Diário dos Açores

A moção de censura

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Os Açores enfrentam, novamente, um cenário de eleições antecipadas.
Desta vez a probabilidade é maior, já que, sem surpresas, a Iniciativa Liberal e o Chega não aprovarão o Plano e Orçamento do governo para 2024.
A coligação, com 26 deputados, receberá o voto favorável do deputado independente, Carlos Furtado, somando assim 27 votos.
Com os votos contra, como é de prever, do PS (25), do BE (2) e do já anunciado IL, somam 28 contra. O PAN decidiu abster-se e o Chega já sentenciou que não votará a favor.
A estratégia dos partidos mais pequenos há muito que estava delineada, como aqui previ há um ano, uma vez que nenhum deles queria ficar colado à coligação neste último ano de legislatura.
A razão é simples: se continuassem a viabilizar a coligação, o eleitorado do Chega e do IL teria razões para exercer o “voto útil”, votando na coligação.
Com a estratégia de rompimento, ambos os partidos têm mais possibilidades de segurar o seu eleitorado e ainda repescar votos de protesto de eleitores desiludidos com a governação.
A ‘rentrée’ em finais de Agosto deu sinais de que todas as forças políticas se preparavam para uma campanha eleitoral antecipada, desde visitas amiúde a várias ilhas, jornadas parlamentares semana sim semana não, para além da movimentação inusitada de Bolieiro em todas as ilhas e em tudo o que é público.
Temos, portanto, à vista, o chumbo do Plano e Orçamento, que não implica a queda imediata do governo.
Se a coligação mantiver a sua palavra de que não se demitirá, resta-lhe como alternativa apresentar um novo Plano e Orçamento. Tem 90 dias para o fazer. Entretanto vai governando com duodécimos.
Em caso de novo chumbo, que é o mais provável, não há alternativa senão apresentar a demissão ou o Presidente da República dissolver a Assembleia Regional e marcar novas eleições.
Neste cenário, todo este processo de impasse arrastar-se-ia por vários meses, atirando a marcação de eleições lá para depois do Verão, o que vem dar quase ao mesmo, porque o calendário eleitoral normal seria em Outubro próximo.
É um cenário que apenas beneficia a coligação, porquanto continuará a governar, mas vitimizando-se por não poder fazer grandes investimentos e empurrando para cima dos outros partidos a crise e a instabilidade política na região.
Estão a imaginar os líderes da coligação a explicar a duas importantes franjas eleitorais - idosos e função pública - que, afinal, não terão o aumento do “cheque pequenino”, nem o aumento para comprar os comprimidos, nem a subida do abono de família, nem o aumento da remuneração complementar regional, porque os partidos da oposição não deixaram?
Embora sujeito a duodécimos, o governo viveria permanentemente em campanha de acusação aos outros partidos e vitimizando-se pelo que não foi feito. Foi a estratégia adoptada por António Costa, logo a seguir à queda da geringonça, e deu resultado.
Bolieiro chamaria a si o papel de conciliador, da estabilidade, da confiança e da boa governação em ajudas sociais, apontando aos outros partidos os desestabilizadores e autores da crise e da instabilidade política na Região.
Sendo assim, parece-me que ao PS e BE só resta uma estratégia que deverá ser a mais plausível: logo a seguir ao possível chumbo do Plano e Orçamento, este mês, apresentarem uma moção de censura, com a justificação de que os pressupostos iniciais da coligação já não existem, porque os partidos mais pequenos romperam o acordo e até inviabilizam o Plano e Orçamento para a continuação da governação.
A incógnita é saber como é que o Chega, a IL e o PAN votariam perante uma moção de censura. Ora, se forem consequentes e coerentes com o chumbo dos dois documentos, naturalmente que votarão a favor, já que, segundo dizem, mais ou menos por outras palavras, “é tempo de devolver a palavra ao povo”.
Aliás, a posição dos três perante este Plano e Orçamento já é, por si só, uma espécie de censura ao governo.
A verdade é que, ao PS e aos partidos como o Chega e IL, interessam-lhes eleições o mais cedo possível.
Por sua vez, a coligação também é a primeira a desejar uma clarificação eleitoral, mas sem a provocar. Vai deixando este papel para os partidos da oposição, pois sabe que criar instabilidade política numa altura destas não é aconselhável eleitoralmente, mas alguns parecem desejosos de correr o risco.
Uma coisa parece praticamente certa: seja qual for o governo que sair das próximas eleições, vai ter que contar com outros partidos para formar governo. E aqui é possível que o Chega seja o fiel da balança, a julgar pelo que está a acontecer no país e na Madeira, com a subida vertiginosa deste partido. A não ser que o deputado independente Carlos Furtado faça estragos no eleitorado do Chega com o seu novo partido, o JPP.
Vendo muito para a frente, é quase certo que os anos que se seguirão, nos Açores, serão de permanente instabilidade política, com governos dependentes de partidos mais pequenos e de acordos instáveis, como agora aconteceu.
Eleições antes de 9 de Junho, data do acto eleitoral para o Parlamento Europeu, seria o cenário ideal para o PS, porque permitiria a Vasco Cordeiro candidatar-se ao PE, caso não conseguisse ganhar as regionais ou formar governo. Muitos socialistas, mesmo no interior do aparelho, gostariam deste cenário, mas ele só é possível se houver moção de censura e respectiva aprovação.
Temos assim que a grande figura do debate parlamentar este mês já nem será o Plano e Orçamento, condenados à reprovação, mas sim se PS ou BE terão a coragem política de apresentar, logo a seguir, uma moção de censura, já que o governo diz que não se demite. Ao não fazê-lo correrão, na mesma, o risco de terem o governo da coligação por muitos mais meses a vitimizar-se da instabilidade criada pela oposição.
Parece-me que, para a oposição, a estratégia mais acertada será “cortar o mal pela raíz” o mais cedo possível.
Haverá coragem?
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                                                                                                                                                                                                                                                                                    PARA RIR?- Quem ouviu os depoimentos de Vítor Fraga e Luís Parreirão na comissão parlamentar de inquérito, sobre a aquisição do famoso “cachalote” da SATA, deve ter rido a bandeiras despregadas.
Não fosse o assunto tão sério e ainda julgaríamos que ambos não tiveram responsabilidade nenhuma na gestão desastrosa da SATA, que a levou a uma falência ainda maior.
Foi na vigência destes dois senhores que o “cachalote” foi adquirido e que se veio a revelar um desastre, como era previsto no estudo da consultora da Lufthansa. E, pior do que adquiri-lo, foi o contrato que foi feito com o locador, uma coisa inimaginável para qualquer gestor básico.
É por isso que a SATA está como está, porque foi entregue, durante vários anos, a gestores e políticos “de circunstância”.
                                                    
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                                                                                                                                                                                                                          O PAÍS CORRUPTO - Há pouco menos de uma semana o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça alertava os portugueses que a “corrupção está instalada em Portugal” e que “ a justiça não é uma prioridade para o poder político”.
Basta ver os mega processos que nunca mais têm fim, a falta de recursos e a pouca vontade em mudar legislação que facilite a investigação e outras leis processuais.
Por estes dias vamos percebendo a razão pela qual os políticos no poder não querem a justiça por perto.
O país político está corrupto, mas o país real, o dos cidadãos que trabalham de manhã até noite para ganhar uma réstia de pão para a família e para a gananciosa banca, continua sério e farto desta gente que se governa, sempre envolvida nos grandes negócios clientelares de enriquecimento ilícito.
Esse povo saberá dar a resposta certa na altura certa.

Osvaldo Cabral
osvaldo.cabral@diariodosacores.pt

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