Diário dos Açores

Leite, Pobreza e Rainha

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Opinião

Os produtores de leite nos Açores, tal como no país, estão a ficar apenas com 20% da mais valia criada pelo seu trabalho e investimento no setor (assumindo a maioria dos encargos e riscos com a produção), enquanto a indústria fica com cerca de 33%, e a distribuição, que na fileira apenas vende a mercadoria (acrescentando muito pouco à sua criação), fica com quase metade, cerca de 48%. São os grandes grupos da transformação e da distribuição a sugarem a valia criada pelos produtores de leite, que são cada vez menos.
Enquanto a indústria e a distribuição vão vendo crescer os seus lucros à custa dos lavradores e dos baixos salários de quem para elas trabalha, as sucessivas baixas do preço do leite pago ao produtor, sem as correspondentes baixas nos custos de produção, têm colocado cada vez maiores dificuldades e ameaças dramáticas de falência às explorações leiteiras açorianas, que, apesar disso, atualmente ainda asseguram cerca de 30% do abastecimento nacional neste produto e seus derivados, e continuam a constituir um dos pilares económicos básicos e alternativos ao turismo na Região.
Disso mesmo se vem queixar publicamente esta semana Jorge Rita, o presidente da Federação Agrícola dos Açores, criticando ainda os atrasos no pagamento aos produtores dos apoios públicos e comunitários, decorrentes da situação periférica e desigual dos Açores face à abertura do mercado externo continental que resultou da nossa adesão à União Europeia.
Certamente arrependidos estarão hoje Jorge Rita e os lavradores açorianos de, aliando-se à Câmara do Comércio e Indústria dos Açores e à UGT, terem depositado tanta confiança na atual amálgama direitista que governa a Região, julgando que eles iriam trazer para o setor uma política diferente da anteriormente liderada pelo PS, e que haveria almoços grátis à custa do voto favorável e submisso à Política Agrícola Comum (PAC) da UE… 
Entretanto, a caminho dos 50 anos da Revolução Portuguesa de Abril de 1974, os últimos dados da pobreza no país, divulgados esta semana e relativos a 2021/22, mostram-nos que voltámos a regredir graças sobretudo à prioridade dada pelo governo de maioria absoluta do PS às medidas assistencialistas nos vários setores, e ao crescimento da exploração com a falta de medidas visando aumentar salários e repor os direitos dos trabalhadores retirados pela “troika” e o governo PSD/CDS. Um terço das famílias portuguesas não chega aos 834 € brutos de rendimento mensal. Com a subida dos preços, os atuais 760 € de salário mínimo não valem mais que 678 €. As casas aumentaram 90%. Os sem-abrigo continuam a aumentar (fazendo crescer o nariz do Presidente da República) sendo agora sobretudo jovens a engrossar as suas fileiras. O risco de pobreza volta a subir (1,7 milhões de portugueses, que não ganham mais que 551 € por mês, englobando 10% dos trabalhadores). Dos Açores sabe-se já que as notícias são ainda piores e delas daremos conta quando tivermos mais pormenores. Para já, de referir apenas que o rendimento médio dos açorianos está cada vez mais longe do da União Europeia (recuou para os 70%) …
Por último, destaque para as revelações públicas de que Ursula Von der Leyen, pela boca de muitos eurodeputados e funcionários da Comissão Europeia, já se julga a rainha da UE, ultrapassa as suas funções, ignora vários governos europeus na tomada de decisões, governa por decreto e faz panelinha com uma corte de conselheiros. A última foi a ida, por decisão unilateral, a Israel, mais a pateta da Roberta Metsola (Parlamento Europeu), para lhe manifestar solidariedade, esquecendo-se de apelar ao respeito pelos direitos humanos em Gaza, por parte do Estado visitado… 
 

Mário Abrantes 
 

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