Dia dos Finados  Hoje e sempre os Mortos de Antero
Diário dos Açores

Dia dos Finados Hoje e sempre os Mortos de Antero

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Antero, a propósito do Dia de Finados - comemorado em todo o mundo Ocidental -  traz – nos à memoria o que faz parte das nossas vidas. A condição lapidar do soneto transmite – nos o grito que arde, o verbo que anuncia e que perturba. A presença dominadora de Eros e de Thanatos concentra o imaginário que se acentua  entre a labareda do amor e o espetro da morte.
 A romagem aos cemitérios e os momentos de recolhimento na intimidade das nossas casas permitem , neste dia – que pode ser de todos os dias – convoca os que já passaram pelas nossas vidas. Tal como Antero escreveu: «se consigo/fechar os olhos, sinto-os a meu lado/de novo, esses que amei vivem comigo» (…) «vejo-os, ouço-os e ouvem-me também».
Eduardo Lourenço – mestre e amigo de eleição , durante décadas – nas  Obras Completas editadas pela Gulbenkian tem um volume  apenas consagrado a Antero. Reúne os ensaios acerca da criação literária e da reflexão filosófica. Entre numerosas circunstancias, Eduardo Lourenço salienta  que o  mar que rodeou  Antero , e que «envolve a ilha de São Miguel, identifica – se com a sua luta espiritual, fluxo e refluxo eterno, entre ser ou não ser como a vida».
O universo de  Antero permite – nos o acesso a horizontes que nos oculta o quotidiano, enquanto estabelece o dialogo com o legado sempre vivo da sua poesia. Espelho intranquilo das horas alegres e das horas difíceis . Tal como os impulsos do  vento e a inquietação do mar.


Com os Mortos

Os que amei, onde estão? Idos, dispersos,
arrastados no giro dos tufões,
Levados, como em sonho, entre visões,
Na fuga, no ruir dos universos...

E eu mesmo, com os pés também imersos
Na corrente e à mercê dos turbilhões,
Só vejo espuma lívida, em cachões,
E entre ela, aqui e ali, vultos submersos...

Mas se paro um momento, se consigo
Fechar os olhos, sinto-os a meu lado
De novo, esses que amei vivem comigo,

Vejo-os, ouço-os e ouvem-me também,
Juntos no antigo amor, no amor sagrado,
Na comunhão ideal do eterno Bem.

Antero de Quental

António Valdemar*
* Jornalista, carteira profissional número UM; sócio efetivo
da Academia das Ciências

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