Diário dos Açores

Do fatalismo insular ao advento da Liberdade

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Opinião

Breve nota de abertura: 
Bem-vindos sejam os eventuais  leitores do texto abaixo transcrito, patente na  edição do “Correio dos Açores”, publicada há cerca de 45 anos (Nov.- 1977). Apesar de se tratar duma crónica “acontecida” há mais de 4 décadas, o signatário  espera  merecer a habitual empatia étnica dos cordiais leitores do “memorandum”. 
Antecipadamente, grato!
 

Do fatalismo insular ao advento da liberdade

Creio não ser difícil perceber que muitos vocábulos do léxico revolucionário pós-Abril continuam a perder muito das suas conotações psico-políticas. Existe, na verdade, uma forte tendência para domesticar as mensagens da renovação social, designadamente, aquelas que continuam enamoradas das expressões registadas na bíblia constitucional: democracia, socialismo, autonomia…
Espero seja apropriado lembrar que vivemos numa era de inflamabilidade ideológica: passámos do período do ‘alarido politico’ para o advento da democracia florida, cada vez mais crível na hipótese dos capitães de Abril serem forçados a usar o plastrão ‘mea culpa’,  por terem desencadeado um processo revolucionário sem o consentimento prévio dos mandarins salazaristas, os quais permaneciam disfarçados pelas teias-de-aranha do fascismo portucalense…
Não há dúvida de que pairam por sobre o presépio açórico alguns espectros e equívocos pós-abrilistas  a generalidade dos bailarinos da politica regional ocupam grande parte do seu temor psico-politico em adjectivá-la com os mais bizarros anátemas: Autonomia! Autonomia! Autonomia!
Mas, afinal, de que Autonomia falam?
Para alguns, Autonomia é tão somente a versão açoreana da ‘renovação na continuidade’...  para outros, Autonomia significa uma subtileza jurídico-política destinada a servir de pseudónimo ao independentismo regional. 
Todavia, para a maioria dos habitantes destas ilhas atlânticas, Autonomia politica apresenta-se como projecto colectivo de emancipacão em busca da maturidade cívica: ser açoreano para melhor ser português!
O verdadeiro autonomista está dispensado de esmiuçar as virtudes do ideal autónomo: bastará apenas torná-lo viável, dinâmico, sobretudo progressista...  Estou em crer que uma grande  porção da população açoreana está cada vez mais enfastiada perante o deambular dos fiéis saudosistas do salazarismo, para quem o pluralismo ideológico é uma espécie de “cantoria-ao-desafio”…  Tais feiticeiros da política moderna não têm ideias – têm habilidades; não são autonomistas – são autómatos!…    
Oxalá a jovem Autonomia em trânsito constitucional (1977) não seja esvaziada do seu inspirado pressuposto democrátrico. Vejamos:
a)   PCP procura adaptar a sua silhueta partidária às especificidades regionais; utiliza uma táctica prudente, quiçá inteligente, procurando desenvolver uma táctica menos guerrilheira nas valetas da açorianidade.
b)   quanto ao CDS, continua na sua face de hibernação política, vivendo, dramaticamente, espartilhado por uma direcção regional que oscila entre o delírio separatista  e a utopia  federalista….
c)    outros sim, não seria apropriado coleccionar ilações apressadas da crise que vagueia no miolo do PPD/PSD. Muitos gostariam de ver o actual governo regional remodelado e mais virado para a governação democrática da região, e não mobilizado para auto-administração. Em muitas ocasiões, o actual estilo governamental nos faz lembrar um cerimonial fúnebre, cujo ritual não consola os vivos nem facilita o repoiso aos mortos…
d)   quando ao PS/A, falta lembrar que o desafio da Autonomia começou há poucos meses: Autonomia política não deve ser encarada como muro de lamentações, ou como confissionário de frustrações. Seria desejável que o decorrente Governo açoreano não se deixasse seduzir pelo dollarismo norte-americano.  De resto, a jovem Constituição abrilista não precisa ser “endireitada”. Precisa, lá isso sim! ser escrupulosamente cumprida. Temos de ultrapasar esta face emocional da Autonomia. Ou seja, precisamos de estabelecer o primado da coragem responsável e da competência sensata.
Estamos ainda a bom tempo para mobilizar a moderna geração de Mulheres & Homens: operários, engenheiros, economistas, pedagogos (estudantes) para ultrapassar, decididamente, as muralhas do fatalismo insular rumo ao advento da Liberdade – ou seja, enfrentar o bem-vindo desafio denominado AUTONOMIA DEMOCRÁTICA AÇORIANA.  
 

João Luís de Medeiros
memorandum “publicado” em Novembro de 1977.

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