Diário dos Açores: o elo de ligação entre os açorianos e acontecimentos históricos do século XX
Diário dos Açores

Diário dos Açores: o elo de ligação entre os açorianos e acontecimentos históricos do século XX

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Informar os açorianos tem sido desde o inicio da sua história, o principal objectivo do Diário dos Açores. Desde a sua criação, para além de ser o meio de comunicação que ligava os açorianos a nível regional, o mesmo também era um via para estar em constante contacto com as notícias a nível nacional e internacional, assinalando acontecimentos que acabaram por ser o elo de ligação do Arquipélago dos Açores com restante do mundo.
No dia em que comemora o seu 153º aniversário, relembramos algumas notícias que ganharam destaque pela consequente influência dos mesmos no Região Autónoma dos Açores, revivendo em simultâneo o porquê do Diário dos Açores continuar a deter o título do jornal diário mais antigo dos Açores.

Regicídio de 1908

O dia 1 de Fevereiro de 1908 assinalou um dos acontecimentos mais marcantes da história de país e que futuramente contribuiria para o “ruir” da monarquia em Portugal.
O designando regicídio ficou perpetuado pelos assassinatos do Rei D. Carlos I de Portugal e dos Algarves e do seu herdeiro Luís Filipe, Príncipe Real de Portugal às mãos de simpatizantes dos interesses republicanos, na Praça do Comércio.
Para esta tragédia contribuíram as eleições de 1906, cuja vitória do partido chefiado por João Franco e respectivas medidas adoptadas cooperaram para o crescente descontentamento por parte dos revolucionários republicanos.
A trajectória traçada pelo Partido Republicano Português para a erosão do sistema partidário vigente, bem como a tentativa por parte do rei D. Carlos, de agir como mediador do sistema político, apoiando o Partido Regenerador Liberal de João Franco, colaboraram para o desagrado do Partido Republicano Português.
Contudo, o constituir de uma ditadura por parte de João Franco, com o total apoio do então rei D. Carlos e a respectiva suspensão da Carta Constitucional em 1907, conduziram ao despoletar dos acontecimentos trágicos.
Esta fatalidade foi noticiada pelo Diário dos Açores, na “Secção Telegraphica”: “No momento em que o rei e o príncipe passavam pelo Terreiro do Paço, um individuo descarregou contra elles uma carabina, ficando o rei ferido”, indicou naquela altura o jornal, confirmando ainda a morte de ambos: “O rei e o príncipe atingidos por tiros de carabina, morreram. A polícia descarregou sobre trez regicidas, ficando estes também mortos.”
Entretanto, dias mais tarde, o diário contextualizava os acontecimentos, relatando os momentos que antecederam ao desfecho trágico: “Esse individuo avançou para a carruagem, subiu-lhe ás trazeiras e disparou contra o Sr. D. Carlos num tiro que o alcançou no lado esquerdo do thorax. (...) O Senhor D. Carlos levou as mãos á cabeça e tombou immediatamente sobre o lado direito, emquanto varias pessoas caiam sobre o regicida”, descrevendo ainda os eventos que culminariam também no assassinato do então príncipe primogénito e futuro monarca português: “enquanto isto se passava, um individuo alto, de bigode e barbas negras, envergando um grosso varino, que se achava postado junto ao ministério do reino, tirou de debaixo do capote uma carabina e, avançando para a carruagem, cujo cocheiro, desvairado, tocava os cavallos, disparou um tiro sobre o príncipe real, attingindo-o na face, tiro que foi logo seguido de um outro, que o alcançou no peito” (…) “a carruagem real penetrou no portão de ferro do Arsenal com a rainha e o infante em lacrimoso pranto, soltando gritos de dor. O senhor D. Carlos morrera instantaneamente e o príncipe real ao transpor esse portão, soltava o derradeiro suspiro”, pormenorizava o periódico naquela edição.
A 11 de Fevereiro de 1906, era destaque na primeira página do Diário a subida ao trono do então sucessor, D. Manuel II, que por ventura, viria a ser o último monarca português: “Portugueses! – um abominável attentado veiu opprimir com a maior amargura o Meu coração filho amantíssimo e de irmão extremoso, e enlutar a Familia Real e a toda a Nação, pondo o mais prematura termo á preciosa vida de Sua Magestade El-Rei o Senhor D. Carlos I, Meu augusto e muito amado Pae e á de Sua Alteza Real, o Senhor D. Luiz Filippe, Meu muito querido Irmão. (…) N´esta desventurada conjectura sou chamado, pela Constituição da Monarchia, a presidir aos destinos do Reino, na sua conformidade e no desempenho d´essa elevada missão empenharei todos os Meus esforçoos pelo bem da Patria, e por merecer a affeição do povo portuguez”, lia-se.
Todavia, a falta de preparação do monarca para governar e a fúria republicana contra a monarquia, só embolsaram a já inevitável revolução e consequente implantação da Republica portuguesa.

