Diário dos Açores

O olhar visionário do ilhéu Roberto Costa

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Há muito tempo namorava a possibilidade de entrevistar Roberto Costa, o conceituado publicitário e o homem por trás das grandes causas em defesa da nossa “Floripa”. Não conheço ninguém tão obstinado por sua terra e tão audacioso, seja na criação de um projeto sobre futuro da cidade, seja no assumir o desafio de realizá-lo. Apaixonado, visionário, imparável. Sem dúvida, uma personagem singular.
No ensejo das comemorações dos 275 anos da presença açoriana em Santa Catarina e do aniversario de 350 anos de Florianópolis resolvi levar à frente a ideia que, amadurecida, se transformou nessa conversa minha com meus leitores das duas margens atlânticas tendo o Roberto como protagonista.
Uma reviravolta que faz todo sentido e, ao final, vão convir que esta escriba estava certa na decisão tomada.
Quem é Roberto Costa? Um açoriano “de cá” de origem sacramentada por mais de dois séculos de história familiar e de cultura. Roberto, manezinho da ilha, traz no apelido de família a marca de “açorianidade”herdada dos pioneiros insulares chegados no distante século XVIII à Ilha de Santa Catarina. Uma família com muitos ramos na Ilha de São Jorge, Pico, Terceira. O que não causa surpresa. Pois, a maioria dos “nossos” açorianos traz no sangue um bocadinho de muitas ilhas. Embora, o Roberto não saiba de que ilha provém o seu nome “Costa,” ele tem certeza absoluta da sua ascendência. Filho de Jaime Costa e neto de João Amâncio Costa, conhecido como João Paulo por ser filho de Joquim Paulo Costa, que por sua vez era filho de João Paulo Costa. O antigo bairro Saco Grande I, desde 1967, leva o nome de João Paulo. É açoriano com todas as costelas paternas e, também, as maternas da sua mãe Cecília Cunha da Luz e dos Serpa Pereira.
Roberto Costa, mané legítimo, nasceu em Florianópolis, no bairro do Saco Grande. Fez os estudos secundários no Colégio Catarinense, começou o curso de Engenharia na UFSC com participação ativa no Diretório Central dos Estudantes/DCE, na vigência plena da ditatura militar, numa época onde nada era permitido. No entanto, desistiu da Engenharia e cursou a Escola Superior de Administração e Gerência /ESAG da UDESC, celeiro de uma geração de jovens de um pensar aberto, empreendedora e inovadora que marcaria o destino do desenvolvimento económico e social da provinciana capital e para o Estado de múltiplas potencialidades em todos os campos.
Publicitário e administrador. Nos anos 70 inicia na propaganda, no setor de criação da empresa Propague, ao lado de outro visionário, Antunes Severo, fundador da agência que já nasceu com uma visão multifacetada nos idos 1963.Dez anos depois torna-se proprietário da Propague, assumindo a Presidência. Nos últimos quarenta e dois anos, sob a sua liderança, a agência deu saltos inovadores, sem medo de empreender ou arriscar na trilha das novas tecnologias de comunicação e marketing. São poucas empresas do setor no país que conseguem se manter num patamar superior e sendo totalmente nacionais. É inegável que a história da Propague, de certo modo, acaba se confundindo com a história da propaganda catarinense. Hoje, uma nova geração está a frente da Propague e o Roberto segue sendo o Presidente do Conselho. No entanto, aquele olhar voltado para as pessoas e o fazer cultural da nossa Floripa continua presente em suas múltiplas ações e em diferentes áreas.
Ao longo dos anos quantas bandeiras Roberto Costa desfraldou, empunhou, levantou a favor do presente e do futuro da nossa cidade – Florianópolis ou Floripa? Como sempre diz: “o que vale é saber que cidade que queremos e por ela batalhar até a exaustão”. Roberto Costa da Propague, o cidadão Roberto casado com a artista plástica Lena Costa e pai de três filhas é corajoso, audacioso, vigilante e genuinamente preocupado com a cidade e seus moradores, seu espírito de luta nunca arrefece.
