Diário dos Açores

Wagner!

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O grupo de facínoras, assassinos e prisioneiros libertos a quem os russos derem a opção de escolher entre a prisão contínua e a liberdade para uma guerra optou pelo nome Wagner. Ou escolhiam a prisão ou uma luta que só entendiam como fuga do destino fatal. O terror e a ferocidade com que este grupo armado se criou explica-se por serem prisioneiros que nada tinham a perder pois estavam condenados à morte na prisão ou a vida incerta de quem parte para uma guerra que não entendiam.
A origem incerta do nome remete porém para os mais míticos e lendários relatos das sagas dos Vikings bem como das origens das lendas dos reinos fantásticos de que provinha a raça ariana.

Traçado por um pincel realista, a personalidade de Richard Wagner (1813-1888) é a de uma personalidade horrenda, egoísta e cruel que mudou o rumo musical e criou um estilo deslumbrante que deu, em especial à música orquestral, um lugar cimeiro no seio da Arte.
 O compositor Richard Wagner, nascido em Leipzig desde muito cedo teve uma confiança em si que não teria limites. A Humanidade inteira devia-lhe serventia e admiração ilimitada pois, só a falta de entusiasmo de todos e a necessidade de ter sempre muito dinheiro que conseguia de todos os modos, até de esmolas, sem qualquer pejo. O crítico Pecht na tempestade das suas extravagâncias era como uma mola que regressava sempre à primitiva posição de egoísmo supremo. O escritor Edward Said entendeu como “Wagner nascido em Leipzig, foi um grande artista o que não impediu de ser um ser humano abominável”.
Hitler, que na juventude também quis ser artista apercebeu-se do potencial de deslumbramento e entusiasmo que as composições musicais de Wagner podiam produzir nas multidões. Com a maior habilidade transformou as obras musicais de Wagner em poderoso instrumento de propaganda para fundamentar ainda mais a superioridade da origem ariana e extermínio de raças inferiores que sugavam a vontade e a força vital da Alemanha sempre “acima de todos”. Com ódio crescente à raça semita e outras também inferiores consideradas as causas da decadência e gerando entusiasmo nacionalista nas massas.
Hitler, criando rancor aos judeus deu aos alemães um “bode expiatório” de todos os seus males e o nazismo introduzido lentamente acabou numa onde de perseguição louca e extermínio dos Holocaustos.
Richard Wagner, odiando os judeus e considerando-se um ser humano superior a todos, com um egoísmo incomensurável, destruiu a vida de várias relações amorosas e da infeliz esposa Minna, escravizada e obrigada a mendigar para ele a todos os amigos. Considerava toda a gente sua devedora. Ele era o Sol resplandecente a quem todos se deviam alegrar por enaltecer obrigados a estarem ao seu serviço. Deixou uma obra extensa, para além dos escritos filosóficos, estéticos e metafísicos mas o seu bem estar e excentricidades deviam ser satisfeitas pois era superior a todos.
As suas composições imortalizadas serão o deslumbrante e inigualável conjunto “O Anel dos Nibelungos”, cuja grandeza não pode ser ignorada. Com o nazismo delineado por Hitler e seus apaniguados, veicula mais tarde todo o nazismo e anti-semitismo ocultando uma fulgurante mensagem musical mas que apela  para a destruição e morte com o fim de enaltecer os seus ideais terríveis e desumanos.
Wagner, sempre convicto da sua superioridade, desprezava a sociedade, quaisquer regras que não fossem a sua vontade. Já para Schopenhauer a música é a cópia da Vontade mesma, “A vontade como poder e representação” e isso é o que a diferencia de outras artes pois as artes eram a representação de uma essência, a música possui um efeito muito mais capaz. As artes em geral são apenas representações de uma essência, a música é a pura essência, ela é “a cópia de um modelo que ele mesmo nunca pode ser trazido à representação” (Schopenhauer, 2005, p. 338). Esta filosofia da música pôde ser entendida como o drama wagneriano a partir da filosofia de Schopenhauer por Nietzsche que se referia ao “Poder da vontade” e que Hitler se inspirou- nele ao escrever Mein Kampf, (A minha luta) sua obra fundamental e a sua ascensão ao poder com o seu nacional socialismo e anti semitismo que levou a Alemanha ao abismo, à Guerra mundial e ao Holocausto com milhões de vítimas. Da sua obra teatrológica e musical destacam-se quatro óperas interligadas - ‘O ouro do Reno’, ‘A valquíria’, ‘Siegfried’ e ‘O crepúsculo dos deuses’, sendo as duas últimas mais intensas do ponto de vista trágico.
