Política de cassete é recordação de memórias!
Adriano Batista

Política de cassete é recordação de memórias!

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Aqueles que falam e discutem a coisa pública em círculos de amigos, grupos políticos, no trabalho ou em qualquer outro lado, fazem política. Ela não se faz só numa Junta de Freguesia, Câmara Municipal ou na Assembleia da República. Acontece quando um grupo de cidadãos empenhados e preocupados se junta e luta por melhores condições de vida no concelho onde reside, ou quando apresentam propostas concretas aos líderes políticos locais, regionais ou nacionais.
A política faz parte da nossa vida. Uns exercem-na conscientemente e abraçam-na como forma de vida, outros não lhe ligam grande coisa.
Isto faz-me recordar a guerra a que o mundo assiste na Ucrânia e as decisões políticas que (não) são tomadas. Daí emerge uma figura que poderá ser inspiradora para uma nova forma de fazer política – Volodymyr Zelensky.
As gerações jovens actuais não querem a guerra nem querem fazer guerra, sabendo de antemão que a mesma não é benéfica para ninguém em situação alguma. Qualquer guerra é um ataque cobarde à dignidade humana porque somos todos irmãos!
Temos uma grande maioria de jovens que se afirmam e vivem como pessoas tolerantes, respeitadoras e inclusivas. Nunca uma geração esteve tão bem preparada para lidar com a diferença. Todavia, há muito caminho a percorrer, mas não podemos deixar de compreender quais as urgências do agora.
Quando se diz que a política está desacreditada e que os jovens não querem saber dela, está-se a dizer só meia verdade. Ela encontra-se efectivamente desacreditada porque aqueles que deviam ser exemplo e referência não o são, mostrando aquilo que nunca se deve fazer em situação alguma da vida, muito menos em política. Nela não podem caber favores pessoais, compadrios e corrupções. A política quer-se honesta e transparente, exigindo que as pessoas sejam servidas, ao invés de alguns líderes, que se servem da mesma em seu benefício. Por outro lado, os jovens (ainda) querem saber dela. Bastante. Que não existam dúvidas. Todavia, será que os altos quadros políticos querem mesmo compreender o pensamento juvenil, as suas inquietações, preocupações actuais e futuras, num mundo que se apresenta com um futuro cada vez mais turvo?
Os discursos políticos são por vezes (muitas vezes!) cheios de nada. Fazem-se congressos com imensas intervenções, discussões e debates, e no fim, tudo espremido, não se leva nada para casa. Porquê? Porque se falou muito e não se viram perspectivas de concretização de nada.
Não basta identificar problemas. É preciso ir mais além, apresentando soluções e executando-as em favor das pessoas. É isto que torna a política credível e honrosa, num tempo em que falta palavra, compromisso e entrega às pessoas.
Aflige-me ver e ouvir dirigentes políticos jovens com o mesmo discurso dos que já estão na vida política activa há 30 ou 40 anos. Isto é grave. Política de cassete não é política. É recordação de memórias.
Preocupa-me também aqueles que olham a política e as suas organizações como um mero grupo de amigos. Eu não quero fazer política assim nem quero votar em políticos que só estão rodeados de amigos. Com amigos, estou em casa ou num bar a tomar copos. Para discutir, debater e fazer política quero também estar com aqueles que pensam diferente de mim e com os que eventualmente nunca conseguirei convencer com o meu ponto de vista acerca de uma temática. Só assim é que as mudanças acontecem, porque é no enriquecimento do debate e da partilha que as resoluções surgem.
Isso não inviabiliza que na política se façam amigos. Claro que não. Porém, não é nem deve ser a amizade o principal motivo para que a mesma aconteça. Muito do desencanto que a política merece junto de algumas pessoas, jovens incluídos, dá-se exatamente por verem numa estrutura política um grupo de amigos onde só entra quem eles querem e quando assim decidem. Quem vê assim a política não pode nem deve ocupar qualquer cargo de relevo. Aliás, nem deve estar na política.
Faremos boa política quando a maioria dos jovens sentir que tem hipótese de chegar a qualquer lugar, mesmo que não queira. Mas, deve sentir, pelo menos, caminho aberto para tal.
Os jovens em geral e as juventudes partidárias em particular, não devem nem podem ser simplesmente fiéis seguidores do partido. Têm de ser uma voz incómoda que abala consciências instaladas e que pressiona na tomada de decisões que impactam positivamente a vida das pessoas. São os jovens com a sua força e tenacidade que transformam o mundo porque ainda ousam sonhar. Quem não sonha não pode fazer política. Quem não tem capacidade empática não pode fazer política. As pessoas querem sentir que um político, seja ele qual for, vive e sente o mesmo que elas. Querem sentir que são compreendidas nas suas dores, angústias, desejos e sonhos. A verdade vence sempre e um político que vive para as pessoas e está atento às suas necessidades, vence sempre, desempenhando a sua missão com maior realismo e humanismo.
Que existam cada vez mais jovens políticos, que com a sua irreverência abracem a política e façam dela um lugar cada vez mais positivo, onde se luta pelas causas mais prementes com realismo e objetividade, deixando de lado discursos bacocos e vazios de sentido, pois como diz o velho ditado, “a carroça quanto mais vazia, mais barulho faz”.

* O autor escreve de acordo com a antiga ortografia

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