Resiliências...

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1.- Os últimos dias foram férteis em acontecimentos de índole político-partidária cujas consequências se não pode ainda descortinar, na sua total dimensão.
O chumbo do OGE por uma amálgama de partidos da direita e da esquerda parlamentar, foi “cozinhado” pelos estados-maiores, por razões não aceites pela opinião pública que acreditava que o apelo do Presidente da República ao bom-senso seria tomado a sério. Tal não aconteceu. Não se espere, agora, que os portugueses continuem a acreditar na boa-fé dos agentes políticos, quando afirmam estar ao serviço do povo. Nem se alegue que a democracia tem sempre resposta para as crises.
Os sobressaltos gerados pela interrupção de uma legislatura e a consequente queda de um governo devem ser bem pensados e avaliados para não se prejudicar o bem-comum. Só por casos de comprovadas e graves ilegalidades, manifesta incompetência ou atropelos aos direitos humanos e às liberdades constitucionais deve o poder ser demitido, e nunca por mesquinhos interesses de grupos sociais ou políticos.
Esta quarta-feira, a notícia foi a reprovação do Orçamento do Estado.
Dias antes, nos Açores, dois partidos políticos com um deputado regional cada, apoiantes da coligação, vieram a público ameaçar o Executivo de Bolieiro com o chumbo do Orçamento Regional; um por discordar dos avales financeiros à SATA, o outro, exigindo a remodelação do Executivo que ambos decidiram apoiar, faz agora um ano.
De apoiantes destes, que vogam ao sabor das circunstâncias e dos seus interesses, está o Executivo Regional dependente, ameaçado de cair, se as “causas” deles não forem atendidas.
Podem, os cidadãos eleitores entender e aceitar estas posições que sobressaltam a vida sócio-económica de uma região pequena e frágil como a nossa? Jugo que não.
É nestas ocasiões que se justifica o endurecimento de posições de quem exerce o poder, recorrendo a uma moção de confiança no Parlamento que esclareceria de que lado estão os apoiantes da coligação de direita e o que, na verdade, os move: se o desenvolvimento dos açorianos, se a estratégia partidária.
Em Lisboa e nos Açores, por motivações diferentes, esta semana foi pródiga em acontecimentos políticos. Em ambos os cenários, os cidadãos não foram tidos nem achados e desta balbúrdia sairão prejudicados. Mais não seja porque a solidariedade europeia tem prazos e regras que não se coadunam com a instabilidade política.  
2.- Muito se falou - e pelas piores razões - dos objetivos do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR).
A discussão, porém, não esclareceu os propósitos e objetivos do programa europeu, nem as áreas a que se destina.
Procurei, pois, informar-me na documentação oficial (1) e fiquei surpreendido com o objetivos pretendidos com a Resiliência: “promover uma recuperação transformativa, duradoura, justa, sustentável e inclusiva, sendo entendida no contexto PRR em todas as suas vertentes: resiliência social, resiliência económica e do tecido produtivo e resiliência territorial.”
O programa abrange 9 componentes em áreas estratégicas: saúde, habitação, respostas sociais, cultura, investimento empresarial inovador, qualificações e competências, infraestruturas,  floresta e gestão hídrica.
Os Açores candidataram-se com projetos às áreas da saúde (30M€), habitação (77M€), respostas sociais (35M€), investimento empresarial inovador (155M€), qualificações e competências (29M€) e infraestruturas (60M€). Na transição digital – educação digital, a RAA apresentou um projeto no montante de 38 M€ destinados à aquisição de equipamentos para as escolas, formação de professores e encarregados de educação, enquanto para a transição energética, onde se integra a área das energias renováveis, o arquipélago prevê investir 116M€ na produção de energia geotérmica, armazenamento de energia limpa e nos equipamentos de distribuição.
O PRR contempla uma série de áreas consideradas estratégicas, pelo que importa não desvirtuar este conceito em projetos e infraestruturas que, dificilmente, poderei considerar como tal: algumas variantes de centros populacionais que poderiam aguardar até que o tecido económico o justificasse, não fossem promessas eleitoralistas.
Pergunto-me também se os 30M€ do Hospital Digital da RAA, destinados à “digitalização do Setor da Saúde com vista a permitir disponibilizar um registo eletrónico de saúde de cada cidadão”, não deveriam ser complementados com outros investimentos destinados proporcionar melhores respostas dos Centros de Saúde, como vai acontecer no continente:
“Alargar os rastreios oncológicos a todos os centros de saúde, nomeadamente do cólon retal e do colo do útero; Alargar o rastreio da retinopatia diabética a todos os centros de saúde; Dotar todos os centros de saúde com capacidade de dosear a proteína C reativa (PCR); Dotar todos os ACES (agrupamentos de centros de saúde) com espirómetros para diagnóstico precoce e acompanhamento do tratamento da Asma, Doença Pulmonar Obstrutiva Crónica e Tabagismo; Dotar as unidades de saúde familiares e unidades de cuidados de saúde personalizados com exames Holter e Monitorização Ambulatória da Pressão Arterial (MAPA)”, etc.
O que a pandemia escondeu durante largos meses, começa agora a tornar-se evidente: Há que efetuar uma profunda reflexão sobre as causas da contínua e precária resposta do Serviço Regional de Saúde, nas ilhas sem Hospital, pese embora os investimentos em infraestruturas e também nos três Hospitais da Região, onde têm vindo a público insuficiências na prestação dos cuidados médicos, que não abonam em favor da saúde dos utentes e da estabilidade e fixação das populações residentes.
A saúde é um bem tão precioso que não se compadece com jogos de poder e interesses pessoais, nem com incompetências de qualquer ordem.
Os tempos não vão fáceis, nem para quem governa, nem para quem sofre de maleitas, mas é a vida!...

Nota:
1 https://recuperarportugal.gov.pt/resiliencia/

*Jornalista c.p. 239 A

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