro império económico, a partir da grande propriedade de agropecuária, destacado na criação e comercio de gado, na produção de frutas e nas tecnologias patrimoniais da azenha, atafona, tecelagem de lá e algodão, olaria e carpintaria.
Laureano José Ramos, além de rico e poderoso fazendeiro exercia uma forte liderança política e social na Vila Nossa Senhora dos Prazeres de Lajes (atual cidade de Lages). Escreve seu bisneto Celso Ramos Filho: “Laureano era o tronco da prestigiosa família Ramos, a qual sempre teve decisiva influência na política catarinense” (p.53).Aliás, tão decisiva que os Ramos governaram Santa Catarina por mais de um terço do século XX, destacando-se Vidal de Oliveira Ramos Jr e seus filhos Nereu Ramos (que chegou a Presidente do Brasil), Celso Ramos e o neto Aderbal Ramos da Silva.
Os nove filhos do patriarca Laureano José foram herdeiros de um valioso legado ético e moral incontestável. A enorme descendência da Clã dos Ramos espalha-se por Santa Catarina (a maior parte), Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro.
Desde a Ilha Terceira de onde partiu o aventureiro casal Matheus Coelho e Maria Antónia de Jesus até a Ilha de Santa Catarina sobressai a histórica trajetória da família Ramos, protagonista de importante capítulo da vida política, económica e cultural de Santa Catarina.

Lélia Pereira Nunes*

*Vice Presidente do Conselho Municipal de Educação de Florianópolis

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