São mulheres na sua maioria e trabalham na Fábrica de Tabaco Micaelense (FTM), em Ponta Delgada.
Sobre elas paira, desde há uns dias atrás, a ameaça expressa de um despedimento coletivo a breve prazo, por parte do Conselho de Administração da empresa.
O pretexto do patronato para esta inquietante ameaça sobre as trabalhadoras é o aumento da carga fiscal nos produtos do tabaco previsto na proposta de Orçamento Geral do Estado (OGE) que irá ser debatida na especialidade a partir de 23 até 29 do corrente mês, na Assembleia da República.
A FTM, com 157 anos de idade, é a mais antiga do setor em Portugal, tendo tido como seu primeiro sócio-gerente José Bensaúde.
Na sequência da revolução de 25 de Abril de 1974, foi nacionalizada e em 1980 foi entregue à Região Autónoma dos Açores. A fábrica manteve-se no setor público regional até maio de1995. Nesta data, por decisão do governo de Cavaco e Silva, estando ainda Mota Amaral na presidência do governo regional, a fábrica foi reprivatizada e ficou ligada à Tabaqueira Portuguesa, por sua vez também reprivatizada como subsidiária da multinacional Philip Morris até 2001. Nesta data, um grupo de empresários açorianos adquiriu-a e, dada a quebra sucessiva do consumo do cigarro tradicional, diversificou a sua atividade, enveredou pela hotelaria e o alojamento local, e adquiriu a empresa distribuidora madeirense Tabacom, contando hoje com cerca de 100 trabalhadores no ativo.
Nunca, entretanto, a fábrica deixou de produzir as suas cigarrilhas, em exclusivo a nível nacional, participando num nicho de mercado específico e restrito (1,7% do mercado em 2022), que tem clientela fiel, resiliente e capaz de suportar altas relativas do preço do produto, sem deixar de o consumir. Ora é precisamente esta linha de produção, onde trabalham atualmente as 25 pessoas ameaçadas de despedimento, que a administração da empresa ameaça encerrar por causa do aumento do imposto previsto na proposta do OGE.
Nada obsta a que devido à especificidade do produto em causa, ao seu pequeno peso relativo no mercado, à necessária e devida proteção contra os sobrecustos da insularidade e às suas características menos prejudiciais à saúde (se comparadas com a grande massa dos atuais produtos do tabaco), se façam todos os esforços para tentar reduzir a dimensão do aumento da taxação previsto na proposta do OGE. Mas daí a afirmar de forma concludente, como afirma a administração da empresa, que não sendo possível~essa redução, isso significaria uma perda insuportável de rendimento para a FTM e o despedimento coletivo de 25 trabalhadores, parece-me não ser tão garantido assim.
Além do mais, por razões de saúde pública hoje óbvias, não parece possível evitar a médio prazo a continuidade do progressivo aumento da taxação deste tipo de produtos e, como tem acontecido com a FTM, em consequência disso mesmo ela tem vindo a diversificar as suas áreas de intervenção e a sua produção, o que pressupõe reenquadramento, formação e requalificação do pessoal, muito antes de qualquer despedimento, como aliás tem sido feito.
A FTM tem a honrosa tradição de nunca ter despedido pessoal e é absolutamente essencial que se empenhe devidamente em continuar assim.
Mário Abrantes