Diário dos Açores

Reduflação: ‘sublime’ redução, mas há crime ou não?

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Opinião

Vem de novo à baila a REDUFLAÇÃO: o fenómeno do emagrecimento dos produtos com a manutenção ou o acréscimo do preço.
E vem de novo porque quer a empresa belga Deco-Proteste, L.da, que - em inqualificável embuste -se faz passar, entre nós, por “associação de consumidores”, e a denominada Deco, minoritária na antena da multinacional, afiançam um pouco por toda a parte que a reduflação é legal, que não representa qualquer afronta ao ordenamento jurídico.
Recorramos aos exemplos correntes: a margarina Becel apresentava-se em embalagem de 500 gr; reduziu a quantidade para 450 gr. e, depois, para 400 gr.; características e aparência da embalagem, as de antanho; o preço disparou de 3 para 5,54€… Nestum (produto Nestlé), de 900 gr. para 600 gr. (um terço a menos do produto), embalagem a mesma, se bem que com a alteração da gramagem na sua parte não visível…
Ainda que haja inteira conformidade entre o produto e a rotulagem, a inadequação entre o produto e a embalagem é susceptível de se enquadrar na moldura da “fraude sobre mercadorias”.
O que consagra o n.º 1 do artigo 23 da Lei Penal do Consumo de 20 de Janeiro de 1984?
“Quem, com intenção de enganar outrem nas relações negociais, fabricar…,  tiver em depósito ou em exposição para venda, vender ou puser em circulação por qualquer outro modo mercadorias:

b) De natureza diferente ou de qualidade e quantidade inferiores às que afirmar possuírem ou aparentarem,
será punido com prisão até 1 ano e multa até 100 dias…”
Aliás, ainda que haja, após a redução do produto, conformidade entre a quantidade alterada e o constante dissimuladamente da rotulagem, é possível entrever a aplicação de um tal dispositivo porque, sem alteração das características embalagem e dos mais elementos, a aparência é a do produto original, com 500 gr., que não a de 400 gr.,ou de 900 para 600 gr. em que respectivamente e, por fim, cada um deles se ‘converteu’, 
Se a factualidade, porém, não assentar no quadro do crime de fraude sobre mercadorias (e não afastamos de todo sequer a hipótese), há que excogitar se não cabe no enquadramento das contra-ordenações económicas, tal como o configura, no seu artigo 7.º, a Lei das Práticas Comerciais Desleais de 26 de Março de 2008:
“é enganosa [uma qualquer] prática comercial que contenha informações falsas ou que, mesmo sendo factualmente correctas, por qualquer razão, nomeadamente a sua apresentação geral, induza ou seja susceptível de induzir em erro o consumidor em relação a um ou mais dos elementos… e que, em ambos os casos, conduz ou é susceptível de conduzir o consumidor a tomar uma decisão de transacção que de outro modo não tomaria…”
A apresentação das embalagens [da imagem física da embalagem] ilude os consumidores porque é em tudo igual à anterior: há que precaver, pois, os consumidores contra eventuais “ilusões de óptica”, independentemente da conformidade do produto [composição, qualidade e quantidade…] com a rotulagem.
A aparência é também elemento decisivo na modelação da fraude… e na decisão negocial que o consumidor vier a tomar.
A transparência é, por tal modo… preterida, afastada, comprometida!
E isso conta. Conta naturalmente. Contra o que, movidos não se sabe por que interesses, Deco e Deco-Proteste, Lda. pretendem fazer crer aos consumidores portugueses, defraudando-os nas suas expectativas…
Fenómeno dos tempos que correm, só se enraíza, só se generaliza se os Governos se mostrarem desatentos e permissivos, como parece suceder amiúde em Portugal…
Haja, ao menos, uma decisiva intervenção no mercado de “quem de direito”…

Mário Frota*
*Presidente emérito da apDC – DIREITO DO CONSUMO - Portugal

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