Quando se adapta na Região, por que motivo se limitam direitos fundamentais?
Arnaldo Ourique

Quando se adapta na Região, por que motivo se limitam direitos fundamentais?

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Nota à atual invasão: quando um ditador nuclear à escala planetária coloca em perigo a humanidade esta pode unir-se em legítima defesa; aí já interessa apenas a vida e não o direito. Mas com a Ucrânia e os ucranianos a humanidade preferiu o diálogo e as sanções num extraordinário exemplo de democracia. A democracia do “ocidente” não é melhor que os restantes pontos cardeais; só é melhor, e aqui somos genuinamente orgulhosos, porque as pessoas apenas fazem guerra de palavras e diálogos, mesmo que isso custe a vida a muitos evitando custos ainda maiores.

 

A Região está a adaptar o “regime jurídico da atividade de transporte individual e remunerado de passageiros em veículos descaracterizados a partir de plataforma eletrónica”, TVDE (Lei 45/2018, 10 ago.); a Assembleia Legislativa aprovou o Decreto Legislativo Regional, TVDE-RAA, que enviou ao Representante da República para assinar; e este fez um veto jurídico enviando o pré-diploma ao Tribunal Constitucional para este reconfirmar, ou não, o juízo de inconstitucionalidade. Registe-se que os trabalhos preparatórios seguem os seus termos nesse sentido: a iniciativa do PS; Nota Técnica o Parlamento; Nota de Admissibilidade do Parlamento; Parecer da Comissão;Parecer da APLIT; Pareceres através de videoconferência das associações de táxis, ATPD, ATF, CTSM, ATIT; membro do governo, SROPC; 1ª alteração do Deputado Independente; 1ª alteração do BE; alteração PS; alteração do PSD/CDS/PPM; 2ª alteração do BE; 2ª alteração do Deputado Independente; Pedido de Fiscalização do Representante da República; Parecer da Comissão. Fazemos esse apontamento para dizer que existem posições distintas, aqui impossíveis de analisar.
O que está em causa neste diploma, e segundo a opinião do Representante da República, RP, é que (a lei nacional contém um sistema de liberdade de acesso à atividade dessa parte económica e profissional, mas) a pré lei regional, bem diferentemente, tem e de forma severamente inconstitucional limites incompreensíveis à profissão e à liberdade empresarial.
O RR, no seu parecer, põe a nu o modelo legislativo dos Açores: em vez de se legislar para engrandecer a dignidade humana dos insulares, legisla-se para dar um jeito aos que detêm o poder. Esta é uma conclusão nossa, mas este parecer, de tudo quanto já lemos deste RR, é um dos melhores documentos doutrinais de como defender os direitos fundamentais nas ilhas. E é também um excelente tópico para se perceber – para quem ainda não tem essa cultura cívica básica – da necessidade da existência de um órgão que acompanhe os órgãos governativo e legislativo na senda fundamental de garantir os direitos fundamentais no momento da criação das leis. A Assembleia Legislativa dos Açores – é muito triste, porque em vez de governar pelas leis para o progresso das ilhas, pugna por modelos que desvirtuam a unidade regional, que destrói os indivíduos, e coloca em duvida no espírito dos insulares se vale mesmo a pena ter autonomia com poderes de criação de leis regionais autonómicas. E isso é muito perigoso. É natural que os governos apoiem mais um ramo económico de que outro, pois o projeto político de cada governo distingue aquilo que quer que seja melhor desenvolvido ou em maior quantidade; e isso é o governo a realizar o seu projeto e, portanto, é inteiramente natural que se façam opções de investimento. Mas o parlamento legislativo, embora também tome opções legislativas, não as pode traduzir no formato de governo executivo; o parlamento tem forçosamente de criar acessos universais e atinentes aos princípios da universalidade e da constitucionalidade das leis. Não se pode, na desculpa de que a autonomia permite tudo, usando os pés onde se deve usar as mãos, para tudo fazer em prol de certas classes profissionais em detrimento do desenvolvimento em liberdade, universalidade e progresso. Vejamos então.
São dois os problemas: um é a justificação; outro é a própria lei que limita. Vale a pena vermos a justificação – que não existe afinal. Que «Em primeiro lugar, impõe-se desde logo invocar a natureza arquipelágica dos Açores que não é compatível com um regime jurídico pensado e implementado numa área geograficamente contínua», «Em segundo lugar, o facto dos Açores serem um território com características muitosespecíficas, quer seja em termos de relevo das diferentes ilhas, quer ao nível do clima», «Em terceiro lugar, e interligado com a razão anterior, temos estradas de acesso a locais
muito visitados, onde se inclui alguns monumentos naturais, cujos declives e tipo depavimento, exigem cuidados e formação específica dada a perigosidade das mesmas», «Em quarto lugar, temos infelizmente a constatar o crescimento das taxas desinistralidade rodoviária registadas nas 9 ilhas dos Açores e que nos últimos anos foiassociada ao aumento exponencial do turismo, mormente do galopante aumento deviaturas de aluguer em circulação na Região»..., «Por outro lado, importa ter presente que foi recentemente noticiado que na Ilha de SãoMiguel já existe em funcionamento, ainda que de forma residual, a atividade detransporte individual e remunerado de passageiros em veículos descaracterizados apartir de plataforma eletrônica». Se bem se vê são meras palavras, adjetivos, mas sem nenhuma justificação concreta. Seguem-se razões de ordem ambiental, também meros adjetivos, como se a partir desse regime existissem mais transportes, quando, na verdade, é o turismo que o fará crescer ou diminuir.
A lei nacional coloca os limites naturais à profissão: o motorista tem de estar inscrito na plataforma, ser titular de carta de condução (3 anos, categoria B, grupo 2), certificado de curso motorista TVDE, contrato escrito e ser idóneo (não tiver sido condenado por certos crimes) (artigos 10º e 11º). E a pré lei regionalacrescenta mais dois limites: que o motorista possua a escolaridade obrigatória e que tenha o domínio da língua portuguesa (artº4º). Estes dois requisitos são inconstitucionais e até estranhos. Mas são sobretudo estranhos: colocar mais estes dois requisitos dificulta a vida aos insulares comparados com os restantes portugueses, é violado, sem razão, o princípio do mínimo autonómico; existindo na Região uma fortíssima percentagem de jovens que abandonam o ensino, é-lhes assim colocado mais um entrave às suas vidas, à constituição de famílias e filhos, à economia; não é através da lei nem da profissão, nesta profissão, que se vai melhorar ou acertar a língua portuguesa.
Esta pré lei é muito triste. A Região gasta milhões de euros em publicidade para trazer os turistas, e gasta milhares de euros a construir uma para limitar os insulares e a sua economia.

 

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