Depois da estreia nacional no Festival IndieLisboa, o western açoriano “Cemitério Vermelho” terá a sua estreia internacional no Fantasia International Film Festival em Montreal, Canadá.
Considerado por muitos “maior e mais notável festival de cinema de género da América do Norte” e onde já foi palco de estreias de realizadores como Edgar Wright, Quentin Tarantino, Kevin Smith ou James Gunn, o Festival Fantasia irá agora acolher as paisagens áridas da ilha de Santa Maria entre os dias 14 de Julho e 3 de Agosto do presente ano.
Em junho de 1963, em Ponta Delgada, o ator bastião dos westerns americanos, John Wayne, meteu os pés fora do seu iate privado para ir beber um copo ao Solar da Graça.
Para além das histórias e das fotografias, o protagonista de filmes como The Man Who Shot Liberty Valance (1962) e Rio Bravo (1953), deixou nas ilhas um isqueiro zippo cor prata, com a inscrição “Stolen from John Wayne” e acredita-se que até hoje a presença desse isqueiro nos Açores continua a propagar uma ondulação inspiracional no subconsciente dos artistas regionais, cujo efeito borboleta nos leva até hoje: “Cemitério Vermelho”, um western gravado no Barreiro da Faneca, Santa Maria pelas mãos do realizador natural de Fall River, Francisco Lacerda (Karaoke Night, 2019 e a duologia Dentes e Garras, 2014 e 2016).
Apesar do isqueiro ter sido “roubado” a uma figura-cartaz da era de ouro do cinema americano, o baú criativo da nova curta-metragem de Francisco Lacerda foi “roubado” a outros desertos: os spaghetti westerns que proliferaram durante os anos 60 e 70 às mãos de realizadores como Sergio Corbucci, Giulio Questi, Sergio Sollima e Sergio Leone.
Mas o peso da linguagem cultural açoriana reluz a olho nu neste filme: a paisagem árida e argilosa vermelha, os diálogos pilhados regionalismos, o sangue do ator açoriano Francisco Afonso Lopes espalhado pelo chão e uma equipa técnica inteira mais do que calejada a trabalhar nas/e sobre estas ilhas do meio do Atlântico (Cactus Sessões).
Francisco Lacerda em “Cemitério Vermelho”, começou a cavar fora da sua zona de conforto: as tropes cinematográficas mais viscerais ou provocatórias de “Azoresploitation”, que o levaram a reputados festivais de cinema género como o Slamdance, Imagine Film Festival, Florida Film Festival e MOTELx, ficam enterrados para trás.
As bandas sonoras pilhadas de sintetizadores dão lugar a um José Pinhal, a violência gratuita é substituída por uma troca de chalaças e o clima de tundra trazido pelos artistas escandinavos Fredrik S. Hana (editor) e Thomas Aske Berg (ator) funcionam bem para um filme gravado por cima de antigas escoadas lávicas basálticas cobertas de cinzas vulcânicas.
E é com este shift de linguagem que o filme terá a sua estreia nacional na próxima edição do festival IndieLisboa.
Exclusivo Portuguese Times/
Diário dos Açores