O entusiasmo pelas suas composições influenciou tragicamente o jovem E frágil rei da Baviera, de 18 anos, Luís II que, sob a ascendência da obra wagneriana, construiu castelos fantásticos que ajudaram a arruinar o reino da Baviera. Enlouquecido acabou suicidando-se conjuntamente com o médico que o tratava.
Para Wagner nada disto interessava, pois nunca pensou em ninguém senão em si próprio. Depois de raptar a filha de Liszt, Cósima, que já era casada. Escreveu o biografo Henry Lee que eram felizes “Ambos adoravam Wagner”. Vivendo à parte de todas as convenções, exigia que conhecidos e amigos lhe pagassem todos os gastos loucos as despesas pois se considerava um génio no meio de medíocres e gente inferior.
A arte seria o meio do homem se proteger da dor e da morte, já que a existência é sofrimento, a arte, na sua profunda descoberta da tragédia) nos conduz à morte absoluta, nos liberta. Este é o papel do artista, adotar uma atitude contemplativa, mas sem deixar os prazeres terrenos. Wagner escreveu além dos libretos uma nova filosofia da arte que nasceu com a metafísica da música schopenhaueriana. A partir de uma interpretação de Wagner, esta metafísica da música numa metamórfica do leitmotiv wagneriana, criou uma filosofia da música.
O leitmotiv é o traço que ele criou e destacou e que dá então uma originalidade que nunca surgira. O símbolo abstrato a música progrediu, com um novo instrumento que reflete o rosto humano de luz e sombra, da terra, do ar, do fogo e da água. No século XIX Wagner a sua revolução musical foi o cimo da música apresentada aos seus admiradores e críticos uma elevação musical desconhecida de um organismo vivo,  até então , uma dissolução da estrutura tonal clássica, como afirma Crespillo: “Foi o criador do cromatismo musical”.
O jovem Nietzsche, sob a influência de Wagner, imagina que a ópera wagneriana seria capaz de unir o mito e a música, fazendo assim renascer a tragédia grega. Mas, como tal não acontece, afastou-se de Wagner pelos seus mitos, lendas e práticas religiosas. Nietzsche via o caminho da humanidade para um fim trágico se não se revigorasse. “Nós não somos mais do que camelos carregados de velhas culturas às costas, no deserto que temos de atravessas teremos de nos transformar num leão enraivecido que destruirá quaisquer amarras. Depois aparecerão novos valores e a Terra ressuscitará “ Aforismos” Assim falava Zaratustra”.  
Com a aparição do teatro de Bayreuth seria a glória de Wagner e a efectivação máxima do renascimento do trágico entre os alemães. Por outro lado, na obra “Humano demasiado humano”, Nietzsche não descobre a liberdade do espírito e Wagner seria um protagonista do renascimento da cultura trágica e Wagner não mais que o porta voz do renascimento do trágico e o relaciona os espíritos cativos. Doravante, Nietzsche vê-o como o oposto do modo de vida grego, pois adere aos mitos e á religião utilizando a música para propagar a sensibilidade moral do próprio músico.
O Festival de Bayreuth (1876) em que este Vesúvio humano, como um centro de contradições, viu culminar as suas aspirações “como criança travessa que aprendera a conversar com os deuses”.
No grupo Wagner da guerra de agora, cuja origem é aterradora. De novo a face mais hedionda da Humanidade aparece. É a tragédia e a farsa da Vida e da Morte no seu mais extremo ápice. Não há lutas, terrorismo e assassinato senão por decisão de escolha entre a morte em liberdade ou na prisão para toda a vida.
Se a arte de Wagner foi algo novo e deslumbrante debaixo do Sol o grupo Wagner é mais uma das incógnitas que os políticos e historiadores tentarão em cada presente, descobrir o sentido. Na grande tragédia da Humanidade cujo progresso aumenta a agressividade, o drama musical está na técnica dos “Grandes Artistas e na vida musical do Universo a vida do homem representa uma nota só”.

Lúcia Simas  *

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