Pensar a Europa

Pensar a Europa

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Estamos nesta Europa há 35 anos. Ao longo deste período, tenho-me questionado qual é a percepção que cada um de nós, Açorianos, tem desta Europa.
A questão é simples. Ou olhamos para a Europa, a União Europeia, como o outro, paternal ou patronal, ou olhamos como que para um espelho, no qual nos refletimos, porque somos nós, Açorianos, também esta Europa.
É esta última forma que nos serve. A União Europeia não configura um dogma. Estamos na União porque queremos. É uma escolha, portanto.
Dito isto, quero hoje aqui deixar-vos a minha perspectiva da nossa participação no processo de integração Europeia. Porque hoje, 19 de Novembro, no Teatro Micaelense, às 17 horas, numa parceria dos Governos da República e dos Açores, debateremos o futuro da Europa. É-nos dada a oportunidade de partilharmos de modo mais abrangente a nossa ambição particular para o futuro da Europa.
Sirvo neste momento os Açores com a responsabilidade de, no seu Governo, executar a política da Região no âmbito da nossa participação na União Europeia. É um motivo acrescido para, conscientemente, partilhar com os Açorianos a minha visão nesta matéria.
Os Açores são um território arquipelágico adjacente ao continente europeu. E é um território que, juntamente com os territórios da Madeira e da faixa ocidental da Península Ibérica, forma a República Portuguesa. É assim que nos apresentamos de jure et de facto na União Europeia, como membro desta organização.
Mas somos uma região com autonomia político-administrativa. E temos características próprias, de duas ordens. Somos, por um lado, uma região ultraperiférica, que teima justamente em se integrar de facto no mercado único europeu - mas, para tal, tem enormes constrangimentos -, e, por outro lado e paradoxalmente, somos um espaço de afirmação externa da União Europeia pela nossa centralidade atlântica.
Ontem e hoje, em Ponta Delgada, nove presidentes de regiões ultraperiféricas discutem, sob a presidência do Presidente do Governo dos Açores, José Manuel Bolieiro, a nova estratégia da União para as regiões ultraperiféricas. Deste encontro, a Conferência dos Presidentes das RUP, sairá uma declaração final, exortando as instituições da União Europeia a adoptarem uma série de políticas e acções que promovam uma cada vez maior integração das RUP na União, em cumprimento dos tratados. Não é só a política regional da EU que deverá ter em conta as especificidades da ultraperiférica. São todas – todas – as políticas da União que deverão, ao serem traduzidas em actos jurídicos, considerar a correspondência dos resultados pretendidos às particularidades das regiões ultraperiféricas.
Mas, para os Açores, a Europa representa a outra dimensão. A dimensão externa, a que lhes atribui uma centralidade com um valor geoestratégico inestimável. Uma ultracentralidade. E é esta dimensão que deverá estar em discussão na conferência que a Secretaria de Estado dos Assuntos Europeus propôs ao Governo dos Açores realizar em parceria, no âmbito dos eventos de Portugal na Conferência sobre o Futuro da Europa.
Sobre esta matéria, sejamos claros. Os Açores são uma região da União Europeia que confere uma efectiva capacidade de acção externa em diversas dimensões, tendo em conta a crescente necessidade de interacção entre os principais actores do sistema internacional, com desafios de entendimento cada vez mais prementes, quer ao nível da sustentabilidade ambiental do planeta, quer ao nível económico e social, num mundo cada vez mais desigual em oportunidades e resultados. Trata-se de um poder funcional que, de forma subsidiária, valoriza os Açores, Portugal e a Europa. A macrorregião atlântica, que promove uma rede funcional entre os territórios atlânticos da União Europeia, começa a ser uma realidade. E os Açores são, naturalmente, um dos elos mais valiosos dessa rede. A promoção de uma cooperação privilegiada dos Açores com os Estados/arquipélagos de língua oficial portuguesa, Cabo Verde e São Tomé e Príncipe, será igualmente um importante passo para contribuir para o promoção das relações da União Europeia com países que ocupam uma posição importante no relacionamento entre o Atlântico Norte e o Atlântico Sul.
Da mesma forma, a segurança do continente europeu está a passar por uma nova fase, considerando alguns factores de alteram o paradigma do pós guerra fria. Hoje, o velho aliado da Europa ocidental ocupa-se com o novo centro de instabilidade político-militar. Os EUA vivem já hoje uma nova guerra fria, desta vez com a China, sem que se possam prever consequências da sua intensificação. Também por isso, a Europa terá de assumir novas responsabilidades no plano da defesa, sendo que os Açores são um elemento essencial dessa equação.
Mas, também aqui, sejamos claros. Esta recentralização militar dos EUA para o Pacífico não alterará a importância geoestratégica da Base das Lajes. A geografia, essa, não muda, e estamos demasiado próximos da costa leste americana para sermos menorizados em qualquer dos cenários geopolíticos.
Esta missão estratégica faz parte da nossa história. Os Açorianos, mais uma vez, deverão assumir uma vocação que, também ela, tem moldado a sociedade destas nove ilhas. Europeias e atlânticas.

 

* Subsecretário Regional da Presidência do Governo Regional dos Açores

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