Comprar sem (des)tino
Dionísio Fernandes

Comprar sem (des)tino

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Esta ultima sexta-feira foi “um ver se te avias”. Em todas as lojas, em todos os centros comerciais.
Por um dia (por muitos mais há muito tempo) o consumismo tomou conta das nossas vidas.
E, neste contexto, já sabemos que a acção, no momento de compra, per si, tornou-se num acto de prazer, muito para além da utilidade do produto.
Então porque continuamos a comprar ? Porque não conseguimos parar ?
Recentemente, comprar impulsivamente, foi redefinido como transtorno obsessivo-compulsivo, apesar de não ter sido incluído nos manuais de diagnóstico de referência em saúde mental.
E como as ofertas incluem até novos produtos e serviços de todo o tipo, incluindo clínicas, é fácil concluir que comprar sem limites deixou de ser um problema individual para ser social.
É do tipo de “pescadinha com o rabo na boca”.
A perda de controlo no indivíduo serve o objetivo final da economia para garantir o crescimento constante.
As marcas competem para vender mais e os consumidores para comprar mais.
Ora vejamos como somos manipulados:
Com o aumento da facilidade em comprar pela internet e com cartões de crédito, ou de débito reduz o intervalo entre o impulso ou desejo de comprar e a finalização da compra.
Os descontos, as ofertas e promoções acessíveis por tempo limitado favorecem a urgência da compra, porque sobrevalorizamos produtos difíceis de conseguir e, supostamente, escassos.
A publicidade favorece estes produtos  desnecessários, e gera novas necessidades que se satisfazem mediante o consumo materialista.
O que me leva ao passo seguinte.
E como nos manipulamos a nós mesmos, através da ideia que temos de sucesso:
Os hábitos de consumo são indicadores de nosso status, aceitação e prestígio social.
O narcisismo converte o consumo compulsivo num ritual de satisfação do ego, e os meios de comunicação em massa, e as redes sociais, multiplicam as oportunidades de nos compararmos com pessoas de fora da nossa esfera de contacto e classe social, aumentando, com isso, os nossos desejos. Mesmo que isso signifique o endividamento individual e familiar.
O sucesso da “Black Friday” é um símbolo do êxito do consumismo como forma de vida na sociedade actual, onde consumimos, substituímos e descartamos num ritmo cada vez maior e, portanto, insustentável.
Segundo especialistas a natureza irracional e compulsiva das compras, especialmente durante a Black Friday, será o resultado expectável dentro do contexto disfuncional da nossa sociedade de consumo.
Precisamos de mais cidadãos informados e participativos na tomada de decisões que nos afectam, e menos consumidores passivos, vulneráveis às estratégias de marketing e sem controlo sobre o que, quanto e como se produz e consome. Precisamos de gente que nos ajude a adoptar hábitos de consumo éticos, socialmente responsáveis e sustentáveis, mas também padrões de produção que vão além da maximização dos lucros, para salvar o mundo que temos.
Haja saúde.
E discernimento.

 

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