Implantação da Republica Portuguesa 1910

A implantação da Republica marcou a história do país, dando por findada até então 4 dinastias monárquicas em Portugal.
O acontecimento que viria a mudar a trajectória do país ocorreu da revolução organizada pelo Partido Republicano Português, que sairia vitorioso na madrugada de 5 de Outubro de 1910, com a destituição da monarquia constitucional e consequente implantação do Regime Republicano em Portugal.
O novo governo provisório foi chefiado por Teófilo Braga que administrou o país até à aprovação da Constituição de 1911, dando assim início à Primeira Republica.
Com as constantes insurreições que muito anteviam o cair desta “instituição”, a incerteza por parte da informação recepcionada pelo jornal, deixava em dúvida o que realmente se avizinhava nos dias antecedentes ao evento. A verdade é que a 5 de Outubro, foi reportado, por via telegráfica, o sucesso do partido republicano: “Foi proclamada a republica. Os regimentos de artilharia 1 e caçadores 16 licaram vitoriosos”, anunciou o Diário dos Açores, continuando: “O sr. Dr. Theophilo Braga assumiu a presidência do governo; Affonso Costa, justiça; Bernardino Machado, estrangeiros; Basili Telles, fazenda; Antonio Luiz Gomes, obras públicas; coronel Barreto, general Antonio Jose d´Almeida, interior; Amado Azevedo Fomes, marinha. O sr. Eusebio Leão foi nomeado governador civil de Lisboa”.
Com a formação do novo governo, foram tomadas decisões e nomeados governadores de distritos. No caso dos Açores, o governo provisório da república nomeava como governador do distrito de Ponta Delgada, Francisco Luiz Tavares, solicitando que o mesmo entrasse em funções de imediato. A mesma edição comunicava que o Comando Militar dos Açores hasteasse a nova bandeira que representava agora a pátria portuguesa: “Devendo hoje, pelas 3 horas da tarde, ser hasteada a bandeira que symbolisa a Patria Portugueza sob o regime republicano, com que se dotou para continuar a sua gloriosa historia, uma das phases da qual, e das mais brilhantes, é representada pela actual bandeira, a cuja sombra correu tanto sangue generoso de heroes, já nas lutas pela liberdade(…).”
Por seu turno, a mudança da bandeira seria a primeira de muitas, a que se sucederiam outros símbolos nacionais.

Vulcão dos Capelinhos 1957

O Diário dos Açores, não informou os açorianos apenas de momentos do panorama nacional, este também foi o elo de ligação mais directo entre as ilhas do Arquipélago durante muitas décadas, acabando por ligar histórias e momentos determinantes da história da região.
O eclodir do vulcão dos Capelinhos, na ilha do Faial, foi um desses eventos que marcou um dos períodos mais agitados e históricos da região. Durante 13 meses, a Diário dos Açores acompanhou este evento, tendo sido o mesmo muitas vezes, manchete na primeira página dada a imprevisibilidade do fenómeno natural quase irreal.
Desde a primeiro dia que este acontecimento foi destaque: “Depois de se registar durante dias uma série de abalos, rebentou hoje de manhã, a 400 metros dos Capelinhos, um vulcão que causou pânico nas populações das freguesias vizinhas, especialmente nas de Capelo e Praia do Norte. Fazem-se públicas preces ao Espírito Santo”, informava a edição de 27 de Setembro do Diário.
A erupção vulcânica foi ganhando força e com a mesma muitas foram os artigos dedicados a esta temática no jornal, dando a conhecer a grandiosidade que o mesmo foi ganhando ao longo dos dias: “O vulcão, na tarde de 29 atingiu impetuosidade. Imaginem um colossal repuxo, com jactos de água e novelos de metros, de mistura de quando em vez, com enormes pedras arremessadas em impulsos de trovão. O fumo vai formando uma nuvem pairando a mais de dois mil metros, bem visível da cidade. Na manhã de hoje o vulcão dos Capelinhos ainda me parece ganhar mais fúria. Pela primeira vez, aqui na cidade, ouvimos os estrondos das suas tremendas explosões.”
Dias mais tarde, seria noticiada a magnitude deste evento: “O vulcão dos Capelinhos, pela sua grandeza, deixou de ser um vulcão do Faial, dos Açores, de Portugal. É um vulcão a mais no mundo, despertando as atenções neste ano que a Ciência dedicou ais estudos geofísicos. A rádio, a imprensa o cinema, a televisão vivem na galopada de registar o acontecimento, e das mais diferentes e longínquas origens os profissionais ocorrem à colheita de informações e imagens. Portugal, com o sacrifico duma das suas parcelas insulares, dá assim um contributo portentoso e o nome do Faial e do seu povo corre o mundo na grandiosidade do acontecimento.”
Este fenómeno natural só viria a acabar no ano de 1958 e com ele a perpetuar de um dos momentos, cujos traços do antecedente activo vulcão, ainda perduram e rodeiam o farol que outrora indiciava o caminho de que por lá aportava.

