Diário dos Açores

Marcelo foi demasiado longe

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O mundo está numa corrida contra o tempo tentando corrigir erros do passado, identificandoe julgando crimes hediondos com que convivemos pacificamente e chamando a justiça a separar as águas lodosas em que a pedofilia se acobertou por séculos que foram praticados no passado, no presente e intimidando quem os pense no futuro.
Quandocomeçamos a quebrar o tabu da pedofilia, muitas vezes, no seio das famílias, nas escolas, na prática do desporto, eis que finalmente soubemos dar damos passos largos, também, no que há muitos anos se murmurava em rumores se ouvia: a pedofilia praticada por homens que dedicaram a sua vida a Deus com o, suposto, objetivo de ajudar o próximo sem olhar a quem.
“Deixem vir a mim as crianças e não as impeçam; pois o Reino dos Céus pertence aos que são semelhantes a elas.”, palavras proferidas por Jesus e que deviam servir de exemplo a quem optou por seguir os ensinamentos do Filho.
Independentemente, da nossa crença, ou mesmo da ausência dela, não podemos confundir a fé com a cúpula do patriarcado da igreja católica.
Não podemos ficar, senão, profundamente assustados e tristes quando vemos pessoas a tentar menorizar o sofrimento atroz a que crianças foram sujeitas. Estamos a falar de crianças que foram brutalmente violadas sexualmente e que carregam anos de sofrimento e vergonha.
Pensava eu que seria impossível haver alguma pessoa, católica ou não, que não recriminasse a pedofilia e não reivindicasse o julgamento de quem pratica um ato tão hediondo.
No entanto, parece que o crime se torna mais ou menos grave, consoante quem o pratica.
Depois das vergonhosas palavras proferidas pelo Bispo Manuel Linda (não me merece outro trato), aquando da criação de uma comissão para acompanhar os casos de pedofilia praticados dentro da igreja, comparando estes casos com a probabilidade da queda de um meteorito, no Porto, eis que Marcelo Rebelo de Sousa, nas suas “marcelices” meteu os pés pelas com as mãos, pensou como católico e não como presidente de uma Républica laica, e, decidiu que havia de dar o sinal de perigo, através de um contato telefónico com a pessoa sujeita a investigação criminal, feito por ele, e mal explicado: Mayday Sr. Bispo! Mayday Sr. Bispo! Há problemas no reino da pedofilia.
O que Marcelo Rebelo de Sousa fez, agora com as inenarráveis declarações, desvalorizando cerca de 400 casos de pedofilia nas sacristias, e, por muito que tente explicar o seu contrário, foi menorizar o sofrimento de 400 vítimas menores de abuso sexual, praticados no interior da igreja católica, em Portugal. Foi isto e dificultar, ainda mais, a denúncia de outros possíveis casos. Que vítima se sente segura após a mais alta figura do Estado subestimar anos de trauma guardado, no seu íntimo?
Em qualquer outra instituição, se fossem descobertos 400 casos de abusos sexuais de crianças, a instituição seria encerrada, seriam abertos processos judiciais, até o primeiro-ministro vinha a público mostrar-se indignado. Em Portugal, o Estado vai financiar, na íntegra e sob a batuta de Marcelo, a Jornada Mundial da Juventude, em Lisboa, organizado pela igreja católica.
A pedofilia não é um problema estatístico. Cada história de abuso, hoje, ontem ou há 80 anos, merece o julgamento dos abusadores e o maior respeito pelas vítimas. Não há espaço para relativizações. Não há lugar para a piedosa condescendência do católico Marcelo!
Sinto uma enorme repugnância pelas declarações do senhor Presidente da República. Considero, mesmo, que um pedido de desculpas às vítimas nada adiantaria. Só a renúncia ao cargo terá alguma dignidade!
Marcelo é de direita e a direita portuguesa adora a Deus e ao dinheiro. Não respeitam mais nada: nem o Povo, nem o Estado, nem a Democracia, nem a Liberdade. Mas, não quero crer que fiquem impávidos e serenos às declarações vergonhosas de Marcelo.
 
* Deputada na ALRAA pelo BE

Alexandra Manes*

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