Quem tem medo... um olhar sobre os medos infantis
Filipe Fernandes

Quem tem medo... um olhar sobre os medos infantis

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A sabedoria popular ensina-nos que a solução infalível para o medo passa pela adopção de um animal doméstico da espécie Canis Lupus Familiaris. E se é certo que, como a grande maioria dos ditos populares, a expressão não deve ser lida pelo prisma da linearidade, é também verdade que, muitas vezes, alguns medos, nomeadamente nas crianças, acabam por ser erroneamente minimizados. Efectivamente, a prática clínica demonstra que, por exemplo, muitas situações de absentismo e de insucesso escolar passam por quadros clínicos de ansiedade nos alunos que nem sempre são alvo de intervenção adequada.
Sabemos todos, e principalmente muitas crianças e pais, que muitos medos infantis não são resolvidos pela simples adopção de um amigo peludo. Os medos infantis são um desafio pela forma como alteram a dinâmica de funcionamento das crianças e das famílias, constituindo-se como um autêntico quebra-cabeças pela dificuldade na sua ultrapassagem, pelo seu carácter enigmático e pelo sofrimento que causam.
Segundo vários autores, os medos nas crianças e adolescentes podem ser divididos em medos desenvolvimentais e em medos patológicos ou fóbicos.
Os primeiros não são considerados patológicos e tendem a ser melhor geridos, a reboque do desenvolvimento. Um exemplo poderá ser o medo de animais selvagens ou do escuro. Estes medos são normativos no desenvolvimento infantil e tendem a ser universais e transculturais, constituindo respostas adaptativas a ameaças reais. Ainda assim, podem ser um desafio terapêutico quando adquirem um carácter invasivo, provocando um sofrimento constante, um conjunto de evitamentos relevantes aparentemente inexplicáveis e uma alteração significativa no quotidiano individual e familiar.
Os medos patológicos (aqueles que são aprendidos e que surgem, por exemplo, após a existência de uma experiência negativa e ameaçadora) constituem-se, por outro lado, como alvos da atenção clínica com uma apreciável regularidade, dada o facto de serem responsáveis por elevados níveis de sofrimento individual e familiar e pela forma como alteram, por vezes dramaticamente, o fluir do quotidiano, podendo, inclusivamente, comprometer o desempenho escolar, a prática de actividades extra-curriculares, o próprio clima relacional da família ou o processo de construção de autonomia das crianças e adolescentes. Um exemplo poderá ser o medo de frequentar a escola após um episódio de agressão por colegas ou outros pares.
A psicoterapia infantil, alicerçada em modelos de compreensão e intervenção na ansiedade, constitui um recurso comprovadamente útil para a resolução das dificuldades levantadas pelo agravamento dos medos infantis e para a construção conjunta (entre técnico, criança e família) de respostas mais adaptativas ao medo.
Aprender que o medo pode ser um grande mentiroso, nem sempre é uma tarefa fácil!
Fique bem, pela sua saúde e a de todos os açorianos.
Um conselho da Delegação Regional dos Açores da Ordem dos Psicólogos Portugueses.

* Vogal da Direção da DRA-OPP

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