Se tens jardim, biblioteca e sentido cívico
Alexandre Borges

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“A Iniciativa Liberal não “admite até formar governo com o Chega”. É estranho que tal facto te tenha passado despercebido, porque precisamente o contrário tem sido declarado repetidamente pelos representantes do partido ao longo de pelo menos um ano – isto é, ainda nem havia sequer a menor perspectiva de Legislativas antecipadas no horizonte.”

 

Caro Joel, espero que esta carta te encontre bem. Tomo a liberdade de te escrever neste formato porque ainda somos ambos do tempo das cartas e porque o teu texto me fez lembrar de que, afinal, também as fakenews já não nasceram ontem. Não começaram com as redes sociais nem com a possibilidade digital de manipular sons e imagens; para acontecerem, bastam circunstâncias tão simples como um salão de cabeleireiro ou uma coluna de jornal.
Diz o título da tua crónica que “O bom mentiroso é o que sabe usar os factos para mentir”. Pois, nesse caso, serias um mau mentiroso, porque nem os factos usaste. Mas tenho a certeza de que não estavas a mentir, não deliberadamente. Estás apenas pessimamente informado.
A Iniciativa Liberal não “admite até formar governo com o Chega”. É estranho que tal facto te tenha passado despercebido, porque precisamente o contrário tem sido declarado repetidamente pelos representantes do partido ao longo de pelo menos um ano – isto é, ainda nem havia sequer a menor perspectiva de Legislativas antecipadas no horizonte.
Diria que a primeira vez foi numa já longínqua entrevista de João Cotrim Figueiredo ao “Polígrafo” e a última ainda há minutos (escrevo terça-feira, dia 18 de Janeiro), num vivo para a CNN, durante uma acção de campanha em Torres Vedras.
Basta ligar a TV, um rádio, ouvir com o mínimo de atenção qualquer intervenção de um representante da Iniciativa Liberal para, com grande probabilidade, te cruzares com uma posição claríssima que diz o seguinte: que a IL não fará coligações com populistas, nem com socialistas nem ninguém à esquerda deles. Bastava ter visto o debate Ventura/Cotrim Figueiredo para o perceber. Ou Ventura/Mayan, nas Presidenciais.
Mas, como tudo isto te escapou, explico-te porque é que tal apoio seria impossível: porque ser liberal é o oposto de tudo o que o Chega representa. Ser liberal é acreditar que as ideias são mais importantes do que as pessoas, e não ter um partido unipessoal. Ser liberal é acreditar na liberdade de expressão e de imprensa, e não impor a lei da rolha aos próprios militantes. Ser liberal é acreditar na descentralização do Estado, e não defender uma ainda maior concentração de poderes num regime presidencialista. Ser liberal é acreditar na liberdade individual, no trabalho, no mérito e na ideia de que cada ser humano é livre de perseguir a sua felicidade sem a opressão do Estado, e não dizer que alguém é melhor ou pior do que os outros pela simples razão da sua etnia, nem segregar, nem estigmatizar comunidades, nem fazer discursos anti-imigração. Ser liberal é lutar pelos direitos do indivíduo e não pelos supostos privilégios de uma nação. Ser liberal é confiar no sistema de justiça, na possibilidade de reintegração dos cidadãos, e não no direito discricionário a impor condenações vitalícias como castrações químicas e prisões perpétuas. Ser liberal é certamente acreditar na separação entre Estado e igreja, contra a ressurreição (no punintended) de discursos pseudobeatos. E por aí afora – podíamos ficar nisto até dia 30.
Portanto, caro Joel, já sei que achas que temos imensos “defeitos” (lamento), mas este, certamente, não é um deles. Há, no continente, quem goste de confundir o que se passou nos Açores, mas tu, que aí vives, sabes bem que a única coligação que existe é entre PSD, CDS e PPM e que essa coligação é que fez um acordo com o Chega (que, por sua vez, tem dificuldades em manter-se coligado com ele mesmo). O que a IL fez foi um acordo com o PSD para viabilizar o programa de governo a troco de um conjunto de exigências, das quais os açorianos, felizmente, já estão a beneficiar, como a redução do IVA e a extinção de empresas públicas não essenciais.
Tu recomendarás aos teus leitores a solução política que bem entenderes e que, vejo, é agora a solução PS+PAN, que dizes, comprando o spin de Rui Tavares, já ser chamada de “ecogeringonça”. Eu diria mais que é “geringonça-que-não-tem-cão-caça-com-gato”, mas isso não é o mais importante. O importante é que, como sabes melhor do que eu, tendo em conta todos os teus anos de jornalismo, os leitores merecem a verdade.
É a verdade, pois, que gostaria que lhes apresentasses na tua próxima crónica, juntamente com o respectivo pedido de desculpas.
Sem mais, despeço-me com os votos de um excelente ano para ti e para os teus, em saúde e liberdade.


*Escritor e militante nº 1064 da Iniciativa Liberal

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