Diário dos Açores

Centro Interpretativo da Base das Lajes

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Se foi o PSD, na voz de Mota Amaral, que pela primeira vez ajuizou uma ideia do que é a atual autonomia política legislativa em novembro de 1974; em matéria de relações internacionais esse mérito cabe ao CDS que o ajuizou em dezembro de 1975. Por isso não é de estranhar a ideia do CDS, através de Artur Lima, pela criação de um Centro Interpretativo da Base das Lajes em novembro de 2018.Em todo o caso, o assunto era premente em toda a Região: 1.º, porque desde o Estatuto Político Provisório de 1976 (artigo 55.º) e da própria Constituição originária de 1976 (artigo 228.º, n.º1, alínea l) que a matéria das relações internacionais, e os seus dividendos, está prevista; 2.º, porque desde os primeiros governos regionais que o assunto é emblemático (nos programas dos governos); 3.º, Álvaro Monjardino, em abril de 1981, defendeu a Comissão Permanente para os Assuntos Internacionais que foi extinta em 1998 por Carlos César, do PS, porque essa comissão permitia dar muito valor à ilha Terceira e era necessário cortar-lhe essa funcionalidade, assim como o fez na revisão do Estatuto Político de 1998 com a extinção dos três históricos centros urbanos do arquipélago. E, realmente, por coincidência ou não, a qualidade da política regional a partir desse ano entrou em declínio hoje muito visível; mas isso é outro assunto para outro texto.
No entanto, com o PS de Vasco Cordeiro, a Região vê publicada a Resolução da Assembleia Legislativa da Região n.º 5/2020/A de 11 de março de 2020, que foi proposta pelo CDS, e onde propõe ao Governo Regional que «constitua uma comissão instaladora e coordenadora do Centro Interpretativo da Base das Lajes que integre um representante do Governo Regional, um representante do Instituto Histórico da Ilha Terceira e um representante da Universidade dos Açores», e com a justificação de «que os centros de interpretação são espaços que procuram valorizar, divulgar e interpretar o património de uma determinada comunidade, facilitando a transmissão de valores culturais; Considerando que a criação de centros de interpretação, alicerçados emenómenos histórico-culturais relevantes na vida de uma comunidade, representa uma mais-valia para o desenvolvimento do turismo e da atividade económica; Considerando que o Centro Interpretativo da Base das Lajes será um espaço de aprendizagem e de sociabilidade, tendo como objetivos a promoção de atividades no âmbito da interpretação da história local, o apoio à investigação científica e o fomento do turismo cultural na ilha Terceira».
Não foi com surpresa, portanto, que depois de constituído o XIII Governo da Açores, com uma componente decisória muito acima da sua legitimidade popular, o CDS fizesse jus do seu historial para as questões internacionais: pelo Decreto Legislativo Regional n.º 17/2023/A, de 18 de maio, foi criado o Conselho para o Estudo das Potencialidades Geopolíticas e Geoestratégicas dos Açores - G2A, e que se noticiasse a 13-11-2023, que o Vice-Presidente do Governo Regional dos Açores, Artur Lima, «assinou hoje, com o Instituto Histórico da Ilha Terceira, um protocolo com vista a concretizar um estudo para a criação de um centro interpretativo da Base das Lajes», no valor de quarenta mil euros. Não existe em concreto o centro e já se gastaram quase dois milhões de euros: quarenta mil para o Instituto Histórico da Ilha Terceira, pelas duas leis parlamentares quinhentos e setenta mil, e, por estimativa, cerca de um milhão e seiscentos mil do funcionamento da administração pública, que inclui viagens e ajudas de custo.
Ora bem, um Centro Interpretativo da Base das Lajes com as finalidades de interpretar o património de uma determinada comunidade porque isso é alicerçado em fenómenos histórico-culturais relevantes na vida de uma comunidade; e facilitar a transmissão de valores culturais porque isso representa uma mais-valia para o desenvolvimento do turismo e da atividade económica; e constituir-se espaço de aprendizagem e de sociabilidade, tendo como objetivos a promoção de atividades no âmbito da interpretação da história local, o apoio à investigação científica e o fomento do turismo cultural na ilha Terceira – é coisa estranha na política regional. A Constituição e o Estatuto Político, ambos de 1976 e até hoje, oferecem à Região a «participação nos benefícios decorrentes de tratados e acordos internacionais que diretamente lhe digam respeito». Até hoje nunca fizemos nada sobre dividendos; e com este Centro, evidentemente, vamos continuar a não fazer. Esse projeto lembra outro: o da Fundação Luso Americana que durante anos serviu para o Estado e mais recentemente para S. Miguel, e pelo menos até cerca de 2020 nunca serviu as ilhas como região. Em vez de reunirmos forças para tornar visível esses benefícios em ganhos aos açorianos– vamos gastar do nosso pouco dinheiro para aprendizagem da história local. Esse investimento daria muito jeito às populações da Praia da Vitória que têm sobre si todos os dias aviões militares e outras coisas mais sob os seus pés.
Este esquema tem graça e é confuso: tem graça, por se dedicar ao património da comunidade e dos seus fenómenos histórico-culturais e a mais-valia para o turismo e a atividade económica. Mas é confuso: fazendo parte a Universidade dos Açores na criação do Centro, apenas assinou o protocolo o Instituto Histórico da Ilha Terceira.
A Região não estuda a autonomia para fazer dela motor de melhoramento da vida dos insulares. A Região não estuda maneiras de obter os dividendos que as leis fundamentais já nos atribuem em teoria pelo uso militar do nosso paraíso. Mas cria um esquema interpretativo para estudar como tudo isso funciona; isto é, vamos pagar para estudar a nossa estupidez.

Arnaldo Ourique

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