Divagação XXXVII
Esforçado, o povoamento de São Vicente. Não era a água que buscavam os conquistadores. Antes, um porto de abrigo de baleeiros, um campo de pastagem para o gado das ilhas vizinhas, urzela para tingir panos de algodão, um armazém de carvão para a navegação a vapor...
As longas secas (grandes fomes!), a exaustão das poucas nascentes e as águas crescentemente salobras das fontes e dos poços, sempre contrariaram e limitaram tais instigações de desenvolvimento.
Mindelo prevaleceu. Mas os que hoje vivem fora dos limites da cidade estão ainda reféns da chegada dos autotanques que, esforçada e ininterruptamente, sobem às povoações ou circundam a ilha, alimentando os fontanários.
Coisinhas, curiosidades XXXVII
Encontrei a Dona Maria na Cruz de Lameirão, a meio caminho entre Mindelo e o Monte Verde. Ali se aguarda a água dessalinizada da cidade, que alimenta o fontanário.
Em tempos idos, com um filho às costas, Dona Maria chegou a transportar latas de água à cabeça, monte acima. Era a boa água de Vascónia - oriunda de Santo Antão e transportada para São Vicente em pequenos barcos e mais tarde em “vaporins d’água” - , “água de beber”, vendida no Mindelo, à beira da baía de Porto Grande. Bem melhor que a água de fontes e poços, ou mesmo as águas do Norte, do Madeiral e do Monte Verde, que uns antigos Mindelenses me asseguraram ser para “uso geral”, ou a água salobra da Ribeirinha. Mas a sua profissão, a que lhe permitiu construir a sua casa, foi a de vendedora de água no fontanário Avelino Maria Silva, que jaz ali mesmo ao lado, esburacado.
Hoje, Dona Maria apenas observa os vizinhos que compram a água à Dona Ariana, que lhes enche jerricãs e garrafões, para que depois os transportem à cabeça ou em carrinhos de mão, para suas casas. Tal como em tempos idos...
Fiquem bem
Ana Roque de Oliveira
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