Piedade:  a Ponta da Ilha
Diário dos Açores

Piedade: a Ponta da Ilha

Previous Article Previous Article A emigração portuguesa retratada na banda desenhada
Next Article De regresso ao Pico dez anos depois (5) De regresso ao Pico dez anos depois (5)

Opinião

A ponta leste do Pico é a outra fronteira da ilha, virada à Terceira, banhada pelo canal que a liga à extensa ilha de São Jorge.
Esta paisagem muito apreciada sobretudo pelos visitantes estrangeiros tem a melhor perspetiva da freguesia da Piedade. Outrora era designada por freguesia da Ponta e integrava a Calheta do Nesquim, hoje com pouco mais de 340 habitantes e a Ribeirinha, com 370.1 
Segundo a Professora Doutora Maria Norberta Amorim,2 nos finais do século XVI, “A freguesia mais populosa [do concelho das Lajes do Pico]  era então a Piedade com 2559 residentes, seguida das Lajes com 2372, vindo depois as Ribeiras com 1618, S. João com 1106 e por último a Calheta de Nesquim  com 866.  Posteriormente, apesar de não se abandonar a mobilidade para o Brasil, nas primeiras quatro décadas do século XIX a população do concelho crescia em ritmo muito acelerado, contando-se 11 160 residentes em 1840, o dobro dos nossos dias (em 1991 contaram-se 5505 residentes). Seria realmente na década de 1840 que a população atingiria o maior volume de toda a sua história”.
A data da fundação da freguesia da Piedade3, estima-se que tenha sido por volta do ano de 1506. Segundo M.Ávila Coelho, em 1758 - ano da caída - um forte sismo que assolou a parte lesta de ilha desmoronou a antiga igreja. 
A atual, uma dos maiores da ilha, foi construída entre 1758 e concluído em 1764. Foi dedicado a Nossa Senhora da Piedade, cuja imagem de grande beleza escultórica, infelizmente, foi substituída recentemente por outra, alegando-se impossibilidade da sua recuperação. Essa escultura,  porém, ainda se mantém intacta, sobre o mesão da sacristia. 
Outras alfaias litúrgicas lá existem  de grande valor: a Custódia de prata lavrada e dourada, oriunda da Sé de Angra, com 4.900 gramas e 79 centímetros de altura e a Lâmpada do Santíssimo da capela-mor também em prata lavrada, com 14.650 gramas e 1,27 metros de altura.  
A paróquia da Piedade possui outras ermidas: na Manhenha, dedicada a São Tomé, com celebração festiva a Nossa Senhora das Mercês, no final de setembro. No Calhau, uma recente ermida dedicada a Nossa Senhora da Boa Viagem substituiu a antiga Ermida da Rocha, propriedade particular, dedicada a Nossa Senhora da Conceição, sobranceira à excelente baía. Nos Fetais foi construída uma ermida dedicada a Santo António. Na Engrade a recente ermida dedicada a São João Paulo II, construída por iniciativa da Associação dos Amigos da Engrade, inaugurada em 15 de setembro de 2014. 
Existem ainda mais três locais de culto pertencentes a religiões cristãs e não cristãs.
A evolução dos tempos tem-se refletido na forma de vida dos que optam por residir nesta zona da Ilha do Pico.
No início da década de 60, quando o Professor M. Ávila Coelho publicou a citada monografia sobre a freguesia da Piedade, ele estimava que existissem cerca de 400 adegas nas zonas de veraneio da Manhenha, Engrade, Cais do Galego, Calhau e Baixa da anexa Ribeirinha.
Presentemente, “a vileta das cem adegas” - expressão do escritor faialense Manuel Greaves, em “Outras Histórias que ouvi” para designar o lugar da Manhenha - é uma zona da freguesia da Piedade, com moradores residentes durante o ano inteiro. Alguns são emigrantes regressados da estranja, onde conseguiram um pecúlio apreciável. É o que demonstram as dimensões dos novos e modernos edifícios construídos desde o Caminho de cima ao Ramal, dos caminhos do Farol e da Engrade até à Fonte.
A Manhenha é uma extensa zona vinícola, com apreciável atividade piscatória. 
No meses de verão, os visitantes procuram-na para desfrutarem do seu clima ameno, da sua zona balnear e dos convívios que acontecem no espaçoso Salão ou nos caldos de peixe em casa de amigos e familiares.
O mesmo sucede nas outras estâncias de veraneio, nomeadamente no Calhau e no Cais do Galego, onde está a ser erigido um complexo turístico de dimensão apreciável. 
De há uns anos para cá, alguns proprietários têm apostado na recuperação de habitações rurais antigas. Mesmo assim, não é fácil encontrar no verão alojamentos locais disponíveis, tal é a procura.
Seduzidos pela paisagem envolvente, pelo clima, pelo ambiente natural e pela preservação e beleza dos trilhos existentes, muitos estrangeiros optam por conhecer esta Ponta da Ilha a pé, sabendo que dispõem da paz que tanto anseiam e dos aromas e sabores locais que apreciam. Outros, nacionais e estrangeiros, adquirem propriedades e constroem ou recuperam casas.
Está a chegar o tempo das vindimas. O calor aperta e os cachos de uva amadurecem a olhos vistos. Há já quem começa a vindimar.
Ao contrário do que sucedia há meio século atrás, por esses caminhos de asfalto já não se veem cavalos nem burros. Outros meios de transporte modernos substituíram as alimárias. 
Quem não vive na adega visita-a diariamente. Mesmo assim, os que residem no alto da freguesia não deixam de transferir-se este mês para a casa de verão ou adega, pois lá o convívio é maior, os prazeres do mar retemperam forças e o aroma das uvas dá sentido ao verão quente.

1https://www.freguesias.pt/portal/apresentacao_freguesia.php?cod=200403
2https://www.iac-azores.org/iac2018/projetos/IPIA/pico/lajes/populacoes.html
3 Coelho, Manuel de Ávila, “A freguesia de Nossa Senhora da Piedade na ilha do Pico”, Boletim do NC da Horta, vol.2,nº3, 1961, reedição: set 2015, Junta de Freguesia da Piedade

José Gabriel Ávila*

*Jornalista c.p.239 A
http://escritemdia.blogspot.com

Share

Print

Theme picker