Diário dos Açores

Migrantes - um problema cada vez mais complicado

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Correm as semanas e os meses, aparentemente cada vez com maior velocidade, e o problema dos migrantes, na Europa e em todo o Mundo, vai tornando-se cada vez mais complicado de solucionar.
As notícias que lemos nos últimos dias não são boas, infelizmente. Continuam a chegar embarcações carregadas de gente desesperada às costas dos países europeus e acumulam-se nas fronteiras, em diversos pontos da geografia do Globo, homens, mulheres e crianças à espera de uma oportunidade para vencer os obstáculos existentes e correr para o que julgam ser a liberdade, a segurança e a prosperidade arduamente procuradas. O conflito em curso na Faixa de Gaza só veio agravar uma situação que já atingia contornos deveras explosivos; e a proposta oficial do Governo de Israel é de limpeza étnica do território, deportando os palestinianos para o Egipto ou para qualquer outro destino onde haja quem os queira receber.
Afinal, é de deportações em massa que estamos a ouvir falar, o que evoca tragicamente tempos idos, que pensávamos não ver repetidos, muito menos quando os direitos humanos se julgavam triunfantes e garantidos a todas as pessoas, independentemente da sua etnia ou origem geográfica.
Ora, é com pasmo que se vem agora a saber que os governos em funções em alguns países escandinavos estão a organizar, em colaboração com a Agência Europeia Frontex, voos de repatriação para vários destinos dos imigrantes ilegais existentes nos respectivos territórios. Mas o mesmo se está passando noutras áreas e nós próprios, Açorianos, já tivemos uma fase aguda de receber repatriados, expulsos por serem encontrados em situação ilegal nos Estados Unidos e no Canadá, em números significativos para o nosso meio insular.
Lá longe, no coração da Ásia, também se preparam expulsões de imigrantes ilegais oriundos do Afeganistão. E continuam a chocar-nos as notícias que reportam a existência de acordos de países desenvolvidos com outros em más condições económicas para enviarem para lá, longe da vista e muito mais do coração, os requerentes de asilo e os imigrantes ilegais. O Reino Unido envia essas pessoas para o Ruanda - e não para o Uganda, como  erradamente já aqui escrevi - e a Austrália para o Nauru, um pequeno país insular perdido no meio do Oceano Pacífico.
Sempre me intrigou como se pode lidar, dentro dos princípios humanistas e de respeito dos direitos humanos, que são apanágio dos países que é costume identificar como o Ocidente, com os movimentos massivos de pessoas, provocados por conflitos armados, pelas consequências das alterações climáticas, ou simplesmente pela pobreza e pelo subdesenvolvimento.
Quando começou a verificar-se a corrida para a Europa dos chamados em França “sans papiers”, o que incluía viagens aventurosas de pessoas jovens, agarradas ao trem de aterragem de aviões provenientes de África ou da América Latina, e encontradas mortas quando da aterragem dos aparelhos, também se falou de fazer regressar esses ilegais aos respectivos países de origem. Mas quais seriam eles, quando a primeira cautela de tais clandestinos, ao chegarem à Europa era destruírem os seus papéis de identificação, dificultando assim as hipóteses de repatriamento compulsivo?  Este também não se mostrava fácil e recordo o episódio de uma jovem que começou a gritar ao entrar no avião, com manifesto incómodo dos outros passageiros do vôo de longo curso, e foi silenciada com uns travesseiros, tendo acabado por morrer asfixiada. Depois disso, a ideia dos repatriamentos forçados foi posta em pausa...
Os voos de que agora se fala, a partir da Escandinávia, trazem uma vez mais à colação o papel da Agência Frontex. Poderá ela envolver-se em tal tarefa, tão penosa, que evoca tragicamente os comboios de deportados, antes e durante a IIª Guerra Mundial? Já lhe foram dirigidas acusações de cumplicidade com o arrastamento de barcos com clandestinos de volta às águas territoriais de onde partiram; e de dificultar a operação de navios afretados por organizações privadas de defesa dos direitos humanos que procuram prestar assistência no mar a tais embarcações e levar para terra a respectiva carga, consistente de pessoas em busca de melhor vida, incluindo muitas crianças, resgatadas ás probabilidades quase certas de morte violenta, por naufrágio ou por escravidão em países do Sul do Mediterrâneo.
Invoca-se a este respeito que há redes criminosas de promotores de tais viagens e que não se deve facilitar-lhes a vida acolhendo quem se deixou arrastar nos seus cantos de sereia e em alguns casos vendeu tudo o que tinha para pagar a realização do seu sonho de emigrar. Convém na verdade combater esses criminosos, mas sem com isso sacrificar ainda mais quem já antes tanto sofreu.
Em suma, como já disse noutra ocasião, não é possível recebermos todos os que por alguma razão querem fazer parte das nossas sociedades. Nos Açores, temos já alguns milhares de estrangeiros a residir connosco, provenientes de perto de cem países diferentes. Pelo que se sabe, têm sido bem acolhidos e facilmente se integram e encontram trabalho. Já no plano nacional tem havido situações escandalosas de exploração desses trabalhadores e de dificuldades de habitação, que desmotivam quem pretende ajudar a respectiva integração. Daí que haja quem opte por regressar à origem, e procure apoio oficial  para isso quando já se encontra em situação de miséria e até a viver na rua.
Impõe-se encarar de frente o problema e definir e executar uma verdadeira política europeia de imigração.

João Bosco Mota Amaral*

* (Por convicção pessoal, o Autor não respeita o assim chamado Acordo
Ortográfico)    

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