Diário dos Açores

Como se investe nos Açores?

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Há um enigma que nunca consegui decifrar na política açoriana: como é que tantas ilhas, com um potencial invejável reconhecido por todos, não conseguem atrair investimento do exterior?
Em tantos anos de governação própria, contam-se pelos dedos os investidores externos, tirando algumas investidas no sector do turismo (algumas desastrosas), apesar de, durante todo este tempo, os governos terem criado estruturas dedicadas a este fim, com funcionários pagos a peso de ouro.
É um mistério termos um filão de empreendedores e empresários bilionários nas comunidades açorianas da diáspora e não conseguirmos cativá-los a investir na sua terra. Porquê?
Fala-se com eles e a primeira reacção é comum a todos: “Mas como é que se faz? Investir onde? Com quem se fala?”.
Costumo contar a muita gente o episódio mais insólito e embaraçoso que passei com um  amigo do Canadá que pretendia investir cá.
Multimilionário em Toronto, dono de uma das maiores companhias de limpeza naquele país, tentava descortinar, durante um almoço num restaurante local, em que áreas poderia deixar o seu nome nestas ilhas, porque era um sonho desde que emigrou.
Nem de propósito, porque,  perante as dúvidas, entrou no restaurante um outro empresário de sucesso nos EUA com investimento feito em Vila Franca do Campo.
Não se conheciam. Apresentei-os e faço referência ao exemplo do vilafranquense, perguntando-o como poderia ajudar o meu amigo luso-canadiano.
Resposta rápida: “Não te metas nisso! Vais penar! Nem sabes o que passei para investir nesta terra. É burocracia e dificuldades por todo o lado. Eu só não desisti porque os meus familiares e amigos insistiram e me ajudaram a ultrapassar tantas barreiras”.
Fiquei atónito.
O meu amigo olhou-me, sorriu e apenas comentou: “É como eu calculava. Vamos aguardar por melhores dias”.
Recordo-me sempre deste episódio todas as vezes que os nossos governantes vão à diáspora, prometem um mundo que não existe e, depois, vejo por cá toda esta gente interessada em investir, como aconteceu por estes dias nas festas do Senhor Santo Cristo, e regressam à diáspora completamente desiludidos.
O nosso amigo Tony Cabral, influente deputado federal nos EUA, picoense dos quatro costados, é um deles.
Esteve cá há poucos dias e, no jornal “Ilha Maior”, sentenciou o que ando a denunciar há vários anos: “Se falar com um investidor nos Estados Unidos, seja de descendência açoriana ou não, e questionar os pormenores de como pode investir nos Açores e quais os incentivos existentes em cada uma das ilhas, eles não sabem. Não há informação. Não sei se há falta de comunicação dos Açores para os EUA, ou se nos EUA não compreendem bem o sistema açoriano e português. Provavelmente há responsabilidades nos dois lados. É preciso esclarecer de forma diferente os possíveis investidores. Uma coisa importante nestas relações é a confiança. A palavra em inglês é ‘trust’. É uma palavra mais forte do que confiança. O investidor tem de se sentir confortável e ter confiança e segurança agora e no futuro. Se me perguntasse: quer investir na Madalena? Eu respondia: não sei como vou investir, quais são as oportunidades, quais os incentivos e como funcionam. Esses pormenores são importantes para as pessoas decidirem. Isto não é uma crítica a ninguém, mas, às vezes, há falta de conhecimento”.
Um alerta destes era mais do suficiente para fazer estremecer qualquer político nesta terra, ávida de criação de riqueza, investimento, mais empregos e mais desenvolvimento, com menos dependência dos subsídios de Bruxelas e do Orçamento de Estado.
Bolieiro parece ter percebido e tem aqui uma grande oportunidade para alterar esta nossa escandalosa incapacidade de tantos anos.
Nestes últimos dias em que esteve no Canadá, o Presidente do Governo dos Açores disse que pretende criar um gabinete de apoio ao investidor para ajudar os empreendedores e empresários a ultrapassarem a “burocracia e a celeridade nos processos”, reconhecendo que existe “muita burocracia, pouca informação e celeridade nos processos, quer da informação, quer do licenciamento. É esta a reflexão e necessidades que tenho recebido destes contactos dos potenciais investidores”.
Aleluia!
Bolieiro pode bem começar por atrair investidores para os mal geridos campos de golfe dos Açores, com um défice de exploração que ultrapassa os 500 milhões de euros, havendo gente interessada, incluindo parcerias com os sócios dos respectivos clubes, coisa que os governos anteriores nunca quiseram explorar (para manter os boys na Ilhas de Valor), e que o actual governo também arrasta, incompreensivelmente, durante esta metade de mandato.
Será agora?

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NOVIDADES? - Precisamos de uma oposição forte e bastante presente na sociedade. Aparentemente, os socialistas saíram do Congresso da Horta com a convicção de que “estão de volta”.
Mas o que passou para o exterior não é lá muito motivador: não houve ideias novas, foi um congresso muito justificativo dos erros do passado e até do presente (a justificação por terem votado contra a baixa de impostos é de bradar) e os rostos são praticamente os mesmos (cansados, envelhecidos e com muitos protagonistas que já provaram não serem capazes).
 Valha-nos o revigorado Vasco Cordeiro, cheio de fé perante um rebanho que parece menos crente, a julgar pela falta de sentido crítico e de escrutínio interno.
Lá diz a Bíblia: “Hoje em dia, os superintendentes têm de imitar o exemplo perfeito Dele, e o rebanho de Deus há de prosperar e permanecer feliz”.

Osvaldo Cabral
osvaldo.cabral@diariodosacores.pt

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