Sismo dos Açores 1980

Em 1980, o Arquipélago dos Açores era atingido por um dos sismos mais violentos da história do país e da região, totalizando um total de 73 vítimas mortais e mais de 400 feridos. O dia 1 de Janeiro começava da pior forma, trazendo consigo meses de angústia e dificuldades, dada ao cenário de destruição que assombrou a região.
A ilha Terceira, porém foi a mais afectada. A intensidade do sismo, de magnitude de 7,2 na escala de Ritcher, contribuiu para que o mesmo afectasse em simultâneo as ilhas da Graciosa e São Jorge, causando danos irreparáveis e na desabamento de edifícios e casas, deixando algumas áreas sem electricidade e água. O sismo também foi sentido nas ilhas do Pico e do Faial, da qual resultou numa factura de deslize no Arquipélago dos Açores.
Este trágico acontecimento foi noticia de primeira página na edição do dia 2 de Janeiro do corrente ano: “Tudo começou a meio da tarde de ontem, pelas 15.42 minutos, um forte abalo de terra foi sentido, em todas as ilhas dos Açores, mormente no grupo central. Terceira, S. Jorge, Pico, Faial e Graciosa. Com o epicentro situado a cerca de 50 quilómetros a sueste na ilha Terceira, mais propriamente no banco piscatório os D. João de Castro, o sismo atingiu naquela ilha o grau 8 da escola de Ritcher, decrescendo nas restantes, sendo em S. Miguel de 3/4”, descrevia o periódico, continuando a explicar os factos: “ Quase no mesmo instante em que se dava o sismo, a energia eléctrica foi cortada, a água deixou de correr nas casas e as comunicações telefónicas ficaram interrompidas.”
A onda de destruição avistada após o abalo foi descrita e as evidências das mesmas foram bem patentes nas palavras escolhidas para contextualizar o sucedido: “Enquanto que na Terceira, principalmente na cidade de Angra e freguesias vizinhas, assim como na costa oeste e norte ruíam centenas de casas, na ilha de S. Jorge, no lugar do Topo, apenas um edifício ficou de pé. Em Velas e Calhetas inúmeras casas ruíram. O Instituto Geológico dos Estados Unidos informava que o abalo ocorrido nãos Açores fora o mais forte dos últimos 20 anos.”
No decorrer dos dias o cenário piorava com a consequente subida do número de vítimas mortais e de feridos: “Estima-se entre 40 a 50 mortos, números sujeitos a confirmação, o balanço da catástrofe que desabou sobre os Açores, no primeiro dia do ano. Relativamente as feridos, e de acordo com últimas informações, foram cerca de 300, dos quais, 100 internados politraumatizados ainda em estado muito grave”, lia-se na edição de 4 de Janeiro.  
A onda de solidariedade e de ajuda que provieram desta catástrofe também foi destacada pelo periódico: “Entretanto, chegaram, já à ilha Terceira um avião «DC-9», proveniente da Suíça, com diverso material de apoio, nomeadamente 300 tendas, enviado pela Cruz Vermelha Suíça. Um outro avião americano, pedido às forças militares dos Estados Unidos, descarregou mais 300 tendas. Ainda ontem chegou um avião proveniente da Alemanha, que transportou, para além de outro material, cerca de 500 tendas para os sinistrados. Hoje um avião da ONU descarregará na Terceira, mais de 1200 tendas. Segundo informações do Centro de Coordenação em Angra do Heroísmo, a situação nas ilhas Terceira e São Jorge é calma, continuando a verifica-se um elevado espírito de solidariedade para com as populações atingidas.”
O infortúnio desta tragédia acarretou consigo, as preocupações envoltas no reerguer da cidade de Angra, tendo-se iniciado estudos para a sua restauração e consequente protecção.
Assim sendo, como alternativa e meio de adquirir meios para a sua reconstrução, a cidade de Angra adere à Unesco como Cidade Património Mundial, tendo sido classificada como Património da Humanidade a 7 de Dezembro de 1983, reflectindo em simultâneo a importância histórica e cultural da mesma.
No entanto, apesar de conseguir se erguer, a verdade é que muitos dos seus residentes optaram por emigrar para reconstruir novamente as suas vidas.

por Ana Catarina Rosa
*jornal@diariodosacores.pt

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