Diário dos Açores

Violência e ordem:Em Paris o relógio não tem ponteiros

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Durante séculos imaginava-se que o pensamento infantil e do adulto eram idênticos. A criança seria apenas um adulto em miniatura. (L´Enfant et la Vie família lesous l’Ancien Régime, Philiphe Aries). A divulgação da pedagogia (Rousseau e a modernidade) psicologia e da psicanálise tudo mudou. A criança não é um adulto em miniatura. Tanto pode raciocinar como um adulto e logo a seguir reagir infantilmente. O adulto deve estar prevenido e saber (Piaget e Epistemologia cognitiva) que, apartir dos 12 anos há muitas pessoas que não desenvolvem mais capacidades mentais e nem por isso deixam de partilhar dos padrões de cultura. Em geral a lógica do pensamento é fundamentada numa “razão prática” comum e as pessoas adaptam toda a sua vida à realidade circundante. Testes, entrevistas e estudos confirmam que, se o conhecimento da mente infantil teve fortíssimos avanços, a adolescência e a idade adulta não seguiram esses passos. 
      No caso recente, dos tumultos em Paris, com toda a fúria e loucura causadorasda violência vaziarevelaramque a maioria  se deu em crianças entre os 12 e os 13 anos (Paris Match e Le Monde) Que reflexão isso nos deve trazer?
A globalização nas grandes cidades sempre nos deu uma certa segurança e ordem. Todavia o que os mais velhos observam não é o que os mais novos aprendem agora. Os edifícios, os carros, as pessoas, tudo o que nos rodeia é real e não se substitui com o carregar de um dedo que desfaz em pó o passado e aparecem outros brinquedos novos, através das tecnologias, dos duplos nos jogos e B.D. Se queimarmos o que nos rodeia nadas e substitui. As crianças de 12 ou 13 anos não distinguem ainda a realidade do imaginário.Com o problema das grandes emoções, da massa mimética da sugestão coletiva e do prazer da agressividade desencadeada pela fúria, esses jovens vivem o momento da realidade como um dos seus jogos. Com as migrações Paris deixou de ser a capital mundial da Cultura e da Luz e os franceses abandonam a sua própria capital com as múltiplas migrações.
Quando se passar a ver como farsa o que é uma guerra entre cidadãos, num centro como Paris, estaremos no caos. Então vemos o desprezo pela “escumalha das periferias”(in. Visão) com toda a violência e os prémios dados aos agentes da ordem que enfrentaram os tumultos. Já se fala em um milhão e meio de euros recolhido para esses agentes e os peditórios para a família da vítima, o jovem Nahel não vai além de 250 mil. 
Haverá consciência de uma violência sem causa? Um automóvel ou um autocarro não são brinquedos grandes, as montras não são para destruir, os sinais de trânsito indicam apenas orientações. Se a escola mostra grandes falhas, as famílias migrantes aprenderam nessas escolas, mas não as aceitam e não se submetem às regras do seu novo país. As dissimetrias da população parisiense são enormes. Como se pode manter diálogos interculturais sem usar a mesma linguagem?
 Podemos pensar que estamos perante um filme de terror e recordar Hegel “depois de uma tempestade vem uma segunda logo atrás”.
Em outros casos decretou-se o estado de emergência, mas estamos a falar de Paris! A cidade da Luz, onde os seus habitantes não querem viver, 45 mil agentes foram mobilizados com blindados e helicópteros para travar a violência e quererá a França ainda receber milhões de turistas, sem refletir sobre as repetições, sem haver nenhum valor ao apelo à consideração pelo Outro, o próprio cidadão? Antes Chicac decretara o “respeito e à generosidade de cada um”. Agora a que valores Macron apela? 
A esperança estará no esquecimento e nos turistas que se confundirão com a “tal escumalha” (Visão) e não deixarão de aparecer aos milhões. As escolas têm férias. Luís XVI, diante da tomada da Bastilha, iria escrever outra vez no seu diário, que não houve mais do que umas rebeliões do costume.
   As revoltas na França foram sempre das mais perigosas e a última ainda continua a decorrer por esse mundo fora…

Lúcia Simas 

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