Diário dos Açores

Os falhanços da Autonomia

Previous Article Marcelo foi demasiado longe
Next Article José Couto: De atleta modelo a treinador consagrado

Ouvi e apreciei a intervenção de Sua Excelência o Presidente da Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores. Luís Garcia, intervindo na abertura da Conferência “45 anos de Autonomia – O Desafio da Coesão”, que se realizou na Ilha das Flores, afirmou que “a Autonomia tem falhado na coesão e que urge encontrar caminhos e soluções para que possamos ter mais sucesso neste desígnio autonómico.” Esta é uma conclusão dura, muito dura, de se ouvir. Vamos a caminho de meio século de Autonomia. E a verdade é que estamos, em áreas a mais, onde já não devíamos estar. E o pior, não sendo, nem querendo ser, especialista em agoiros, ainda está para vir. O envelhecimento populacional e a natural desertificação são evidências para as quais não se vislumbra qualquer antídoto eficaz. Isto é dramático. E aproveito aqui para recuperar mais uma frase do discurso de Luís Garcia onde constava isto: “se alguma parcela ficar para trás é a própria Autonomia que falha.” Infelizmente, temos parcelas e ilhas inteiras que há muito ficaram para trás. Uma terra sem pessoas é uma terra sem futuro. Esta espécie de máxima nada tem a ver com questiúnculas ou guerras político-partidárias. A questão aqui em causa é, ou devia ser, transversal e central a todos os partidos. Vivemos numa Região arquipelágica, com 9 realidades distintas, com assimetrias gritantes entre ilhas, com ausências de respostas satisfatórias em áreas cruciais em 6 (ou até 7) ilhas e muitos outros problemas. O nosso Estatuto, como recordou Luís Garcia, tem plasmado que “o desenvolvimento económico e social da Região, e o bem-estar e qualidade de vidas das populações se devem basear na coesão económica, social e territorial”. Ora, esta norma é meramente programática. Na prática é letra morta. Não de agora. Ou de há uns anos. Mas de sempre. A coesão, nas vertentes referidas, é impossível ser cumprida. Ainda para mais quando é o próprio Estatuto que tem consagrada uma visão preferencial ou privilegiada de determinadas Ilhas. A visão “distritivista” de outros tempos nunca deixou de existir por cá. Há três ilhas, ou melhor, três cidades, que podem ter o que mais nenhuma outra parcela do território pode ter. Esta opção reiterada não é apenas um pormenor. Somos vítimas de um duplo centralismo. De nada vale mandar umas bocas para o Terreiro do Paço, quando não se dá o exemplo onde se pode… e não se quer! Outras das falhas evidentes está na inexistência de uma verdadeira e genuína perceção da coesão regional. Por estes dias, andamos a levar com pronúncias públicas dos conselhos de ilha. Cada um olha apenas para o seu quintal e sempre tendo por comparação o bolo que cabe ao vizinho. Ninguém do Conselho da Ilha A vem a público defender a preponderância de um investimento a fazer na Ilha B. Investimento que até é fundamental para todos os Açorianos. Ninguém quer saber disso, já que o mais importante é a estrada que passa junto à sua casa… E enquanto assim for… Coesão, qual coesão??


*Jurista

Hernani Bettencourt*

Share

Print

Theme picker