Quais os principais desafios políticos e territoriais de Florianópolis? Perguntava Roberto em recente intervenção no 3º Congresso de Arquitetura e Urbanismo de Santa Catarina. Desfilou um rol de metas a serem perseguidas e uma lista do que não podemos aceitar. Porque queremos “uma cidade que trilhe caminhos criativos para gerar recursos que permitam cuidar melhor das pessoas num espaço urbano planejado; criar um ambiente de diálogo que promova soluções colaborativas e inteligentes para a construção de um futuro generoso que a cidade e a nossa gente merecem.” Um pensamento que reflete os pilares norteadores do Movimento Floripa Sustentável que ele e um pequeno grupo de amigos criaram e que hoje reúne quarenta e cinco entidades, profissionais liberais, professores, pesquisadores, apaixonados por Floripa. Vozes fortes, com participação ativa e decisiva em temas e momentos cruciais para a vida da cidade e da Ilha. É um orgulho fazer parte de um Movimento nascido da sociedade civil organizada que não apenas mudou a vida, mas também a cultura da cidadania responsável.
Cabe referenciar o Roberto Costa que imprimiu uma forte marca cultural na Propague, com projetos de grande impacto na comunidade e com forte expressão da identidade cultural, do património intangível – do legado dos açorianos às novas formas do fazer cultural. Basta lembrar algumas dessas ações que promoviam a salvaguarda dos valores culturais como a recuperação da Festa do Divino Espírito Santo, em 1996, no centro de Florianópolis, das tradições do Carnaval já um tanto esquecidas e revitalizadas com suas marchinhas, blocos de sujos e sambas enredos na edição do álbum “150 anos do Carnaval”; a criação da maior Feira de Livro que já existiu na nossa região -a FLIC – Festival Literário Internacional Catarinense na Cidade da Pedra Branca, Grande Florianópolis  que reuniu sessenta escritores, com um público superior a 150 mil pessoas; Festival da Integração Multicultural Catarinense – feira de produtos culturais das nove regiões turísticas de Santa Catarina; Festival de Outono da Lagoa da Conceição e o já consagrado Baile Místico assentado no imaginário fantástico da Ilha de Santa Catarina. Comungou do projeto “Viva Açores, conhecer é viver” tendo consciência de que a aproximação entre Santa Catarina e Açores é preciosa, porém não existe uma receita ideal para alavancar ações conjuntas. O que precisa é ser melhor consolidada para oportunizar o turismo quanto a economia criativa e sustentabilidade, numa convergência de interesses e conhecimento mútuo.
Vivemos a era da inteligência artificial, do metaverso, do mundo digitalizado. Está em marcha um processo de mudança sem precedentes e numa velocidade exponencial. O que está ocorrendo na humanidade é a “transformação digital – TD”, um fenómeno ao mesmo tempo social, organizacional e tecnológico. Queremos um mundo mais humanizado, sustentável, conectado. Queremos cidades inteligentes, criativas, voltadas para o bem viver das pessoas. São mundividências do olhar, de sentir o passado e estar de olho no futuro. Assim, nasceu o projeto do Museu de Arte Digital e Inovação -MADI – idealizado por Patrícia Costa, que está à frente da Propague (hoje, sediada em São Paulo) e concebido pelo arquiteto paulista Rodrigo Ohtake. Um museu que a partir dos sambaquis terá que compreender o passado e visualizar o futuro. Dois jovens que têm no seu DNA a marca visionária e artística dos pais e querem que o MADI seja um espaço democrático, onde as pessoas se encontram e ensejam um grande diálogo plural, sob o abraço do MADI, numa arquitetura de memórias e afetos, como ente que tem tudo para atiçar o imaginário e até ser transformador da realidade.
Sem sombra de dúvida, este é olhar visionário do ilhéu Roberto Costa, um apaixonado pelos Açores mesmo sem nunca ter visitado as Ilhas de Bruma.

Lélia Pereira Nunes *

*Escritora / Academia Catarinense de Letras

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