Vasco Cordeiro tomou esta semana uma posição surpreendente ao anunciar publicamente o seu apoio a Pedro Nuno Santos.
O ex-Presidente do Governo dos Açores, que sempre manteve um perfil de moderado, de centro-esquerda e de equidistância em relação às disputas internas nacionais, de repente vira como apoiante do radicalismo de esquerda e do candidato que sonha com uma nova geringonça à esquerda, a que o próprio Vasco Cordeiro sempre torceu o nariz.
A atitude de Vasco Cordeiro é ainda mais surpreendente quando sabe que vamos a eleições regionais daqui a dois meses e esta fuga para uma esquerda mais radical pode ser penalizadora, em termos eleitorais, para o PS-Açores.
O eleitorado açoriano, como todos sabemos, é conservador, não vai em radicalismos de direita ou de esquerda, gosta de políticos sensatos e que se perfilam ao centro.
Foi isso que permitiu ao PS estar no poder regional durante 24 anos e foi esta imagem que Vasco Cordeiro deixou nos seus oito anos de governação.
Esta viragem não pode ter nada a ver com os argumentos que apresentou para apoiar Pedro Nuno Santos, um governante que até deixou Vasco Cordeiro mal visto no auge da pandemia, quando o ex-Presidente do Governo Regional queria travar viagens da TAP para os Açores, devido aos contágios vindos de fora, e o então intrépido ministro Pedro Nuno Santos negou em nome da “coesão territorial”.
É o mesmo ministro que, inicialmente, tinha inscrito apenas 3,5 milhões de euros no Orçamento de Estado para as OSP não liberalizadas, sendo depois obrigado pelos deputados a inscrever 9 milhões, que acabou por nunca os aplicar em concurso público, deixando os prejuízos para a SATA, que é como quem diz, para os bolsos dos contribuintes açorianos.
Foi este ministro que também atrasou a substituição dos cabos submarinos, não nos ligou nenhuma quanto aos estragos do furacão Lorenzo e nem conseguiu alterar o “sistema ruinoso para o Estado” do subsídio de mobilidade.
O que vê Vasco Cordeiro num político com um currículo destes, em relação aos Açores, para lhe dar o apoio, estando ideologicamente longe?
A única explicação é que, sabendo que o ex-ministro tem praticamente garantida a eleição como secretário-geral do PS, Vasco Cordeiro vai precisar das suas graças para o seu futuro político, caso perca as eleições regionais ou não consiga formar governo. Seria uma porta aberta para uma eventual candidatura ao Parlamento Europeu ou outro cargo nacional.
E ao apoiar Pedro Nuno Santos, dá ainda outro sinal: uma espécie de passagem de testemunho ao director de campanha de Pedro Nuno Santos, uma aprovação a Francisco César, o eterno D. Sebastião para alguns jovens socialistas de S. Miguel.
Seja qual for a explicação, revela um sinal de fraqueza, de quase desistência antecipada, para além da reviravolta à esquerda.
É um erro de estratégia política, que poderá ser prejudicial nas próximas eleições.
Ao contrário do que os políticos pensam, os eleitores não são ingénuos e conseguem ler os sinais, mesmo os mais absurdos.
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O CASO PSD-Açores - Nisto de estratégia política José Manuel Bolieiro também optou pela decisão menos acertada ao teimar num acordo pré-eleitoral para as próximas regionais.
Ir coligado com o CDS e PPM talvez faça sentido nalgumas ilhas, mas em S. Miguel é um pré-suicídio eleitoral.
S. Miguel é um feudo eleitoral do PSD. Querer repartir a maior fatia de leão com outros dois partidos que valem apenas 2 mil votos neste círculo, é estratégia errada.
Bolieiro vai fazer campanha em S. Miguel ao lado de Artur Lima e Paulo Estêvão? É a pergunta que muitos sociais-democratas desta ilha fazem a si próprios, incrédulos com a persistência de Bolieiro em manter o acordo.
Há muita gente, dentro do partido, mesmo ao mais alto nível, que ainda pensa num possível recuo, pelo menos em S. Miguel, ilha onde os eleitores do PSD, como toda a gente sabe, não morrem de amores pelos outros dois líderes parceiros da coligação.
Basta ouvir as vozes de militantes e dirigentes do PSD de S. Miguel quando estão juntos a discutir isto em surdina.
Não surpreende, por isso, que Mota Amaral, num artigo publicado ontem no “Diário dos Açores”, deixe um aviso claro a Bolieiro: “(...) a opção feita por ir a votos em coligação, afastando a hipótese de fazer acertos só após o veredicto das urnas, traz consigo dificuldades inevitáveis, que não podem nem devem ser ignoradas. Os votos de cada partido não se transferem automaticamente para a coligação, como aliás já foi possível verificar e até na vigência da actual, se bem que estivessem em causa eleições nacionais e as próximas vão ser regionais”.
Mota Amaral, a única voz ganhadora no PSD com autoridade para lançar conselhos sábios, é o próprio a reconhecer que São Miguel “parecia andar um pouco esquecido dos cuidados do Governo”, sublinhando que não pode haver dúvidas de que o verdadeiro líder é José Manuel Bolieiro.
O PSD tem, de facto, no seu líder, o maior activo eleitoral, capaz de ir buscar o voto útil a toda a direita e ainda alguns desiludidos com o PS. Repartir este activo com outros é um risco que levará ao afastamento de muitos eleitores, indo certamente engrossar as fileiras do Chega e do IL.
E se, neste cenário, o Chega obtiver mais deputados do que o CDS e por ele passar a viabilidade, novamente, de um governo da coligação, como é que Bolieiro vai fazer? Vai convidar o Chega? E se o Chega exigir ir para o governo? José Pacheco teria toda a legitimidade, neste cenário, de reivindicar a Vice-Presidência!
No meio de todos os cenários parece haver um de que os maiores partidos não se livram: vão precisar de outros mais pequenos para formar governo. E isto significa, novamente, instabilidade. É pouco provável que governos assim consigam chegar ao fim da legislatura, como se viu cá e em Lisboa.
Os açorianos têm razões para esgotarem as pipocas no supermercado e sentarem-se no sofá a assistir a este filme, que tem tudo para provocar imensos pesadelos.
Osvaldo Cabral
osvaldo.cabral@diariodosacores.pt